Conselho Mundial da Paz protesta contra Nobel da UE

O Conselho Mundial da Paz (CMP) da Europa elaborou uma carta de protesto contra a entrega do Prêmio Nobel da Paz à União Europeia. O abaixo-assinado, que reúne o apoio de diversas organizações, será entregue ao comitê do prêmio. O CMP reuniu-se, nos últimos dias 29 e 30, em Bruxelas, na sede do Palamento Europeu, para traçar seu plano de ação para o próximo período.

O encontro foi coordenado pela presidenta do Conselho Português para a Paz e Cooperação, Ilda Figueiredo, para quem a realidade do continente hoje evidencia "o quanto é hipócrita a atribuição do Prêmio Nobel da Paz" à UE. 

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"Estamos perante uma União Europeia cuja ação e propósitos muito se distanciam dos valores e princípios estabelecidos na Carta das Nações Unidas e que devem reger as relações entre os Estados, como: o respeito da soberania; o não recurso à ameaça ou uso da força; o respeito pela integridade territorial dos Estados; a resolução pacífica dos conflitos; a não ingerência nos assuntos internos dos Estados; o respeito pelos direitos humanos e liberdades fundamentais; o direito à autodeterminação dos povos; e a cooperação entre os Estados", disse Ilda em seu pronunciamento.

A presidente do CMP e do Cebrapaz, Socorro Gomes, classificou o prêrmio concedido à UE como uma "infâmia". De acordo com ela, a Europa tem sido "algoz" dos trabalhadores – que sofrem com as medidas de arrocho – e da soberania das nações, além de contribuir com a guerra contra povos e nações.

"A UE promove uma verdadeira agressão às soberanias, porque comanda as economias de países como Espanha e Grécia. Além disso, as potências europeias têm promovido guerras contra nações soberanas desde a destruição da antiga Iugoslávia. Agora, depois da Líbia, fazem a mesma coisa contra a Síria, e ainda ameaçam o Irã", disse Socorro.

Segundo ela, a UE deveria ser julgada por "crimes contra a humanidade" e o único prêmio que poderia receber é o de "prêmio da guerra e da agressão".

Durante a reunião do Conselho, várias atividades foram programadas para acontecer na Europa. Serão eventos de solidariedade à Síria, ao Irã e ao povo palestino, na luta por seu Estado e na denúncia das agressões israelenses. Na ocasião, Socorro Gomes fez uma convocatória para que todos participem e divulguem o Fórum Social Mundial Palestina Livre, que acontecerá em Porto Alegre, de 28 de novembro a 1 de dezembro.

Confira abaixo o pronunciamento de Ilda Figueiredo, que também é coordenadora do Conselho Mundial da Paz no continente europeu. Ilda foi deputada da União Europeia por 18 anos, tendo sido ainda deputada nacional de Portugal.

Intervenção de Ilda Figueiredo, do CPPC

Bruxelas, 29 de Outubro 2012

Queridos companheiros e companheiras,
Gostaríamos de iniciar o nosso contributo para esta reunião, que muito valorizamos, transmitindo-vos as mais fraternas saudações do Conselho Português para a Paz e Cooperação a todos os presentes e, através de vós, às organizações e ativistas pela paz dos vossos respectivos países.

Amigos,
A Europa atravessa uma grave crise financeira com manifestações sociais e econômicas sem precedentes para as presentes gerações.

Crise que integra nas suas causas a política de integração capitalista da União Europeia, das suas instituições e dos governos e respectivas maiorias parlamentares que aceitam e servem os interesses dos grandes grupos econômicos e financeiros, que dominam e ganham com a presente situação, em detrimento dos interesses e bem-estar dos povos.

A União Europeia e o seu BCE, com o FMI, e os governos e maiorias parlamentares a ele submetidos, tentam fazer pagar aos trabalhadores e aos povos o preço da crise pela qual as suas políticas são responsáveis, lançando a mais perigosa ofensiva contra as conquistas e direitos econômicos, sociais e cívicos, aumentando a exploração, aplicando sucessivas e brutais medidas de austeridade, enquanto intensificam os seus lucros escandalosos, numa lógica de preservação do sistema de exploração e opressão.

As políticas que pratica e os autênticos pactos de agressão impostos à Grécia, Portugal e Irlanda, a que pretendem juntar a Espanha e a Itália, estão a intensificar desigualdades, o desemprego e a pobreza, o que, pondo em causa a soberania e independência nacionais, constituem também uma ameaça à Paz.

Esta crise insere-se numa crise financeira mundial, coincidente e integrando manifestações de conflitualidade internacional – econômica, política e militar – também sem precedentes no último meio século.

Podemos identificar algumas dessas manifestações principais:
– Constituição de um bloco europeu ocidental, econômico, político e militar, cada vez mais interveniente e agressivo para além das suas fronteiras;
– Afirmação dos EUA como potência financeira, econômica e militar, cada vez mais interveniente no plano mundial;
– Apesar de crescentes contradições, alinhamento desse bloco europeu com os EUA, sobretudo no plano político-militar, e instrumentalização da Otan na promoção dos designados interesses vitais dos EUA em todos os cantos do mundo;
– A emergência econômica e política de novos países, caracterizados por vastas populações e vastos territórios ricos em recursos naturais, cujo desenvolvimento econômico e tecnológico se aproxima das anteriores potências mundiais;
– A continuada intervenção agressiva e com recurso à ação militar direta dos EUA associados a potências europeias, com ou sem cobertura da ONU, mas com o apoio ou a parceria da Otan, em sucessivos teatros de guerra: Balcãs, Golfo Pérsico, Médio Oriente, Ásia Central e Norte de África;
– A crescente presença militar dos EUA em centenas de bases militares à roda do mundo, presentemente a alastrar sobretudo nos oceanos Índico e Pacífico;
– A persistente ação subversiva dos EUA e potências europeias na Europa, na América Latina, em África, no Sudeste Asiático e na Oceânia, no sentido de subornar vantagens econômicas e/ou forjar alianças para instalar bases militares, em franca hostilidade e à custa da penalização social e econômica de populações residentes e da soberania de países;
– A supressão de regimes políticos e, mesmo, a desagregação de Estados que prosseguem vias de desenvolvimento autônomas, por um lado; e, por outro, a usurpação de territórios e a repressão de populações que ainda não puderam aceder à soberania dos seus Estados, ou sequer exercer a sua autodeterminação.

Isto é, estamos perante uma União Europeia cuja ação e propósitos enunciados muito se distanciam dos valores e princípios estabelecidos na Carta das Nações Unidas e que devem reger as relações entre os Estados, como: o respeito da soberania; o não recurso à ameaça ou uso da força; o respeito pela integridade territorial dos Estados; a resolução pacífica dos conflitos; a não ingerência nos assuntos internos dos Estados; o respeito pelos direitos humanos e liberdades fundamentais; o direito à autodeterminação dos povos; e a cooperação entre os Estados.

Uma realidade que evidencia o quanto hipócrita é a atribuição do Prémio Nobel da Paz de 2012 à União Europeia.

Na Assembleia da Paz e Conferência sobre “O reforço do movimento da paz em tempo de crise” que o CPPC organizou no passado dia 20 de outubro, em Lisboa, lançamos um abaixo-assinado de repúdio pela atribuição deste prêmio Nobel da Paz, e que aqui vos trazemos.

A resistência e luta dos povos por melhores condições de vida e por outra política, a rejeição das imposições e objetivos do imperialismo, a afirmação e exigência das mudanças necessárias para garantir um futuro de paz, de igualdade e de respeito e cooperação entre Estados são, neste contexto de violenta ofensiva contra os direitos dos trabalhadores e dos povos, um fator decisivo para travar a escalada de exploração e de agressão, mas igualmente para abrir caminho a dinâmicas de transformação social, desenvolvimento, justiça e Paz.

Consideramos que importa prosseguir a intervenção que persegue estes objetivos em cada país e, ao mesmo tempo, desenvolver ações de solidariedade com os povos vítimas de agressões.

Sugerimos que durante as nossas reuniões se vejam formas de concretizar algumas das linhas de intervenção definidas na recente Assembleia do Conselho Mundial da Paz, em Katmandu.

Consideramos que a luta pela paz é inseparável e parte integrante da luta pelos direitos laborais e sociais dos trabalhadores e do povo.

Por isso, temos participado em iniciativas que a CGTP-IN – confederação sindical unitária representativa dos trabalhadores portugueses – tem realizado em Portugal e mantemo-nos solidários nas lutas que vão continuar contra o programa de agressão que é imposto aos trabalhadores e ao povo português, contra a exploração e o empobrecimento, por um Portugal com futuro, de que a Greve Geral de 14 de novembro será, certamente, um marco importante e um contributo dos trabalhadores portugueses para a luta e aspiração por uma Europa de progresso de cooperação e de paz.

Precisamos reforçar a nossa cooperação, nesta luta de todos.
O reforço do movimento da paz, a nível nacional e internacional, é mais do que nunca necessário e urgente para enfrentar e derrotar a ofensiva de exploração e de agressividade imperialista contra os trabalhadores e os povos.