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Durante visita do Papa, México quer reformar liberdade religiosa

A visita do Papa Bento XVI ao México, que começou nesta sexta-feira (23) e termina na segunda (26), foi aguardada com ansiedade por grande parte da população, porém, também se viu cercada de polêmicas e críticas. A principal foi a tentativa do Congresso de aprovar uma reforma – apoiada pelo Vaticano – no artigo 24 da Constituição mexicana, que versa sobre as liberdades religiosas e que poderia ampliar o poder da Igreja Católica no país.

O México, segundo país no mundo em número de católicos depois do Brasil, é também uma república que desde o final do século XIX estabeleceu a separação entre Estado e Igreja. Também é certo que nos últimos 12 anos de governos de direita, o país viu uma crescente aproximação entre as instituições públicas com a linha ditada pelo Vaticano.

Joseph Ratzinger visitará somente o Estado de Guanajuato, oficialmente escolhido por ser o “centro geográfico e católico do país”, como afirmou Federico Ling Altamirano, embaixador mexicano no Vaticano, mas também por ser um dos mais conservadores do México, onde uma sociedade secreta denominada “El Yunque” tem amplo poder.

“El Yunque”, como revelou uma reportagem do jornalista mexicano Álvaro Delgado, é formada por fundamentalistas católicos, adeptos da violência e da repressão política e é acusada de ter uma importante influência nos governo do PAN (Partido da Ação Nacional) de Vicente Fox e Felipe Calderón.

Mas a principal polêmica relacionada à presença do papa no México aconteceu devido à coincidência com a recente tentativa de aprovação pelo Congresso de uma reforma do artigo 24 da Constituição, que versa sobre as liberdades religiosas. A reforma amplia os termos de liberdade religiosa, estabelecendo a liberdade ética e a liberdade de consciência, supostamente para garantir os direitos dos agnósticos.

Para os críticos, porém, a ampliação da denominação de “liberdade religiosa” é inútil, porque esses direitos já são defendidos no artigo. A intenção seria que, com a ampliação, as leis ordinárias, elaboradas pelo Congresso, pudessem ser mais facilmente propostas e aprovadas. Temas como a educação religiosa e a posse de meios de comunicação estariam na pauta. A lógica é: se a Constituição é vaga, o Estado precisa se ocupar disso.

A obrigação da educação religiosa foi proposta recentemente no México, o que gerou diversas manifestações populares ao redor do país. Os deputados quiseram acrescentar à proposta original de reforma um parágrafo ao artigo 24, que o Estado mexicano deveria garantir que as crianças recebessem educação religiosa conforme suas convicções. Na prática, significava uma obrigação do Estado de garantir esse direito e destruía a ideia de uma educação laica no México. A proposta foi descartada.

Críticas

Não somente agnósticos e ateus criticaram a reforma constitucional, mas também igrejas evangélicas e cristãs, que nas últimas semanas organizaram protestos contra o que vêem como um “presente” do Estado à Igreja Católica.

Segundo comunicado da igreja evangélica La Luz del Mundo, escrito por Isaías Gutiérrez Munguíam, “o pano de fundo consiste na manipulação da noção de liberdade religiosa para sustentar privilégios”. De fato, após inserir o termo “liberdade de religião” no texto do artigo 24, se abre um conceito distorcido e tendencioso, afim de aplicá-lo como fundamento para satisfazer a Igreja Católica.

O problema reside no fato de que se abandona a compreensão da liberdade religiosa como direito humano, e se substitui por uma compreensão licenciosa e tendenciosa, distante dos princípios do Estado laico, diz o comunicado. “Quando isso acontece, a liberdade religiosa se torna uma bandeira para a exigência de privilégios religiosos, em demérito do nosso regime de liberdades religiosas.”

Um grupo formado por intelectuais e juristas afirma em carta que parece “positiva a ampliação dos direitos das pessoas e a liberdade de consciência e religião, contudo, todos os direitos que sejam alçados a um nível constitucional devem ser garantidos e respeitados pela legislação secundária [elaborada pelo Congresso], e é justamente lá que os limites podem ser perdidos”.

Fonte: Ópera Mundi