Na Ucrânia há uma ofensiva militarizada com metas totalitárias

Os Conselhos Operários e Populares na Ucrânia Oriental são um embrião da democracia socialista. As milícias populares são o germe de um Exército de Libertação. Análise de James Petras em CX36, segunda 5 de maio de 2014, por CX36, Radio Centenário desde Montevidéu (Uruguai).

Efraín Chury Iribarne: Comecemos por Ucrânia, onde ocorreu um massacre e particularmente os jornais alemães revelaram que é muito numerosa a quantidade de assessores da CIA e do FBI que estão em Kiev neste momento.
JP: Há que se analisar a situação em conjunto. O governo em Kiev é produto de um golpe financiado pelos EUA, é um governo com uma Junta Civil Militar, porém não tem o apoio de muitos setores da sociedade, inclusive em Kiev. Mais que isso, afetaram a setores importantes do exército.

Então, não há quase nenhum setor da sociedade que seja fiel à Junta de Kiev. Por isso, para fortalecer a Junta, os EUA mandou três tipos de interventores. Uma é a força especial que está contratando mercenários para atuar em favor de Kiev; em segundo lugar, a Polícia Federal, o FBI estadunidense que está se organizando para purga e as investigações ao redor do governo para evitar que surjam outras mobilizações contra a Junta. E, por último, a CIA, que está trabalhando com os fascistas e neofascistas organizando os massacres que vimos em Odessa.

Então, o que falta ao governo da Junta em Kiev, EUA – principalmente – lhes estão dando, o substitui com sua própria força. É uma força intervencionista para fortalecer um regime muito frágil que perdeu o apoio que teve nalgum momento. Assim, para seus esforços de conquistar o Leste somente tem as forças especiais capazes de massacrar e matar seu próprio povo.

Eu creio que a imprensa ocidental é muito cúmplice nisto. Não falam do povo Ucrâniano democrático antijunta, falam de 'setores pró-russos', como se não tivessem uma identidade Ucrâniana, já que a grande maioria são operários industriais e suas preocupações não são com a Rússia, mas sobre a perda de seu trabalho, a perda de renda, a perdade de estabilidade, a perda de democracia – por limita que seja.

Porém, ao invés disso, podemos ler no 'Financial Times', no 'La Nación' de Argentina e na imprensa pseudoprogressista como o 'Página/12' argentina, ou o 'La Jornada' mexicana, todos fazem a mesma caracterização que a imprensa burguesa: são os 'pró-russos' os que estão protestando e a violência não se pode atribuir a nenhum setor, porque ambos os bandos estão envolvidos. Quando esta notícia circula, no melhor dos casos confunde as pessoas no Ocidente, no pior dos casos estimula a agressividae contra o povo Ucrâniano.

EChI: A situação violenta se mantêm então?
JP: Não é violência. É uma ofensiva centrada no genocídio contra os que falam russo na Ucrânia, que em grande parte são proletários, operários que trabalham na indústria siderúrgica, nas minas de carvão, nas empresas manufatureiras, particularmente do setor armamentista. São os que falam russo os que estão cultivando as terras negras da Ucrânia, etc.

Devemos ter claro que há uma ofensiva militarizada com metas totalitárias, que quer fazer uma grande purga na Ucrânia para afastar todas as forças que estão contra o rompimento de relações com a Rússia e estão contra a subordinação à OTAN e Europa. Porque sabem que o comércio com a Rússia é muito favorável à Ucrânia, enquanto que o comércio com a Europa e os EUA destruirá 90% das indústrias ucranianas.

Essa é a situação que devemos entender. Não é simplesmente uma situação de violência. Os Conselhos Operários e Populares na Ucrânia Oriental são um embrião da democracia socialista. As milícias populares são o germe de um Exército de Libertação, não são simplesmente violentos, como a imprensa apresenta na propaganda ocidental. São formas autônomas de atuar do povo. Não são o produto da intervenção russa, pelo contrário a Rússia adotou uma posição bastante distante dos acontecimentos. A Rússia simplesmente queria voltar a um governo estável, um governo neutro frente aos grandes blocos, etc. O que a Rússia apoiava na Ucrânia antes do golpe de Estado era um governo de centro-direita que mantinha relações econômicas com a Rússia e com a Europa.

Agora, com o governo dominado pela OTAN [NATO] tomou posições críticas, porém a Rússia não tem nada que ver com a auto-organização, a democracia dos Conselhos, nem com as milícias populares. Isso não existe na Rússia, porém sim que existe na Ucrânia Oriental como forma de resistência aos neofascistas e aos golpistas em Kiev.

EChI: Fala-se do apoio de Polônia e dos países bálticos aos fascistas ucranianos.
JP: Bem, a Polônia está dominada por governos muito de direita. O que existe na Polônia é uma mescla de nacionalismo patológico com subordinação à OTAN [NATO]: a Polônia foi o país que mais apoiou a política direitista dos EUA, foi um grande apoio desde Reagan a Bush, os presidentes mais agressivos dos EUA. Os governantes tem fobia contra a Rússia, tem fobia contra o comunismo. E, não me surpreenderia que os polacos estejam treinando aos setores mais direitistas, mais fascistas na Ucrânia, apesar de que os fascistas massacraram aos polacos na Segunda Guerra Mundial. Não importa a história, o que importa é a coincidência entre a política dos neofascistas na Ucrânia com a dos governantes na Polônia de hoje.

EChI: Vimos a Venezuela, onde assassinaram a um guarda-costas de Maduro, o que demonstra que a direita segue atuando.
JP: Os fascistas e os golpistas na Venezuela não pararam, suas organizações se mantêm intactas, perderam alguns cabeças – algum prefeito, algum dirigente, etc.- porém a estrutura segue e mantêm relações clandestinas com os empresários e os setores de direitae que estão negociando com o governo.

Creio que o setor capitalista busca extrair as maiores concessões, ou dizendo melhor um 'pacto de produção' com o governo de Maduro. Enquanto separam aos fascistas, para em qualquer momento marcar distâncias e inclusive poderem chegar a denunciá-los. Porém, ao mesmo tempo seguem tratando de libertar aos fascistas encarcerados.

Portanto, mantêm um discurso duplo: buscando um pacto e condições favoráveis com o governo, fundamentalmente receber dólares para as importações, a especulação e o roubo; e por outro lado não descartam o recurso aos fascistas em qualquer momento.

É uma situação complexa. Devemos dizer que apesar de que existem setores capitalistas que estão negociando seriamente com o gobierno de Maduro, inclusive alguns deram declarações favoráveis às medidas pró-capital de Maduro; contudo, não estão satisfeitos com o Presidente no estratégico. O querem substituir por algum deles, para desbaratar completamente a parte social da política atual.

Então, há um cabo de guerra na direita, segundo os momentos e circunstâncias. Neste momento, com a queda dos direitistas e o fim das grandes mobilizações, buscam conseguir nas negociações o que não conseguiram nas ruas.

EChI: O presidente uruguaio José Mujica – que diz ser muito amigo de Maduro e que o foi de Chávez também – em sete dias estará visitando a Casa Branca e segundo disse, na conversação com Barack Obama "não se calará nada". O que pode surgir dessa reunião?
JP: Em primeiro lugar, há que saber que apesar de que a imprensa e o oficialismo seguem tratando ao governo de Mujica como de 'esquerda', a imagem de Mujica é muito positiva nas páginas financeiras aqui e entre os círculos mais influentes do capitalismo. Estão muito impressionados com a política de abertura aos grandes capitais e ao investimento estrangeiro, fundamentalmente na mineração e na agricultura.

Em segundo lugar, consideram que é muito favorável à estabilidade política que os governantes da Frente Ampla tenham imposto no Uruguai, sobretudo o ambiente para os investimentos, que entendem que é muito mais favorável no Uruguai que na Argentina. O Brasil ou o Paraguai. Portanto Mujica vem aqui com uma grande percepção positiva.

Agora, se ele quer mencionar algo sobre Venezuela, Obama vai-lhe dar um tapinha no ombro, o vai escutar, lhe dirá que podem ter divergências entre as grandes convergências, etc. Porém, não vão a levar a sério o que Mujica diga sobre alguma mudança no que se refere à política estadunidense para Cuba ou Venezuela.

Ocuparão 95% do tempo a falar dos negócios, da colaboração do Uruguai nos assuntos militares e econômicos, das convergências estratégicas e a busca de fortalecer esses laços capitalistas. Isto me parece mais provável de acordo com os indícios; não se espera nenhuma ruptura, nem mesmo muito menos que isso, sabendo que as críticas e divergências são à margem das conversas 'sérias'.

EChI: Estes últimos minutos, como sempre, os deixamos para que nos fale dos temas em que estejas trabalhando e queira destacar.

JP: Bom, há dois temas. O primeiro é o massacre de Odessa. Os fascistas entraram em Odessa com ônibus e helicópteros que lhes deu o governo de Kiev. Isto é, o assassinato num incêndio de mais de 40 pessoas em Odessa foi algo planificado, não foi simplesmente um 'conflito' espontâneo. Ademais, as vítimas foram mulheres e adolescentes que buscaram refúgio da multidão fascista da rua. E o ato de assaltar e queimar aos refugiados a sangue frio, me parece um dos piores atentados nos últimos anos em toda Europa. É difícil imaginar um ato tão friamente calculado como esse.

Enquanto a imprensa no ocidente está tratando de disfarçar este massacre como se fosse um conflito, como se tivesse sido um grupo marginal ou provocadores. Porém, está muito claro que os que estão envolvidos são os mesmos que compartilham o governo da Junta em Kiev. Que o terrorismo forma parte da política de advertir a quem simpatiza com a independência e a autonomia da Ucrânia do Leste, que buscam uma democracia, de que vão sofrer as mesmas consequências. É um castigo exemplar dos fascistas, para aterrorizar e induzir a outros setores a sair do país.

Finalmente o que buscam é limpar a Ucrânia de milhares e milhares de pessoas que simpatizam com as reivindicações democráticas e linguísticas. Querem uma Ucrânia governada pela Junta fascista que atua sob o controle da Europa e dos EUA, sem oposição e nenhum vínculo com a Rússia.

Este massacre me parece algo similar ao que se passava na Rússia durante a época do Czar, quando em Odessa ocorreram muitos pogroms. Hoje são pogroms contra os russos. O legado atual das Centúrias Negras é a direita fascista que hoje está fazendo o mesmo, porém como não há judeus estão matando aos democratas, aos operários e aos simpatizantes da democracia.

O outro tema que queria tratar é a detenção de Gerry Adams, dirigente do Sinn Feinn irlandês, que foi detido três semanas antes das eleições. O Sinn Feinn é o Partido Republicano que quer a independência da Inglaterra e Adams está encarcerado faz quatro dias [já foi liberado] sob interrogatório de mais de 7 horas por dia, acusado de estar envolvido num assassinato há 40 anos.

Esta é uma provocação eleitoral para tratar de frear o crescimento dos nacionalistas republicanos frente à falta de apoio daqueles que buscam a unidade com a Inglaterra. E, não há nenhum protesto no mundo anglo-saxão contra esta intervenção, esta provocação.

Gerry Adams é o líder no Sinn Feinn, é muito popular e está crescendo em popularidade, tem muitas possibilidades de aumentar o número de representantes no Parlamento Europeu, por isso sempre as eleições no mundo burguês estão sob a intervenção das forças da direita. O caso Gerry Adams é outro exemplo de que quando as forças progressistas estão a ponto de influir seriamente no processo, eles buscam pretextos para deteriorar essas opções.

*www.radio36.com.uy – Escutar: http://content.jwplatform.com/players/f26JABm6-WTuD9Czf.html

Fonte: Diário Liberdade