Edson França: Madiba 

A notícia do falecimento de Nelson Mandela, ou Madiba, apesar de esperada, deixa a UNEGRO, o movimento negro e toda humanidade consternada. A luta de Mandela contra o regime do Apartheid na África do Sul é uma importante página da história, inspirará todos que lutam por liberdade, defendem causas justas e universais.

Por Edson França, presidente da Unegro
 


Foto: The Guardian

Madiba manteve-se íntegro, ideologicamente firme, nunca reconheceu a legitimidade do regime e do governo do apartheid, mesmo em momentos de eminente perigo e duras dificuldades. Sempre obstinado na luta por justiça, foi perseguido, viveu na clandestinidade e amargou 27 longos anos na prisão.

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Encarcerado, Mandela não abandonou a luta, mesmo sob as vicissitudes do isolamento, da privação da vida familiar que muito lhe custou, do árduo trabalho forçado, do sadismo dos carcereiros, manteve-se livre pela força da mente e instou seus companheiros a estudarem, se unirem e compreenderem que esses e todos os atos de questionamento e desobediência aos ditames da administração da prisão significava, em última instâcia, um confronto ao regime, por isso, uma ação política em pró da revolução sul africana.

Madiba foi um líder reto, hábil, sensível, não se consumiu pelo ódio, não se perdeu em conflitos ou diferenças étnicas, não trocou sua liberdade pelo atraso da luta de seu povo – apesar de sistematicamente estimulado.

Foi corajoso, responsável e perspicaz, compreendeu – ainda na prisão – o momento exato para iniciar o processo de negociação com seus opressores, sempre consciente do seu papel histórico e da aguda sensibilidade política dessa atitude, com isso superou o medo de ambas as partes, a desconfiança, a ambiguidade e o ego. Resultando em sua libertação e de todos presos políticos sul-africanos, na volta dos exilados, no direito ao sufrágio universal e na ascensão do CNA ao poder.
No poder optou pela reconciliação, perdão e unidade nacional, pela construção de uma democracia multirracial. Seus inimigos era a opressão e o racismo, nunca o indivíduo branco. Essas lições são férteis aos que lutam contra injustiças históricas que ainda persistem. É possível mudar.

Mandela e os comunistas

Mandela desde muito jovem se relacionou com os comunistas, foi da juventude comunista, tinha companheiros de prisão integrantes do CNA e do Partido Comunista da África do Sul, sempre foi criticado pela sua ligação com os comunistas. Em 1964, durante o processo de Rivônia, quando questionado sobre sua relação com os comunistas, disse:

“Por várias décadas os comunistas eram o único grupo político na África do Sul que estava preparado para tratar os negros como seres humanos e seus iguais; que estavam preparados para comerem juntamente conosco; conversar conosco, morar e trabalhar conosco. Em função disso, há muitos africanos negros que, hoje em dia, tendem a igualar a liberdade com o comunismo”.

Madiba relata em sua autobiografia (Longa Caminhada até a Liberdade) que o maior medo, depois motivo de forte tensão imposta pelos representantes do regime do apartheid nas rodadas de negociação foi a ligação do CNA e dele – líder máximo do CNA – com os comunistas, inclusive houve ameaças constantes de rompimento unilateral das negociações se o CNA mantivesse aliado ao comunistas. Mandela não transigiu, afirmou que não reconheceria nenhum processo de negociação sem a presença dos comunistas, pois eles se constituíam na força fundamental de luta e resistência contra o apartheid.

Em sua visita ao Brasil, em 1991, foi condecorado com o título de Cidadão Paulistano na Câmara dos Vereadores de São Paulo por iniciativa do então vereador comunista Vital Nolasco. Foi homenageado na Assembleia Legislativa na Sessão Solene proposta pelo então Deputado Estadual do PCdoB Jamil Murad. Atos simbólicos que denotam a total sintonia, comprometimento e envolvimento dos comunistas em todo mundo com a causa que Mandela representava.

Continuidade

Mandela transformou a África do Sul, no entanto, há enormes desafios no campo econômico, político e social para que o país se desenvolva e liberte seu povo da pobreza e da desigualdade, aproximando do ideal de uma nação sem dominação branca ou negra, democrática e livre, onde as pessoas convivam em harmonia e oportunidades iguais. Esse era o sonho pelo qual Madiba dedicou sua vida.
Madiba ficará para seu povo e para humanidade como ficou Zumbi, Simon Bolívar e Gadhi. Símbolos que em vida e após inspiram a humanidade ao caminho da justiça, conciliação e paz.