José Dirceu: OMS apoia programa Mais Médicos

O programa Mais Médicos, lançado pelo governo federal para tentar suprir a carência de profissionais em municípios afastados dos grandes centros urbanos, tem enfrentado grande contrariedade de entidades que representam a categoria. Orientadas por um corporativismo poucas vezes visto, elas têm empreendido uma campanha vigorosa contra a proposta.

Por José Dirceu*, em Brasil 247

Presidenta Dilma Rousseff durante lançamento do programa "Mais Médicos"/
Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom / Agência Brasil

Segundo os dirigentes dessas entidades, as medidas apresentadas pelo governo federal não ajudarão a solucionar os problemas da saúde pública no país. Essa visão, entretanto, não é compartilhada pela Organização Mundial de Saúde (OMS), justamente o organismo que tem por finalidade elevar os padrões de saúde em todo o mundo.

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Depois de divulgar que vê o programa com entusiasmo, a OMS emitiu nota em que afirma que as medidas propostas guardam coerência com resoluções e recomendações da organização, especialmente no que diz respeito à cobertura universal e ao fortalecimento da atenção básica. A nota diz ainda que o programa está direcionado a construir maior equidade nos benefícios que toda a população recebe do Sistema Único de Saúde (SUS).

As iniciativas que estão sofrendo maior resistência por parte de segmentos da categoria são a contratação de profissionais estrangeiros para trabalhar em locais específicos e a criação do segundo ciclo do curso de medicina. Os alunos que entrassem no curso a partir de 2015 teriam que atuar por dois anos na rede pública, sob supervisão das universidades.

Mas o programa prevê também maior investimento em infraestrutura e a criação de cerca de 12 mil vagas de residência médica até 2017 para formar especialistas em áreas prioritárias, com 4 mil novos postos já disponíveis em 2014, além da expansão das vagas de graduação em cursos de medicina. Até 2017 serão 11.447 novas vagas distribuídas em 117 municípios brasileiros.

Para a OMS ações como a atração de médicos para comunidades afastadas e a ampliação de matrículas de estudantes são corretas para curto e médio prazos. A agência lembra que países com os mesmos problemas e preocupações do Brasil, desde os mais desenvolvidos como o Canadá até a pequena República Dominicana, estão colhendo bons resultados da implementação dessas medidas.

E ainda que as entidades médicas insistam em refutar dados e estatísticas que comprovam a falta de médicos e a distribuição desigual desses profissionais pelo país, a OMS é enfática ao assegurar que o Brasil apresenta média de médicos com relação à população menor que a média regional e a de países com sistemas de referência, tanto no continente americano como em outras regiões do mundo.

Seria interessante saber o que os diretores das entidades e os médicos que tanto criticam o programa, o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, e o governo federal, têm a dizer sobre as declarações da OMS. Repletos de autoridade na hora de deslegitimar a proposta do governo para atender a uma demanda urgente, sobretudo, da população mais vulnerável do país, o que diriam sobre as considerações da OMS? Ou será que a OMS não possui credibilidade junto à categoria?

Cabe ainda perguntar aonde estavam as entidades médicas quando o Senado rejeitou a manutenção da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), com os parlamentares tucanos à frente, retirando R$ 350 bilhões da área da Saúde. Aonde estavam enquanto sindicatos, movimentos populares e diversas organizações da sociedade civil se uniam para lutar por 10% do orçamento federal para a Saúde? E mais: por que se calaram quando o governo do ex-presidente FHC privatizou boa parte do atendimento à Saúde, relegando o SUS ao segundo plano? Afinal, lutam pela Saúde ou pela categoria?

É evidente que o programa Mais Médicos, em análise no Legislativo, pode e deve ser aperfeiçoado, e que se deve procurar dialogar o máximo possível, tanto com entidades médicas, quanto com reitores dos cursos de medicina e com toda a sociedade. Só não será possível continuar negando, de forma mesquinha, aquilo que é inegável: faltam médicos para atender a população brasileira.

O balanço final do programa, divulgado dia 29, contabilizou o cadastro de 3.891 médicos com diploma brasileiro inscritos para participar da iniciativa. Os médicos com diploma estrangeiros que entregaram a documentação são 766, mas o número ainda pode aumentar, já que eles têm até 8 de agosto para concluir o processo. Já os municípios que aderiram ao programa são 3.511, solicitando, juntos, 15.460 médicos para trabalhar na atenção básica. Os números mostram claramente a discrepância entre a demanda e a oferta.

Espera-se que as considerações favoráveis da OMS sobre o programa revigorem o debate, elevando-o à importância que tem aquilo que é do interesse comum. Seria muito mais produtivo se, ao invés de boicotar das mais variadas formas o programa e as iniciativas do governo, as entidades médicas usassem sua energia para ajudar na construção de soluções de curto e médio prazo para uma questão que não é só de um governo, mas de toda uma nação.

*advogado, ex-ministro da Casa Civil e membro do Diretório Nacional do PT