Vermelho: festa marca os 10 anos da esquerda bem informada

Centenas de pessoas fizeram questão de comparecer à festa em comemoração aos 10 anos do Portal Vermelho, que aconteceu na noite desta sexta-feira (1º), no auditório do Sindicato dos Engenheiros de São Paulo, na região central da capital paulista. 


Debate em comemoração aos 10 anos do Vermelho / Foto: Vanessa Silva

Entre os presentes, estavam representantes dos cadernos estaduais que contribuem com seus sotaques e culturas, tornando o Vermelho uma plataforma com ampla cobertura nacional. Jornalistas, militantes, integrantes dos movimentos sociais, dirigentes partidários e parlamentares participaram da comemoração que começou com um debate e terminou em festa.

Na abertura do evento, o editor da página comunista, José Reinaldo Carvalho, que desde fevereiro de 2010 está no comando, relembrou o contexto da luta política travada entre David e Golias: de um lado a imprensa progressista e, do outro, os grandes conglomerados da comunicação, respectivamente.

“A guerra midiática contra as forças progressistas, de esquerda, socialistas e comunistas, que podemos igualar a uma espécie de terrorismo, o terrorismo midiático, constitui a ‘guerra fria’ da atualidade, a continuação no terreno da luta de ideias da ofensiva do imperialismo e das classes dominantes retrógradas em todo o mundo contra os países e forças políticas empenhados na batalha pela emancipação nacional e social”, contextualizou o editor do Vermelho.

“No arsenal de mentiras e engodo, está um inesgotável repertório propagandístico por meio do qual procuram apresentar os Estados Unidos e demais países imperialistas como modelos de democracia”, completou.

José Reinaldo lembrou casos emblemáticos, como as inúmeras tentativas de depreciar regimes socialistas, como Cuba e Iugoslávia, ou governos progressistas que vêm ganhando destaque no cenário geopolítico, como os vizinhos Venezuela e Argentina.

“A mídia se tornou cúmplice de crimes, de golpes de Estado, da contrarrevolução, do terrorismo de Estado e de guerras de agressão e rapina contra os povos e nações independentes. É a mídia que prepara o terreno para essas agressões, é ela que constrói, com artifícios e o engodo, opiniões favoráveis à guerra, naturalizando-a, tornando-a acontecimento banal, e conquista a opinião pública para suas posições”, ressaltou José Reinaldo.

Com relação ao Brasil, José Reinaldo Carvalho lembrou os difíceis tempos da era FHC, quando surgiu o portal. Era véspera da eleição presidencial que elegeria o primeiro presidente da República operário do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva. O editor do portal resgatou desde a vitória de Lula, que simbolizou a derrota da mídia hegemônica e deu novos ares ao país e ânimo aos que resistem nas trincheiras midiáticas, até o amadurecimento das ideias progressistas na América Latina.

“A América Latina vive um momento raro em sua história republicana e de independência. A luta democrática e anti-imperialista cobrou fôlego desde que, em 1998, Hugo Chávez se elegeu pela primeira vez na Venezuela e Lula aqui, em 2002”, recordou ele.

“A posição favorável aos processos em curso na América Latina, capitaneados por governos progressistas, e ao governo da presidente Dilma, não debilita nosso espírito crítico e nossa posição de luta pela ampliação e aprofundamento das conquistas democráticas, populares e patrióticas.” Para José Reinaldo Carvalho, o Vermelho, como veículo de esquerda, precisa avançar nas bandeiras de luta.

“É necessário avançar mais contra os fatores internos e externos que atuam como freio ao desenvolvimento nacional com distribuição de renda, valorização do trabalho e justiça social e à realização das reformas estruturais democráticas, entre as quais avulta a democratização da mídia e do acesso do povo à informação”, concluiu Zé, como é chamado pela equipe da redação, abrindo o debate sobre mídia.

Evento lotou a sede do Sindicato dos Engenheiros, em São Paulo / Foto: Vanessa Silva

"O melhor portal"

O jornalista Paulo Henrique Amorim – do Conversa Afiada – iniciou sua fala repetindo um elogio antigo: “mesmo antes de conhecer o pessoal do Portal, já achava que o Vermelho era o melhor portal de partido político do país”, disse o blogueiro, ao defender que os jornalistas devem “dominar todos os mecanismos de chegar ao público”.

Foi nesse sentido que ele alertou para a necessidade de os veículos de comunicação estarem atentos às constantes mudanças na área comunicacional, na qual os partidos de oposição, como o PSDB, já estão bem adiantados.

“O Vermelho é o melhor portal, mas o PSDB tem um poder de comunicação que é subterrâneo. E percebemos nas campanhas eleitorais, principalmente, como eles atuam de forma agressiva. São tecnologias que temos que dominar também, porque o instrumento portal não basta. Tem já 15, 20 anos como tecnologia. Temos que ficar de olho, nos atualizar, porque o PSDB já fez isso”, disse.

Na sua intervenção, ele resgatou os dois eixos do 3º Encontro Nacional de Blogueiros Progressistas, que ocorreu no último mês, na Bahia. O primeiro deles é a necessidade de uma regulamentação para a mídia. “O vácuo da nossa legislação permitiu a construção desse oligopólio que existe hoje no país. A rede globo detém 80% de toda a verba publicitária televisiva brasileira.”

Ele externou a preocupação de que o governo da presidente Dilma Rousseff não dê fim a este problema. “Temo que este governo, como o anterior, não esteja disposto a lutar por um novo marco regulatório. E falo isso aqui em uma plateia de comunistas. Advirto para a responsabilidade de quem faz parte da base do governo”, disse, contado que tem mantido contatos com integrantes do PCdoB, como o senador Inácio Arruda, para tratar do tema.

Paulo Henrique lembrou que os “hermanos” argentinos conseguiram aprovar a sua Ley de Medios e no Brasil é preciso avançar. Segundo ele, o ex-ministro Franklin Martin destacou, no encontro de blogueiros, que aqui não se quer nada além de garantir o cumprimento daquilo que já está na Constituição, porque a Carta já impede o monopólio e a propriedade cruzada e a assegura o direito de resposta. “Nós blogueiros sujos queremos empunhar a bandeira revolucionária da Constituição”, defendeu.

O outro eixo que ele mencionou foi a “judicialização da censura”. Segundo ele, as vozes dissonantes da grande mídia estão sendo censuradas, por meio de processos na Justiça. “Eles dominaram o Partido da Imprensa Golpista (PIG) e não dominam a blogosfera, o Vermelho, por isso nos perseguem na Justiça.”

Visão do futuro

Também participante do debate do Vermelho, o blogueiro Eduardo Guimarães – do Blog da Cidadania – destacou que a criação do portal foi um ato visionário, pois se antecipou a uma tendência que hoje está consolidada. E completou a fala de Paulo Henrique Amorim, ao afirmar que o PSDB pode até ter uma estrutura comunicacional melhor, mas que ela é equivalente à quantidade de dinheiro de que os tucanos dispõem, ao passo que “fazer o Vermelho, como foi feito, na raça, é muito mais difícil”.

“Nós sucedemos uma realidade que existia nesse país, onde ninguém tinha voz. Essa gente falava sozinha e falava o que queria, porque não havia contestação. Eram os donos da palavra e quem discordava podia fazer uma grande manifestação que não ia aparecer em lugar nenhum. Teve época que 30 mil pessoas iam à rua e o Brasil não ficava sabendo.”

O blogueiro teceu várias críticas à mídia tradicional. “Agora tivemos o caso do presidente Lula e do Gilmar Mendes, e o tom das colunas, dos comentários da mídia é o de que o que o Gilmar Medes diz é a expressão da verdade. Mas hoje há o contraponto, outras vozes. E o Vermelho deu um dos primeiros passos para que isso acontecesse, num momento em que a internet não era nem sombra do que é hoje”, colocou.

Eduardo Guimarães destacou que o império da comunicação age como partido político, inclusive com militância. “Criam uma ideologia que ultrapassa a dos partidos, cria valores, comportamentos padronizados, um pensamento pasteurizado, e todos dizem as mesmas coisas: que nenhum político presta, que não tem jeito.” Segundo ele, ao chegar o momento em que outras vozes se colocam contra o PIG, ele reage com processos e ameaças.

Resgatando a história

O presidente do PCdoB, Renato Rabelo, resgatou toda a história do Vermelho, que era produzido, no princípio, apenas pelos jornalistas Bernardo Joffiily e Cláudio González. Hoje, possui quase duas dezenas de funcionários. “A internet começava ali e, em tão pouco tempo, já é esse instrumento extraordinário e que pode ser de maior dimensão ainda”, compara.

“O site foi ao ar na madrugada de 25 de março de 2002. Dali em diante seriam muitas as madrugadas de trabalho duro. A histórica eleição de 2002 e o golpe na Venezuela contra Chávez são dois exemplos de eventos que, naquele ano, tiveram uma cobertura ampla da imprensa partidária, graças ao reforço do Vermelho”, citou, destacando os prêmios recebidos pelo portal.

Rabelo também ressaltou a importância do Vermelho para o debate de ideias. “Vivemos uma crise do capitalismo e as pessoas estão se perguntando agora qual é a alternativa. Essa é a grande questão. Nós defendemos o socialismo”, disse. O presidente do PCdoB também mencionou a relevância de o portal estar engajado na luta pela democratização da mídia, que é importante para sustentar a luta por um novo projeto de desenvolvimento nacional.

Rabelo também respondeu a Paulo Henrique Amorim sobre o posicionamento do governo a respeito do marco regulatório. “Eu acho que ele pode ter razão sobre o governo, mas, sem luta, sem capacidade de impulsionar o governo, não alcançaremos esses objetivos. Em todos os planos, não só na comunicação. E nós temos tido o papel de impulsionar o governo”, disse.

“E temos diante de nós dois grandes obstáculos: o poder do sistema financeiro – que impõe uma política macroeconômica restritiva, impeditiva ao nosso desenvolvimento – e o monopólio da mídia”, completou.

Ao fim das intervenções, o Vermelho homenageou todas as pessoas que fizeram parte da sua  história e, em especial, dois integrantes: o fundador Bernardo Joffily e o membro da TV Vermelho, Toni C, que está na equipe desde 2002.

A revolução comunicacional

Em sua fala de agradecimento, Bernardo disse que o Vermelho é uma obra de muitos. E chamou a atenção para duas circunstâncias fundamentais quer ajudaram a construir o êxito do portal. “Uma delas é a revolução das comunicações. Temos o privilégio de viver uma revolução comunicacional e o Vermelho surfou nessa onda”, afirmou

A segunda circunstância é o que ele chamou de “brecha presidencialista”. “Nossos povos latino-americanos, depois de muito lutarem, descobriram que na armadura do inimigo de classe tinha uma brecha, o fato de nos nossos países de tanto em tantos anos haver uma eleição na qual se decide a autoridade governamental. E com Chávez, Evo, Lula e outros, essa bercha se revelou um caminho e a partir daí criou-se um novo ambiente. A tal ponto que, nesses tempos de vacas magras para as forças progressistas, em que se discute a eliminação do salário mínimo em países da Europa, a América Latina tem outro microclima. Essas são circunstâncias inseparáveis dos passos que nós demos”, completou.

Em seguida, concordou com a advertência de Paulo Henrique Amorim, sobre a necessidade de estar constantemente se atualizando. “Revolução é metamorfose ambulante. Se você para, você cai da revolução”, brincou. Depois do debate e das homenagens, a comemoração seguiu com uma festa embalada por muito samba.

Deborah Moreira e Joana Rozowykwiat
De São Paulo

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