Ditadura iniciou desmonte e privatização da educação pública 

A ditadura instaurada em 1964 iniciou o processo de deterioração da educação pública brasileira. Essa foi a principal opinião expressada por especialistas e parlamentares durante audiência pública realizada, nesta quinta-feira (24), na Câmara, para debater os impactos do regime militar sobre o sistema educacional do País. A atividade foi promovida por iniciativa das deputadas Alice Portugal (PCdoB-BA) e Fátima Bezerra (PT-RN), das comissões de Cultura e de Educação.  

 Primeiro convidado a falar, o sociólogo Emir Sader lembrou que o “ataque” à educação pública foi um dos pilares ideológicos dos setores militares e civis que assumiram o poder em 1964. Para ele, a intervenção no campo educacional estava situada no mesmo contexto de violação dos direitos civis e políticos, bem como do rompimento do projeto econômico nacionalista e popular que buscava se consolidar através das reformas de base.

“Até aquele momento, a escola pública era um lugar importante de socialização e de convivência de setores de classe média e setores pobres. A deterioração dos serviços públicos em geral se refletiu na deterioração do ensino público, fazendo com que a classe média passasse a fazer um esforço orçamentário enorme – e hoje é algo naturalizado – para colocar seus filhos nas escolas particulares, e a escola pública passou a ser coisa de pobre”, disse Emir, que é professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e da Universidade de São Paulo (USP).

Fátima Bezerra endossou essa avaliação. “Existe um mito de que a escola pública era boa na época da ditadura, mas a realidade é que foram os militares que promoveram o desmonte da educação pública e iniciaram o processo de privatização do ensino no Brasil”, esclarece a parlamentar, que também lamentou os assassinatos de estudantes e a repressão ao movimento estudantil e ao movimento docente nos Anos de Chumbo.

A socióloga e cientista política Ana Prestes, da Comissão de Cultura, representou a deputada Alice Portugal, que participava no mesmo horário de outro compromisso. Ela destacou os impactos da ditadura na população do interior do Brasil, “onde foi deixado o medo e o abandono, gerado por aquele processo que precisa ser curado por todos nós”, defendo a continuação do processo de democratização, que ainda não terminou.

Ela disse que participou, no último feriado, do encontro de duas caravanas, a que relembrou a Coluna Prestes e a Guerrilha do Araguaia e a Caravana da Anistia, que percorreram cinco cidades da região do Araguaia e puderam ver “in loco” a situação do interior do Brasil, que reflete o estado de abandono e medo em que foram deixadas aqueles populações e que precisam ainda ser resgatadas.

Perseguição aos professores

O presidente do Instituto Paulo Freire (IPF), Moacir Gadotti, destacou a perseguição que sofreram os educadores que elaboraram o Plano Nacional de Alfabetização (PNA) por causa da metodologia emancipatória que o programa utilizava. “O PNA foi extinto no dia 14 de abril (de 1964), por um decreto do presidente interino, Ranieri Mazzilli, um dia antes de Castelo Branco tomar posse. E eu me pergunto: por que tanta pressa em punir esse programa e o seu autor, que foi Paulo Freire?”, questionou Gadotti.

“Havia, nas palavras de Anísio (Teixeira, um dos pioneiros da chamada “Educação Nova”), um entusiasmo pedagógico, um otimismo pedagógico que foi interrompido em 64”, complementou o presidente do IPF.

O professor Sadi dal Rosso, da Universidade de Brasília (UnB), também mencionou o afastamento de professores que o regime considerava incômodos. “Só na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, mais de vinte docentes foram afastados das suas funções”, citou Rosso.

Aproveitando o debate sobre o Plano Nacional de Educação (PNE) e o contexto eleitoral, Emir Sader sugeriu que fosse feito um pacto que envolvesse todos os candidatos aos governos estaduais, para que se comprometam a tornar o seu estado um “Território Livre do Analfabetismo” no prazo máximo de quatro anos. Sader informou que o pré-candidato petista ao governo do Rio de Janeiro, senador Lindberg Farias, já assumiu esse compromisso.

De Brasília
Márcia Xavier
Com agências