Milhares saem às ruas pela Reforma Urbana em todo o país

Milhares de pessoas participaram nesta quarta-feira (28) da Marcha Pela Reforma Urbana em todo o país. A mobilização foi articulada pelo Fórum Nacional de Reforma Urbana e se estendeu em pelo menos 13 estados. “A pressão deve vir das ruas. Entendemos que este é o momento para avançar na luta por uma cidade pensada e planejada para seus moradores”, destacou Bartíria Lima Costa, presidenta da Confederação Nacional das Associações de Moradores (Conam),que integra o Fórum.


marcha pela reforma urbana são paulo / fotos: deborah moreira

A presidenta da Conam esteve presente na marcha que percorreu as ruas do Centro da cidade de São Paulo. Um grupo com cerca de 500 manifestantes fez na região uma peregrinação aos órgãos governamentais onde foram entregues cópias de uma carta com reivindicações das organizações presentes que compõem o Fórum, como movimentos populares, associações de bairro e institutos de pesquisa e promoção da cidadania.

As entidades, que atuam na luta pela moradia, transporte público de qualidade e redução da tarifa, trabalho decente, educação e saúde, foram recebidas em diversos órgãos que tratam da política de moradia e transporte. Na Caixa Econômica Federal a carta foi entregue ao gerente regional da Superintendência, Antonio Marsura. Na Companhia de Desenvolvimento habitacional e Urbano (CDHU) a assessora Sandra Branco, assessora do subsecretário da Agência Paulista de Habitação Social Casa Paulista, Reinaldo Iapequino; na Secretaria Estadual de Transporte Metropolitano foi entregue ao assessor Renato Amaral.

Já no gabinete do prefeito Fernando Haddad, na Praça Patriarca, onde se encerrou a marcha, foram recebidos pelo presidente da Companhia Metroplitana de Habitação de São Paulo (Cohab), Luiz Carlos Antunes Corrêa, que até discursou para os presentes. Entre outras coisas, ele falou que a administração tem entre suas prioridades a retomada dos mutirões que estão paralisados: "O prefeito já pediu que se dê prioridade para o que ainda precisa ser concluído nos mutirões, paralisados por algum motivo."


Presidente da Cohab fala ao movimento de moradia

A retomada dos mutirões também faz parte dos itens da carta entregue, bem como a reurbanização de favelas e cortiços, entre outros. Bartíria Lima Costa falou da importância da mobilização pela reforma urbana nas ruas e nos espaços de articulação como a 5ª Conferência das Cidades, que acontecerá em Brasília (DF), entre 20 e 24 de novembro.

"Estamos fazendo uma grande pressão neste dia em todo país. A reforma urbana é de suma importância para nós movimentos populares. Está na ordem do dia, nas ruas e também da 5ª Conferência Nacional das Cidades”, lembrou Bartíria Lima Costa, se referindo ao processo da Conferência, que atualmente ocorre em nível estadual. As conferências são espaços abertos à participação popular, de interação entre a sociedade e governos. Esta edição que debaterá as cidades é promovida pelo Ministério das Cidades e tem como tema “Quem muda a cidade somos nós: Reforma Urbana já!”. O objetivo é colocar na agenda política nacional questões que sempre foram tratadas de forma isolada e localmente como as ocupações em área de risco, saneamento ambiental, regularização fundiária, conflitos fundiários, urbanização de assentamentos precários, acesso à moradia para a população de até 3 salários mínimos e mobilidade urbana.


Bartíria discursa durante concentração

“Trabalhamos com quatro eixos importantes para a construção de um sistema nacional de política urbana: a função social da propriedade, que inclui a discussão do direito à cidade e da aplicação do Estatuto da Cidade, que ainda não ocorre nos municípios e estados, que precisam adequar seus planos diretores para contemplar a função social da propriedade; a participação e o controle social nos conselhos, onde é possível discutir a política urbana; fundo único para o desenvolvimento urbano com recursos do governo federal, dos estados e municípios juntos para que possamos ter o controle dos recursos e de sua aplicação; a questão territorial e federativa, que compreende entender a especificidade de cada região do país”, detalhou Bartíria sobre a visão da Conam para uma política urbana.

Maria José da Silva, a Lia, presidenta da Federação das Associações Comunitárias do Estado de São Paulo (Facesp), também destacou a mobilização em torno da conferência: “A reforma urbana é o nosso foco na Conferência das Cidades. Precisamos levar para esse campo de disputa as demandas e necessidades da população em todo o Brasil.” Ela reforçou ainda a mobilização popular nos diversos espaços. “Só conquistamos as transformações com o povo na rua cobrando. Quem fica de braço cruzado não tem conquista.É preciso participação, manifestação e unidade no movimento”, completou Lia.


Lia, presidenta da Facesp, durante a marcha no Centro de S. Paulo

Concentração

A concentração da marcha no centro de São Paulo começou por volta das 9 horas, na Praça da Sé, onde lideranças do movimento discursaram e lembraram a pauta de reivindicação. Também esteve presente o deputado estadual Alcides Amazonas (PCdoB),que lembrou que as pautas que compõem a reforma urbana foram as que mais apareceram nas manifestações de junho. “Ficou muito forte o clamor pela reforma urbana com a questão da mobilidade, além da moradia, educação, saúde. Está muito difícil viver nos grandes centros urbanos e as pessoas buscam realizar seus sonhos, como o da casa própria”, declarou o parlamentar que destacou a atuação da militância comunista nessa frente: “A mobilização pela reforma urbana, pela moradia é essencial para fazer com que os governos acordem e atendam as reivindicações. Nós do PCdoB , eu como deputado e a nossa militância toda, estamos aqui para dar total apoio a essa luta justa em São Paulo”.

Nelson Saule Júnior , diretor do Instituto Polis, se emocionou bastante em sua fala no ato. Para ele trata-se de um momento de sensibilização da sociedade “sobre a emergência das nossas cidades serem pensadas com outra perspectiva, principalmente de cidades que enfrentam as desigualdades, injustiças e esse modelo atual de desenvolvimento como os megaprojetos e megaventos que não está levando em conta a vida das pessoas, e sim os interesses econômicos.”


Concentração na Sé

“Aqui em São Paulo, por exemplo, o projeto do Rodoanel que há anos está retirando muitas famílias de suas casas e também o projeto de transporte nas Águas Espraiadas, que vai retirar toda a comunidade do entorno ali. É preciso pensar em uma cidade de inclusão e não de segregação, onde uma grande maioria vive nas periferias e em situação precárias. Não tem nenhuma política efetiva para garantir moradia digna para essas famílias”, enfatizou ao Vermelho Nelson Saule, que atua no Fórum Nacional de Reforma Urbana desde sua origem, durante a constituinte na década de 1980.

O representante do Instituto Polis, especialista em Direito, lembrou que o Código de Processo Civil está passando por uma revisão e que corre-se o risco das reintegrações de posse ficarem de fora. Os movimentos organizados defendem que haja uma revisão no sentido de incluir procedimentos mais sociais, instrumentos de mediação e negociação durante as reintegrações. “Tem que haver uma visão social no sentido de atender essas famílias antes de jogá-las na rua. Hoje em dia elas não têm nem o direito de defesa, não tem audiência, suas causas nem são apreciadas pelo judiciário. As pessoas são expulsas dos locais e removidas sem o direito fundamental da ampla defesa”, explicou Nelson Saule, lembrando que essa será uma luta das mais difíceis orque a bancada ruralista é contra qualquer perspectiva de mediação desses conflitos.

Reforma agrária

As lideranças presentes também lembraram que o caos em que se encontram as cidades é fruto de uma ausência de uma política para o campo, que na década de 1970 expulsou milhões que saíram em busca de uma vida mais digna. “O êxodo rural não foi enfrentado bem como não foi dada a devida atenção sobre o impacto desse grande volume de pessoas chegando nos centros urbanos. A falta de planejamento nas cidades para comportar esse grande número de pessoas gerou o caos, as ocupações desordenadas e a falta de infraestrutura. Se tivesse ocorrido a reforma agrária não estaríamos aqui reivindicando todas essas questões”, ressaltou a presidenta da Conam, que completou: “Estaríamos certamente tratando a questão urbana de outra forma, pensando no futuro, planejando. Porém, temos um passivo, um déficit muito grande e que não é tão simples de resolvê-lo”.


Final da marcha, em frente à prefeitura

Mas, a liderança do movimento urbano enfatiza que a reforma agrária continua sendo tão essencial quanto antes. “A reforma urbana é para resolver algo que não foi resolvido lá trás. Mas, a reforma agrária também precisa acontecer para que os espaços se organizem, se relacionem, dando dignidade para as pessoas, para que elas não precisem mais migrar para as grandes cidades em busca de sobrevivência. É preciso dar um fim a esse caos”, concluiu.

CPI do metrô tucano

As denúncias sobre a formação de cartel de empresas em licitações de obras do Metrô de São Paulo e da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos também faz parte do conjunto de reivindicações do movimento de moradia. Os militantes exigem que elas sejam apuradas em uma comissão parlamentar de inquérito (CPI) na Assembleia Legislativa. A CPI já foi proposta, mas até agora não alcançou o número mínimo de assinaturas, 32.

“Se as notícias que estão saindo na imprensa nacional e internacional forem verdades, podemos estar diante do maior escândalo de corrupção da história de São Paulo nos últimos 20 anos”, disse o deputados Alcides Amazonas, que acompanhou a mobilização dos estudantes na terça (27) na Alesp para pressionar os parlamentares para assinarem o requerimento de instauração da CPI.

“Os que ainda estão indecisos ou vacilando é preciso pressioná-los para que possam assinar o requerimento para dar uma resposta à sociedade sobre o que ocorreu nos últimos 20 anos com as administrações dos ex-governadores Mário covas, José Serra e a atual de Geraldo Alckmin”, exclamou.

Palácio

Um grupo de 2.000 manifestantes, que se concentraram no Largo da Batata, seguiu em marcha até o Palácio dos Bandeirantes, na região do Morumbi, em São Paulo. Uma comissão foi recebida governador do Estado, Geraldo Alckmin.

Deborah Moreira
Da redação do Vermelho