"Segurança humana": Um conceito em desenvolvimento

A Organização das Nações Unidas destacou nesta semana que a comunidade internacional deve combater as desigualdades sociais e econômicas entre as regiões e dentro dos países, já que o empenho é "fundamental para alcançar a sustentabilidade e evitar crises". Neste sentido, conceitos como o de "segurança humana", em detrimento do conceito de "segurança" tradicional (militarista e estatocêntrico) têm sido desenvolvidos com vigor.

Por Moara Crivelente, da redação do Vermelho

Refugiados - AFP/Getty Images

Na década de 1980, ficava cada vez mais evidente a insuficiência do conceito de "segurança" com foco na Defesa, sobretudo territorial, frente aos desafios que se evidenciavam, como a probreza e a exclusão.

De acordo com o professor português José Manuel Pureza, "a identificação tradicional da segurança com a segurança do Estado até então permitiu (e permite) a legitimação não apenas de regimes que internamente são, por si só, a principal fonte de insegurança de suas populações, como [também] a conservação da ordem internacional prevalecente e da militarização das relações internacionais para esse fim".

A ONU foi o principal veículo na propagação deste novo conceito, ainda em desenvolvimento. Entretanto, a discussão também deu espaço a princípios questionáveis, como as "intervenções humanitárias", alegadamente para fazer frente às vulnerabilidades dos chamados "Estados falidos" (de governos incapazes ou insuficientes na promoção dos direitos sociais, econômicos e políticos da sua população, e consequentemente, da sua segurança humana).

“As sociedades onde a esperança e as oportunidades são escassas estão vulneráveis a revoltas e conflitos“, disse o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, em debate temático da Assembleia Geral sobre a desigualdade. Entretanto, a militarização da ajuda humanitária e a "securitização" da própria política também são fatores considerados com preocupação, mesmo em relação às missões da ONU.

Desenvolvimento como segurança

Ban observou que as metas de combate à pobreza (conhecidas como Objetivos de Desenvolvimento do Milênio) foram extremamente bem sucedidas, mas que o progresso tem sido desigual, e sublinhou a importância de a agenda de desenvolvimento pós-2015 lidar com essas desigualdades e promover a prosperidade compartilhada.

Para o presidente da Assembleia Geral, Vuk Jeremić, a realização da transição universal para a sustentabilidade exige um compromisso maior dos países para reduzir a distância entre os que têm e os que não têm, e pediu aos Estados-membros que trabalhem juntos para atender às necessidades “dos muitos que foram deixados para trás”.

Neste sentido, lembra o professor Pureza, o Relatório sobre o Desenvolvimento Humano, do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), de 1994, é considerado "o instrumento fundador do conceito de segurança humana", pois identifica como características essenciais: a natureza universal das preocupações em que se baseia o conceito; a interdependência dos problemas que o motivam; sua natureza preventiva; e sua centragem nas pessoas.

Entretanto, o progresso deste conceito nas relações internacionais continua em risco, principalmente a partir da instalação da "guerra ao terrorismo", desde 2001. Para o professor, ela está "construindo um suporte quase impositivo de uma acentuação das preocupações de segurança tradicionais, reabilitando, em grande medida, o velho papel policial dos Estados."

Ainda assim, relatórios como o da Comissão de Segurança Humana, de 2003, continuam enfatizando a "centralidade das novas ameaças à segurança, como a fome e a sede, o crescimento demográfico ou o desequilíbrio ambiental e a necessidade de proteção especial dos grupos humanos particularmente vulneráveis como sujeitos privilegiados de segurança".