Henrique Custódio: A 'conjuntura' em Portugal

Em todas as línguas há palavras-chave. “Conjuntura” é uma delas, no léxico político nacional. Foi estreada por Mário Soares, quando em 1976 assumiu o 1º Governo Constitucional saído da Revolução de Abril de 1974 e nunca deixou de crescer.

Por Henrique Custódio*, no jornal Avante!

Ao longo dos 19 governos constitucionais, a “conjuntura” fez o seu trabalho, que consistia em “justificar” todas as medidas que foram esboroando as conquistas revolucionárias, reprivatizando a economia, reconstituindo o poder dos monopólios, reinstalando o capital financeiro nas alavancas do poder em Portugal e, finalmente, capturando os apoios sociais do Estado em matéria de Saúde, Ensino e Segurança Social.

Mário Soares e restantes figurões que lhe sucederam no cargo se encarregaram de utilizar a “conjuntura” para ir desmantelando, à peça, o Portugal de Abril.

No início das privatizações, a “conjuntura” exigia-as porque a iniciativa privada “era mais eficiente” – mentira grosseira que, manhosamente, escondia os enormes e garantidos lucros das empresas nacionalizadas ao serviço do povo e do país. O mesmo sucedeu com a destruição da Reforma Agrária e, no passo, da auto-suficiência alimentar por ela encaminhada.

Foi também a “conjuntura” que explicou a sujeição do país aos ditames do FMI em 1977 e 1983 pela mão de Soares, esse homem fatal, bem como a “adesão à Europa”, defendida furiosamente por Mário Soares (pois claro) e que entregaria Portugal aos interesses do grande capitalismo europeu, desembocando no atual desastre que aturde o País.

A União Europeia cumpriria paulatinamente os objetivos do grande capitalismo europeu em Portugal: com os famosos “fundos europeus”, pagou o desmantelamento econômico do país, as novas estradas que facilitassem a entrada de produtos importados e a apropriação do grande recurso nacional, a sua área económica marítima (a 2ª no mundo, a seguir à do Canadá), que passou a ficar sob a tutela “da União”.

Foi este o grande negócio que a “conjuntura” de Soares sobre a “inevitabilidade” da adesão à Europa e a “conjuntura” de Cavaco-primeiro-ministro sobre a “inevitabilidade” do desmantelamento de pescas, agricultura e indústria nacionais conseguiram para o país.

Hoje, o desastre flagrante infligido a Portugal já forçou este Governo farsante e seus co-signatários da troika interna a envolverem tudo e todos na “conjuntura”, que passou a ser de “crise” e se tornou “global”.

O que nenhum diz é que esta “conjuntura de crise” é característica do sistema capitalista e tornou-se de fato “global” quando o capitalismo ascendeu à sua fase imperialista.

Nada disto é novo e foi explicado há quase 100 anos, quando Lênin escreveu em 1916 o seu famoso ensaio O Imperialismo, Fase Superior do Capitalismo.

Quer se queira, quer não, é a Lênin e ao marxismo-leninismo que se terá de regressar para resolver a tal “conjuntura da crise” do capitalismo.

E é a insaciável depredação do capitalismo que a tal vai conduzindo. Inexoravelmente.

* Henrique Custódio é articulista do jornal Avante!