Nassif: Porque o Banco Central não deveria aumentar a Selic

Em coluna sobre economia, Luis Nassif explica porque o Banco Central não deveria aumentar a Selic, defende o fim do sistema de metas de inflação – proposta mais avançada e original, e dá exemplos de que há formas muito mais eficientes e muito mais baratas para o Tesouro atuar sobre o crédito. 

O principal argumento dos defensores da alta da Selic é que seria a única maneira de atacar de forma generalizada a inflação através da redução da demanda e do nível de emprego. Com menos atividade econômica, haveria desestímulo às altas de preços.

O argumento é falso por inúmeras razões.

O ponto principal, é que a Selic é absolutamente ineficaz para o controle da demanda agregada.

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Meio ponto ou mesmo um ponto na taxa, ou mesmo 3 ou 5 pontos a mais, não têm nenhuma influência nem sobre crédito ao consumidor nem sobre os estoques das empresas.

Se se quiser atuar sobre o crédito, há formas muito mais eficientes e muito mais baratas para o Tesouro (e, obviamente, muito menos rentáveis para os especuladores).

Tome um bem de consumo financiado por 24 meses a uma taxa de 4% ao mês. Se custar R$ 1.000,00, cada prestação sairá por R$ 65,58.

Se a Selic aumentar em meio ponto e essa alta for integralmente repassada para o custo do financiamento, a nova prestação será de R$ 65,86. Alguém deixaria de tomar financiamento por conta de um aumento de 28 centavos?

Suponha que o Banco Central reduzisse o prazo máximo de financiamento para 18 meses. O valor da prestação saltaria para R$ 79,00.

Suponha que a Selic aumentasse em 20 pontos (!). O valor da prestação iria para R$ 76,26, ainda assim inferior à mera redução de 6 meses no prazo de financiamento.

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No caso de capital de giro, suponha uma empresa que tome recursos a 2% ao mês, por prazos de 3 meses. Com o repasse da Selic, haveria um aumento de 0,04% no custo de carregamento dos estoques. Se fosse repassar para os preços, a alta não chegaria a 0,01%.

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Onde a Selic funciona? Apenas no campo psicológico, das expectativas – ou, em palavras mais chãs, da especulação.

Funciona assim:

A confraria da Selic bota a boca no trombone sobre a suposta perda de controle da inflação. A mídia reverbera.

Cria-se a ideia de que o governo é leniente com a inflação. E a única maneira de demonstrar cuidado seria aumentar a Selic.

Algumas grandes empresas de varejo são influenciadas por esse clima. Mesmo sabendo que a Selic não interfere em nada nos dados reais do mercado, tratam de aumentar os preços porque não sabem qual será o comportamento de outros agentes. É aquela história: alguém grita "fogo" no cinema. Tenho certeza de que não há fogo. Mas se não sair correndo poderei ser atropelado pelos que não sabem que não existe fogo.

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A maneira de romper com essa chantagem seria acabar de vez com o sistema de metas inflacionárias como balizador da inflação (por esse sistema, o BC precisa aumentar a Selic toda vez que o mercado acredita que a inflação subirá acima da meta).

Tem que abrir a discussão sobre a ineficácia da Selic e sobre a eficiência maior de outros instrumentos tradicionais de política monetária – as tais medidas prudenciais, o compulsório etc.

Mas o BC, que demonstrou coragem e determinação quando apostou na queda da Selic em agosto de 2011, não parece disposto a arriscar saltos maiores – ainda que inevitáveis.

Delfim Netto, que sabe de tudo, já alertou: se ceder à chantagem do mercado agora, não terá como enfrentar chantagens futuras.

Fonte: Blog Luis Nassif Online