Rosário: "Há um pacto perverso para a verdade não vir a público"

A ministra-chefe da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência, Maria do Rosário foi entrevistada pelo jornal Zero Hora e afirmou conviver com a dificuldade em desvendar mistérios do regime militar. Leia trechos da entrevista abaixo:

Zero Hora — Por que permanece a dificuldade em desvendar crimes cometidos pelo regime militar?
Maria do Rosário — A ditadura não teve apenas uma atuação de violação dos direitos promovendo tortura. Ela também teve agentes profissionais em criar versões errôneas para disfarçar seus crimes. No fundo, havia a consciência de que o futuro não seria conivente com os crimes cometidos. Daí, a preocupação de tudo esconder, de tudo disfarçar.

Os arquivos nacionais foram de fato abertos? Há documentos que sumiram?
No governo federal, todos os documentos que dizem respeito ao período da ditadura militar, que versam sobre direitos humanos, devem ser enviados ao programa Memórias Reveladas, do Arquivo Nacional. É uma decisão da presidente Dilma, reforçada na própria na Lei de Acesso à Informação.

Mas a determinação vem sendo cumprida?
É uma determinação para todo o governo. Documentos oficiais que estão de posse formal do Brasil foram disponibilizados. Se existem outros documentos, que foram subtraídos, fica difícil dizer.

A Comissão Nacional da Verdade tem poder de confiscar acervos de documentos que estão com civis ou militares?
A comissão tem o poder de fazer a busca a qualquer momento, mas parece ainda ter um movimento de perversa disciplina, de cumprir primeiro a responsabilidade com a sua corporação, deixando de lado a história do país e a democracia.

A comissão vai completar o primeiro ano em maio. Qual a sua avaliação até o momento?
Talvez a comissão sofra as mesmas dificuldades que todos os que trabalham pela verdade sofrem até hoje: as informações são fragmentadas e contraditórias sobre os mortos e desaparecidos. Os verdadeiros agentes do período não falaram e não tiveram até o momento a dignidade de falar a verdade.

A senhora é favor de ampliar o prazo de trabalho da comissão, que expira em 2014?
Não tenho posição firmada sobre prorrogar ou não. É uma decisão da presidente, mas certamente a comissão terá bons resultados.

Dos casos sem solução, a Guerrilha do Araguaia é emblemática. Quais as dificuldades para localizar os corpos?
Nossa obrigação é seguir buscando, mas enfrentamos barreiras em uma região úmida, com rios e de floresta. No entanto, a principal dificuldade é a ausência de informações efetivas e até as ameaças feitas a pessoas da região que tentam colaborar com nossas buscas. É uma situação absurda. Há um pacto perverso para a verdade não vir a público.

Existe a possibilidade do Brasil reconhecer por escrito que não encontrou os corpos por ter destruído os cadáveres?
Claro que existe, mas antes de chegarmos a essa medida precisamos fazer o máximo.