Geovani Machado: Unegro lança Carta Aberta em defesa da juventude

Como resultado da oficina “Não à criminalização e extermínio da Juventude Negra” durante o Fórum Social Temático 2014, ocorrido de 21 a 26 de janeiro, em Porto Alegre, a União de Negros pela Igualdade (Unegro) apresentou Carta Aberta como contribuição às resoluções apresentadas ao FST, durante a Assembleia dos Movimentos Sociais.

Por Geovani Machado, Unegro-RS*

Na década de 1990, muitos seguimentos do movimento negro brasileiro, incluindo a Unegro, lançaram uma campanha nacional “Não matem os nossas crianças e jovens” denunciando o genocídio contra a juventude, especialmente contra a juventude negra.

Tal campanha fora pautada à época pelo alarmante crescimento de homicídios de jovens entre 15 e 24 anos que, segundo os dados extraídos do próprio Governo Federal, atingiam um patamar alarmante de 88%. Sendo que as mortes que envolviam jovens negros e afrodescendentes era 74% maior do que os jovens brancos, geralmente assassinados por arma de fogo. Os dados atualizados sobre as mortes Brasil, também apresentados pelo Governo brasileiro, a partir do Subsistema de Informação sobre Mortalidade (SIM/DATASUS) ligado ao Ministério da Saúde apontam mais de 52 mil assassinatos por homicídios no Brasil. Destes, 24.500 encontram-se na mesma faixa etária diagnosticada anteriormente, ou seja, jovens dos 15 aos 24 anos (52,6%). Destaca ainda que o sexo masculino perfaz 93% deste total, e 72% destes são negros (pretos ou pardos) oriundos das periferias brasileiras.

Estes dados somente confirmam aquilo que o Movimento Negro denuncia há décadas: existe por parte do Estado uma conivência frente a tal violência que necessita encontrar mecanismos urgentes para avançar em políticas públicas que efetivamente alcancem a juventude brasileira, especialmente a juventude negra das franjas periféricas do país.

Percebemos que algumas iniciativas apontam para este enfrentamento a partir de inciativas do Conjuve – Conselho Nacional de Juventude – e da Secretaria Nacional da Juventude que, em 2011, criou a Sala de Situação da Juventude Negra, mas que, apesar de algumas articulações importantes, ainda não alçou voo para efetivamente chegar, de fato, na base do enfrentamento ao genocídio que ocorre, todos os anos de nossa juventude negra brasileira.

Passo adiante

O poder público, em todas as esferas e instâncias de poder necessitam urgentemente ter responsabilidade e assumir para si a tarefa de estancar ou minimizar o genocídio de nossa juventude, em especial a pobre e negra, visto que não há mais como tolerar uma situação grave como esta, onde as vítimas não param de crescer a cada diagnóstico. Os acontecimentos de junho de 2013 e as ocupações dos shoppings centers devem servir como um alerta. Precisamos de mais democracia e participação política, pois na maioria destes espaços: Legislativo, Executivo e mesmo no Judiciário, o povo, o trabalhador, as mulheres, especialmente a população pobre, negra e da periferia, não se vê representada. Mais do que isto, há uma crescente movimentação em torno de grandes e profundas reformas no Brasil, da qual o Movimento Negro inicia seu engajamento para que se materializem reformas profundas como a reforma política, por exemplo, lideradas pela OAB, CNBB, UNE e outras importantes organizações. O Estado brasileiro necessita avançar na democracia representativa e participativa e renegar sua característica atrasada e conservadora, onde os interesses das classes dominantes são preservados em detrimento da população.

Abaixo a íntegra da Carta:

Contra a criminalização e Extermínio da Juventude Negra

A Unegro – União de Negros pela Igualdade -, reunida neste Fórum Social Temático 2014, vem por intermédio desta Carta Aberta manifesta-se publicamente pela contrariedade ao projeto de Redução da Maioridade Penal, visto que tal iniciativa visa oficializar a criminalização da juventude brasileira, especialmente a juventude negra e pobre uma vez que, grande parte deste seguimento juvenil vive em áreas precárias nos bairros periféricos brasileiros.

A Unegro acredita que já avançamos em programas que visam incluir parte da população pobre em espaços de consumo, de programas alimentares, de educação e habitação, isto, porém não basta. É necessário construirmos uma agenda de profundas reformas estruturais que objetivem construir um país mais justo e democrático como: Reforma Política que possibilite a ampliação dos negros e negras nos espaços de poder e decisão; Reforma da Mídia que democratize os meios de comunicação e que acabe com o monopólio da imprensa que hoje criminaliza os jovens e os movimentos sociais; Reforma Jurídica que objetive defender e não criminalizar nossa juventude; Reforma da Educação que objetive ampliar o acesso dos jovens e das crianças em uma rede de ensino democrática e libertadora.

E, sobretudo uma reforma que objetive universalizar o acesso da juventude negra às políticas públicas inclusivas como acesso ao emprego de qualidade, a cultura, ao lazer, ao esporte, devolvendo a dignidade, a autoestima e a perspectiva de futuro sem extermínio para os jovens negros brasileiros.

Porto Alegre, 25 de janeiro de 2014 – Fórum Social temático.

* é professor, Mestre em Geografia (UFRGS) e Diretor da Unegro RS. O artigo foi publicado no site da Unegro. Título original "Unegro lança Carta Aberta na Assembleia dos Movimentos Sociais" alterado por redação Vermelho.