O jeito América Latina de se mostrar no Oscar

Difícil saber o que uma premiação tão célebre e enlatada como o Oscar da Academia de Cinema dos Estados Unidos escolhe prestigiar a cada ano. Mais ainda no caso dos filmes estrangeiros que, alheios àquele mercado, têm de se esforçar em doses extras para ganhar votos e atenção. Tampouco é surpreendente que esse tipo de evento se paute não por méritos, mas em lobbies, interesses comerciais e espaço para quem investe (e aparece) mais.

Por Camila Moraes, em Opera Mundi

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Isso dito, ainda é válida a pergunta: o que nós, latino-americanos, escolhemos mostrar ao indicar nossos filmes para uma vaga no Oscar? Na maioria dos casos, a resposta gira em torno de pouca qualidade, o par ação-sexo e, se possível, algum clichê.

É comum, entre colombianos, escutar críticas em relação ao cinema nacional: “violento”, “monotemático”, “obcecado pelo narcotráfico”. Mas também não é raro nos depararmos com escolhas como “O Cartel dos Sapos” – longa baseado na autobiografia de um ex-narcotraficante, que depois virou uma série televisiva de sucesso e então roteiro de cinema – para representar a Colômbia na disputa, como esse filme fará em 2013. O trailer pode ser visto abaixo.

Acontece também frequentemente que países de pouca tradição cinematográfica se orgulhem de produções nos moldes de Hollywood, mas que no fundo são frutos de uma tradição televisiva. É o caso, para o ano que vem, de “Jaque Mate”, filme da República Dominicana sobre um sequestro que se transforma em reality show, e do venezuelano “Piedra, papel o tijera”, uma história urbana sobre uma família e um casal unidos por uma tragédia.

De ditaduras e prêmios

As ditaduras que marcaram a história da região também não costumam faltar na nossa vitrine. Nessa linha, a Argentina comparece com “Infância clandestina”, sobre um menino que retorna ao seu país e, junto com os pais militantes de esquerda, tem que mudar de identidade e encarar uma vida cheia de limites. Uma criança em épocas ditatoriais também é o eixo do filme “Las malas intenciones”, que o Peru escolheu para representá-lo. E o Chile apresenta “No”, sobre o plebiscito que levou ao fim o governo do general Augusto Pinochet em 1988.

Vez ou outra, apostas puramente autorais aparecem também, mas elas devem vir corroboradas por prêmios. Para disputar o Oscar 2013, o Brasil escolheu “O palhaço”, comédia de apelo popular e com marca de autor que arrematou 12 lauréis no Grande Prêmio do Cinema Brasileiro. Já o Uruguai elegeu “La demora”, uma história mais afim ao modelo latino-americano clássico de fazer cinema (desde as retomadas dos anos 90): contida, psicológica, centrada em personagem.

O México encarou a mais qualitativa das escolhas deste ano com “Después de Lucía”, o melhor filme da Quinzena de Realizadores do Festival de Cannes. O longa retrata diferentes formas de violência – tema que inspira em grande medida a arte e a cultura mexicanas hoje – pelas quais passa uma jovem vítima de bullying que refaz a vida ao lado do pai depois da morte da mãe (veja trailer abaixo).

Oscar garante circulação

É válido ressaltar que nenhuma dessas conclusões fala diretamente contra a qualidade das obras – já que muitas delas são, de fato, boas produções. O que sobra na equação é a necessidade de um filme ter a aprovação de um Oscar para ser exibido e circular, sobretudo, na região.

Por que ver a Venezuela, a República Dominicana, a Colômbia ou qualquer outro país latino-americano pela janela de Hollywood? Já é hora, pelo menos, de dispensarmos a mediação da Academia para nos conhecer.

* Observação: os filmes estrangeiros que foram considerados para votação deviam ter sido estreados em seus respectivos países entre 1 de outubro de 2011 e 30 de setembro de 2012. Hollywood anunciará os indicados no dia 10 de janeiro de 2013.