"Estou centrada em liderar PCdoB em 2013", diz Manuela

O Jornal do Comércio de Porto Alegre (RS) desta segunda-feira (25) traz entrevista exclusiva com a líder do PCdoB na Câmara dos Deputados, Manuela D' Ávila. Veja a íntegra.

A derrota nas urnas em outubro do ano passado, quando disputou a prefeitura de Porto Alegre, afastou a deputada dos holofotes. Conforme a parlamentar, os quatro meses subsequentes foram o período de compreender o “recado que o povo deu nas urnas”. Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, a comunista afirma que percebe a quantidade de votos (17,76%) como um pedido de “calma” da população ao seu desejo de comandar a prefeitura de Porto Alegre. 

Manuela avalia ainda que as eleições municipais devem se tornar um aprendizado para que o campo da esquerda não se fragmente e defenda a unidade na construção dos nomes que disputarão o Governo do Estado e a Presidência da República, em 2014. Apesar de classificar a reeleição à Câmara dos Deputados como a hipótese mais provável para o seu futuro político, a comunista não confirma a candidatura.

A deputada, que já foi cotada para assumir uma pasta no ministério da presidente Dilma Rousseff (PT), descarta a possibilidade em 2013 e afirma que seu foco está no comando da bancada do PCdoB – tarefa que assumiu no início de fevereiro.

Jornal do Comércio: Após as eleições, a senhora se manteve afastada do noticiário. Como foi este período?
Manuela d’Ávila: Reassumi o mandato, mas é natural que o destaque de um mandato parlamentar seja inferior ao destaque de uma candidatura majoritária. Mesmo assim, aprovamos o projeto de lei que institui o Vale Cultura e tivemos o debate do Marco Civil da Internet, dois temas vinculados ao meu mandato. Depois tivemos o recesso, e ainda fui escolhida líder do PCdoB na Câmara dos Deputados. É um saldo positivo.

Jornal do Comércio: Com o distanciamento, qual é a avaliação do resultado?
MA: Sempre digo que não sou dos políticos que avaliam que o povo só acerta quando dá votações consagradoras, como as que tive em três das cinco eleições, em que fui a parlamentar mais votada. Não posso achar que o povo só acerta quando me escolhe a mais votada. Acho que o povo fez a sua escolha, foi uma escolha que me tornou derrotada nas eleições, e essa escolha foi a que o povo julgou a melhor. Desejei sorte para o prefeito (José Fortunati, PDT) e sou parceira dele em Brasília. O povo terá quatro anos para avaliar sua escolha. Evidentemente, sou alguém que acredita que Porto Alegre poderia ter outro caminho, diferente do que escolheu. Se não julgasse que Porto Alegre poderia ter outro caminho, mais moderno, mais dinâmico, não teria sido candidata nas eleições de outubro. Mas respeito a decisão do povo e julgo sempre a decisão do povo como uma decisão soberana.

Jornal do Comércio: Como avalia o fato de não repetir as votações consagradoras do Legislativo nas disputas pelo Executivo?
MA: O povo julgou que não era a hora de eu ser prefeita de Porto Alegre nas duas vezes. Sempre tento ouvir o recado que a população me envia. Acredito que o povo gosta do meu trabalho quando me dá muitos votos e diz “calma”, quando não me elege prefeita. Não acho que o povo deixou de gostar de mim porque não me elegeu prefeita, pelo contrário. Ele disse, “nós te respeitamos, mas quem sabe tu prestas mais atenção em outras coisas”. É um recado da população para que eu conheça melhor a cidade, para que fique mais um tempo em Brasília. Enfim, são muitos os recados. O esforço que fiz nesses últimos quatro meses que me separam das eleições é o esforço de compreender que a população tem respeito pelo meu trabalho, o mesmo respeito que tenho pela população quando me esforço para representá-la em Brasília, mas que ela me mandou um recado ao não me eleger. E esse recado é: “Continua teu trabalho em Brasília que acreditamos que não estás pronta para ser prefeita de Porto Alegre”. Esse não é um recado desaforado ou um recado de falta de afeto. É um recado simples, direto, “tu não estás pronta para ser prefeita de Porto Alegre” ou “tu ainda não estás pronta para ser prefeita de Porto Alegre”.

Jornal do Comércio: No início da campanha, o que a senhora denomina como recado parecia encaminhar para a vitória. Qual foi o erro?
MA: A eleição não é a mera soma de erros e acertos e também não é a mera tradução das impressões populares. Eleição é a quantidade de recursos de que as candidaturas dispõem e é a soma dos partidos que as candidaturas conseguem aglutinar. O prefeito Fortunati dispôs de uma grande quantidade de partidos, que representou uma quantidade de tempo de televisão e um montante de recursos muito significativo. Tudo isso fez com que a eleição se desenhasse de uma determinada maneira e fez a população chegar a determinadas conclusões, além das próprias opiniões que já tinha. Por isso, também defendo a reforma política, porque não jogamos o jogo com um time equilibrado. Não pude apresentar o preparo que tenho com o mesmo time, não pude ter o mesmo tempo de televisão, os mesmos recursos para apresentar com as condições que o prefeito apresentou.

Jornal do Comércio: Após as eleições, a senhora classificou como “crônica da morte anunciada” a derrota nas urnas com uma esquerda fragmentada. Quais foram as lições?
MA: Sempre espero que os partidos tirem lições das vitórias e das derrotas. As vitórias às vezes trazem menos lições do que deveriam trazer. Tivemos uma vitória muito bonita em 2010, quando elegemos Tarso Genro (PT) governador do Estado, e essa foi a vitória da unidade. Talvez tenhamos tirado poucas lições da vitória da unidade. Espero que nós tiremos as lições da derrota de 2012, que foi a derrota da fragmentação, para que tenhamos a vitória em 2014.

Jornal do Comércio: Como o PCdoB se coloca diante dessa fragmentação?
MA: O PCdoB vai defender aquilo que defendeu em 2008, em 2010, em 2012: a unidade do campo democrático e popular. Sem esquecer que temos uma questão estruturante que é a continuidade do projeto que comemora 10 anos – o projeto que começamos com Lula –, que é a transformação do Brasil em um País mais democrático, com mais direitos para o povo trabalhador. Os palanques estaduais são importantes. Em todas as eleições, desde 1989, o partido sempre defendeu a unidade. A unidade é um valor importante não como retórica porque fui candidata em 2008 e em 2012. Ela também teve um valor importante em 2010, quando não concorri e ajudamos, com o PSB, retirando a candidatura do deputado Beto Albuquerque (PSB) e construindo a unidade em torno do Tarso. Esse valor continuará sendo o valor que pautará a construção do palanque que defenderemos em 2014. O mais importante é que deve haver unidade em torno de um projeto que defenda as mudanças que começaram há 10 anos no Brasil.

Jornal do Comércio: A oposição do governo de Fortunati também se fragmentou. O PCdoB pode, assim como o PSB, integrar a base do governo municipal?
MA: Para o partido, não houve nenhuma mudança entre outubro e fevereiro que justifique mudar a posição com relação ao prefeito Fortunati e a construção dos caminhos que seguimos na cidade. Para o PCdoB, só se muda de oposição para situação quando mudam os rumos de um governo. E não houve nenhum fato que justifique a mudança de opinião sobre o governo, portanto, não há nenhuma razão que justifique a nossa mudança de opinião sobre a administração municipal.

Jornal do Comércio: Como avalia as primeiras críticas enfrentadas pelo prefeito, como o corte de árvores no entorno da Usina do Gasômetro?
MA: Acho que esse é um traço da personalidade do prefeito com o qual a cidade já convivia antes de ele ser eleito, quando assumiu enquanto vice-prefeito, e conviverá nos próximos quatro anos. É um traço da personalidade dele.

Jornal do Comércio: Qual a avaliação sobre essa postura?
MA: A cidade o elegeu com este traço de personalidade.

Jornal do Comércio: Em 2014, concorre a reeleição?
MA: Estamos mal começando este ano.

Jornal do Comércio: Governar Porto Alegre continua sendo um objetivo?
MA: No dia em que terminou a eleição, disse uma frase que me saiu com muita sinceridade, e me sinto autorizada a repetir: é a primeira vez que termino uma eleição sem compromisso de disputar nenhuma outra. Não sei qual é o meu próximo plano eleitoral. Tenho compromisso com o meu partido de liderar a bancada, o que muito me honrará durante o ano de 2013. Provavelmente dispute a reeleição como deputada federal, mas esta não é uma certeza absoluta. É a primeira vez que não tenho uma próxima eleição traçada como certeza absoluta.

Jornal do Comércio: Cogita ocupar algum ministério ou secretaria de governo?
MA: Estou muito feliz em ser líder da bancada do meu partido. As tarefas partidárias são as que mais me orgulham. É uma bancada muito representativa, e ser líder, para mim, é um desafio grande o suficiente. É nisso que estou centrada para 2013, e isso me orgulha o suficiente.

Jornal do Comércio: Quais os objetivos do ano como líder do partido?
MA: Como 2014 é um ano eleitoral, este ano o Congresso tende a produzir muito. É o ano da decisão dos royalties, e vamos decidir os se recursos serão vinculados à pauta educacional, se haverá uma parcela destinada aos demais estados. Teremos um presidente novo na Casa (Henrique Eduardo Alves, PMDB-RN), e isso pode ter uma relação com a autonomia dos trabalhos dos parlamentares. O presidente é o deputado mais antigo da casa, e isso gera uma expectativa de votação de muitas matérias vinculadas aos parlamentares, que também é algo novo. Há uma expectativa antiga dos deputados em votar a reforma política. Essa é uma pauta antiga que tenho a esperança que se consiga votar, para não enfrentar mais uma eleição presidencial com as mesmas regras e depois mais uma legislatura com os mesmos problemas de sempre.

Jornal do Comércio: A Câmara dos Deputados acumula descrédito da população em função dos escândalos de corrupção. Acredita que será possível votar a reforma política?
MA: O dia em que deixar de acreditar que a política pode ser transformada, deixo de ser parlamentar.

Jornal do Comércio: Nas eleições de 2014, o partido pode apoiar a possível candidatura de Eduardo Campos (PSB)?
MA: A posição é de que a unidade de um campo político é a mais importante sempre. O Eduardo é um grande amigo do PCdoB, o PSB é um partido parceiro do PCdoB, e o Eduardo é um homem do nosso campo. A primeira bandeira nossa é de que o nosso campo deve estar unido. Se o nosso campo não estiver unido, o Eduardo continuará sendo um amigo nosso e o PSB continuará sendo um partido amigo nosso, do nosso campo.

Jornal do Comércio: Mas ainda não há uma definição?
MA: Não. A definição é sempre política. Sempre é de que o nosso projeto seja preservado, que o nosso candidato seja aquele que defenda esse projeto que a gente começou a defender há 10 anos.

Jornal do Comércio: A senhora pretende fazer pós-graduação e ainda não confirmou a candidatura à reeleição. Tem outras pretensões?
MA: Entrei na universidade com 16 anos e fiz Ciências Sociais e Jornalismo acreditando que daria aula. Nunca deixou de ser uma possibilidade, porque ser política não é um emprego. Voltarei a estudar e retomar um rumo que a minha vida deixou de ter porque me elegi a primeira vez.