Getúlio Vargas: Reforma Urbana; o direito à cidade

Entre as reformas democráticas que o PCdoB defende em seu Programa Socialista a Reforma Urbana é uma agenda que tem prioridade na vida da nossa população. As manifestações de junho e julho, entre outras bandeiras, apontaram para o direito à cidade, à mobilidade e a gestão democrática em nossas cidades.

Por Getúlio Vargas Junior*

Hoje mais de 85% da população vivem nas cidades, convivendo a falta de moradias, saneamento, infraestrutura e mobilidade. Desde 2001, quando o então Deputado Federal Inácio Arruda, PCdoB-CE foi relator do Estatuto da Cidade (lei 10.257/01), e a construção do Ministério, Conferência e Conselho das Cidades em 2003, tivemos um salto nos instrumentos das políticas urbanas com a construção, entre outras, de leis setoriais de habitação (Lei 11.124/05), saneamento (Lei 11.445/07) e, recentemente, mobilidade urbana (Lei 12.587/12). 

Todos estes instrumentos determinam que as cidades elaborem planos setoriais, com participação popular e controle social efetivo. Estes planos são pactos das cidades na construção de suas prioridades. É dever dos comunistas, não somente os que atuam na frente comunitária, acompanhar o debate da elaboração destes planos.

Destacaria entre estes planos setoriais o Plano de Mobilidade Urbana. As cidades tem até 2015 para elaborar este plano e a grande maioria das cidades, mesmo com a forte mobilização de junho e julho muito pouco se tem falado e feito no sentido de implementar a lei e elaborar democraticamente os planos de mobilidade urbana.

Mas se nestes dez anos de Governo Lula-Dilma avançamos na construção de instrumentos como as leis setoriais e o Minha Casa Minha Vida (Lei 11.977) – que trata da regularização fundiária na segunda parte da lei, muito ainda tem que ser feito para que estes instrumentos saiam do papel para entrar na realidade de nossas cidades.

A clara opção de setores no núcleo do Governo reafirmam a prioridade de sustentar acordos políticos com setores do centro e até mesmo conservadores se reflete na dificuldade de implementar os instrumentos construídos e de romper com a lógica tradicional de construção das cidades, privilegiando os interesses econômicos em detrimento da função social da cidade e da propriedade, previstos em lei.

Desta forma é que os recursos dos PAC’s da Mobilidade e Infraestrutura, além do Minha Casa Minha Vida, embora sua origem tenha sido uma medida anticrise, têm sido investidos na maioria das cidades sem debate com as comunidades e, até, ocasionando deslocamentos involuntários (despejo) de milhares de famílias.

Em muitas cidades o Minha Casa Minha Vida tem grande dificuldade de construir moradias para famílias de baixa renda e quando constrói tem sido afastado do centro, devido a forte especulação imobiliária. Ou seja, enquanto o Poder Público constrói a estrutura necessária à especulação se apropria desta riqueza produzida coletivamente, reproduzindo a lógica do capitalismo.

A mobilidade urbana é uma das questões do momento, além do valor alto das tarifas de transporte coletivo, a qualidade não condiz com o valor cobrado. São nos bairros periféricos que isto fica mais evidente. Qual qualidade de vida que pode ter um trabalhador que fique mais de 3 horas por dia, além da jornada de trabalho dentro do transporte coletivo?

A política nacional da mobilidade urbana democratiza a mobilidade da cidade priorizando o transporte não motorizado e o transporte coletivo sobre o transporte individual motorizado, além de priorizar a multiplicidade de modais. Na elaboração do Plano de Mobilidade a cidade pode debater a concessão e a tarifa do transporte coletivo, tudo com garantia da participação popular. Como outras leis é nosso desafio a implementação desta lei como instrumento do embate político em nossas cidades buscando avançar nos conceitos de direito à cidade e mobilidade urbana.

Mesmo os novos setores médios conseguiram alçar um novo patamar de renda, mas ainda não possuem os serviços e equipamentos públicos necessários para que se caracterizem como uma classe média. Neste sentido enquanto não se qualificar o transporte coletivo ele não será de fato uma alternativa e a tendência é que tenhamos ainda mais carros nas ruas e mais imobilidade.

Muitas medidas simples jogam papel importante na democratização da mobilidade das cidades, como pintar faixas exclusivas, proibição de estacionamento em vias que circula o transporte coletivo, racionalização e integração dos sistemas de mobilidade, mas é importante que este debate seja travado e que os comunistas tenham protagonismo neste tema que tem mobilizado tantas pessoas.

Se a reforma urbana é uma das reformas democráticas necessárias para a construção de um novo projeto nacional de desenvolvimento, a mobilidade é um tema que se destaca pela histórica falta de planejamento e de intervenção do poder público nesta questão.

Os comunistas têm atuado nas três frentes de acumulação de forças com quadros destacados na mobilização pela reforma urbana, mas ainda de forma pouco coordenada. É desafio para o próximo período o aumento da sistematização do acumulo deste fértil terreno para construção de mudanças e aplicação dos instrumentos conquistados.

Somente colocando a Reforma Urbana no centro do debate político do próximo período é que poderemos avançar na construção de cidades mais justas, democráticas e participativas. É fundamental que o PCdoB tenha secretaria ou quadros destacados para tratar da temática da Reforma Urbana – e consequentemente das políticas de mobilidade, habitação, saneamento e planejamento urbano, no Comitê Central e nas demais instâncias de direção partidária.

* Getúlio Vargas Júnior é membro do Conselho Nacional das Cidades e militante do PCdoB de Porto Alegre