Entrevista de Barbosa não recupera sua imagem desgastada

O desgaste da imagem pública do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa, acentua-se, sensivelmente, desde que se recusou a prestar maiores esclarecimentos sobre a compra de um apartamento avaliado em cerca de R$ 1 milhão, em Miami, Estado norte-americano da Flórida, com recursos de uma empresa offshore da qual é sócio majoritário, conforme denúncia publicada no site do jornalista Miguel do Rosário, do blog O Cafezinho.

A negativa de Barbosa acumula-se a outros fatos controversos, como a contratação do filho dele, Felipe Tavares Barbosa Gomes, em um programa da Rede Globo de Televisão, após ser visto, no Maracanã, durante os jogos da Copa das Confederações, no camarote do apresentador Luciano Huck, hoje patrão de seu primogênito. O magistrado chegou a figurar em algumas pesquisas de opinião como possível candidato à Presidência da República.
 

Neste domingo (28), o ministro Barbosa até que tentou se explicar à opinião pública, em uma entrevista à jornalista Miriam Leitão, publicada na edição passada do diário conservador carioca O Globo. Mas o resultado, segundo a avaliação de comentaristas, nas redes sociais, foi pior a emenda do que o soneto. Na conversa com Leitão, Barbosa nega que será candidato à Presidência da República em 2014 e sugere que o Brasil ainda não está pronto para ele.

Chegou a insinuar que o Itamaraty teria práticas racistas por não aprová-lo, quando tentou a carreira diplomática, no que foi rechaçado, em nota do Ministério das Relações Exteriores:
“Recorda-se, por oportuno, que o Itamaraty mantém programa de ação afirmativa a Bolsa Prêmio Vocação Para a Diplomacia, instituída com a finalidade de proporcionar maior igualdade de oportunidades de acesso à carreira de diplomata e de acentuar a diversidade nos quadros da diplomacia brasileira. Lançado em 2002, o programa já concedeu 526 bolsas para 319 bolsistas afrodescendentes. Dezenove ex-bolsistas foram aprovados no Concurso de Admissão à Carreira de Diplomata e integrados ao Serviço Exterior Brasileiro. As bolsas concedidas têm atualmente o valor anual de R$ 25.000,00 e devem ser utilizadas na compra de materiais de estudo e no pagamento de cursos preparatórios. Esse programa tem melhorado, de forma concreta e decisiva, as possibilidades de ingresso na carreira diplomática por candidatos afrodescendentes”, diz o Itamaraty, em nota divulgada na manhã desta segunda-feira.

Sem coragem

Para o blog O Sintonia Fina, na internet, a entrevista de Barbosa teria sido a oportunidade mais fácil para ele pontuar o que quisesse, pois Leitão se mostrou “uma jornalista sem coragem, que foge do enfrentamento que se espera no desdobramento de cada pergunta”. Na entrevista, segundo o blog, “é possível notar que o ministro Joaquim Barbosa procura encaminhar o assunto na direção de que todas as críticas que lhe são endereçadas têm como pano de fundo o preconceito racial. Quem leu a entrevista ficou esperando que a jornalista apresentasse um complemento de pergunta para as respostas duras e cortadas que o ministro lhe apresentava. Barbosa inverteu os papéis e deu o tom da entrevista, Míriam Leitão não teve coragem de lhe replicar e contestar”.

“Quando Barbosa disse que ‘a Folha (de S. Paulo) expôs seu filho numa entrevista de emprego’, faltou Míriam Leitão perguntar se ele não considerava impróprio seu filho trabalhar na Rede Globo, e ser contratado após o ministro ter assistido uma partida de futebol no camarote de Luciano Huck”. Ato seguinte, o diário conservador paulistano respondeu ao ministro, também por meio de nota, “que o presidente do STF não desmente nem corrige nenhuma das informações publicadas” e que “o ministro Joaquim Barbosa ainda não está acostumado ao cargo, que o expõe ao escrutínio público e reduz sua privacidade”.

Ainda em relação à entrevista dele, neste domingo, “quando Barbosa falou em ‘falta de honestidade em pessoas com responsabilidade de vir a público e dizer que as coisas não estão funcionando’ faltou perguntar quem são essas pessoas”, acrescenta o blog.
Ao se referir à compra do apartamento, em Miami, Barbosa diz que “houve uma brutal violação da minha privacidade”. Segundo o ministro, trata-se de um imóvel “modesto”, nos Estados Unidos, e Leitão não perguntou, diz o blog, o que o o magistrado teria a dizer “não sobre o valor do imóvel e nem sobre a procedência lícita do dinheiro com que fez a compra, mas sim sobre o fato da transação ter sido realizada por U$ 10 Dólares, sobre ele ter criado uma empresa especificamente para isso, e aparecer como presidente da empresa o que não é permitido a um Membro do Judiciário”.

Nesta manhã, a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) manifestou-se sobre a empresa do presidente do STF, criada com o único objetivo de adquirir o apartamento em Miami e que tem como sede o imóvel funcional onde ele mora. Para o presidente Ajufe, Nino Toldo, o fato de a empresa estar sediada no imóvel funcional que Barbosa ocupa “é gravíssimo, do ponto de vista ético”. Segundo ele, “não é dado a nenhum magistrado, ainda mais a um ministro do Supremo, misturar o público com o privado”. E acrescenta:

"Dos magistrados, espera-se um comportamento adequado à importância republicana do cargo, pois um magistrado, seja qual for o seu grau de jurisdição, é paradigma para os cidadãos".

Mídia subterrânea

“Míriam Leitão não teve coragem nem de defender a imprensa, da qual faz parte, quando Barbosa afirmou que os jornais e os jornalistas estão ultrapassando limites, por conta do medo de que ele eventualmente se torne candidato à Presidência da República. Nem contestou o Ministro quando ele disse que ‘não vejo a mesma exposição da vida privada de pessoas altamente suspeitas da prática de crime’ ou quando Barbosa, discorrendo sobre a existência de racismo no Brasil, criticou os meios de comunicação por não promoverem uma discussão consistente sobre essas questões”.

Ainda segundo O Sintonia Fina, o ministro Joaquim Barbosa “encontrou espaço para, diante da pergunta se os réus do ‘mensalão’ serão presos, fazer um ‘alerta” (ameaça?) aos blogueiros que, segundo o Ministro, tem-lhe atacado. Barbosa chamou de ‘mídia subterrânea’ os blogs que são anônimos, e aguarda o momento de identificar a todos, inclusive os que financiam tais blogs, e que vai ‘desmascarar esses bandidos”.

Durante a entrevista, Barbosa voltou a agredir o jornalista Felipe Recondo, do diário conservador paulistano Estado de S. Paulo. Recondo foi atacado, em março deste ano, quando apurava informações sobre as mordomias do Judiciário e gastos de cerca de R$ 90 mil na reforma de um banheiro. Neste domingo, ele atacou Recondo, novamente, dizendo que ele é uma “personagem menor”, em conflito de interesses no Tribunal. Barbosa baseia sua afirmação no fato de a mulher do jornalista trabalhar no STF e, segundo sua lógica, ele não poderia apurar informações relacionadas à Corte Suprema. Caso seguisse este critério, o próprio ministro estaria impedido de julgar a Rede Globo caso lhe chegue às mãos o processo em que a empresa é ré, no rumoroso caso de sonegação de impostos, ou sequer aceitar prêmios da emissora, como ocorreu recentemente; até mesmo conceder a entrevista para Miriam Leitão, posto que o filho, Felipe, foi contratado pela empresa.

O Estadão, em nota divulgada também nesta segunda-feira (29), reagiu à afirmação de Barbosa afirmando que o ministro foi “no mínimo insincero” ao pedir desculpas. À época da agressão, Barbosa divulgou nota na qual se desculpava diante da repercussão aos xingamentos dirigidos ao jornalista.

Fonte: Correio do Brasil