Quem confia no tucano Aécio Neves?

O grande mote da entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo do candidato tucano à Presidência da República, o oligarca mineiro Aécio Neves, foi a palavra “confiança”.  

Por José Carlos Ruy  

Aécio Neves
A entrevista ocorreu na segunda-feira (2), no programa “Café da manhã Estadão Corpora”, promovido pelo jornal O Estado de S. Paulo e a Agência Corpora Reputação Corporativa (que, como o próprio nome indica, foi criada para promover grandes empresas). Na tarde da sexta-feira (30) estava confirmada a presença de 425 empresários na plateia, mas apenas 300 compareceram, uma quebra grande nesse ambiente tão disciplinado e mobilizado como é o dos grandes empresários. 
 
O que causou a ausência acentuada de um número tão grande de convidados que haviam confirmado a presença? O frio? Talvez não, mesmo porque são pessoas acostumadas, e que muitas vezes apreciam as temperaturas baixas com as quais convivem nos EUA ou na Europa de seus sonhos, Ou talvez seja a confiança no candidato, indicando que ela pode não andar tão aquecida? 
 
A notícia do jornal O Estado de S. Paulo (no dia 3) comemorou o encontro e anunciou que o candidato tucano representa o resgate da confiança na economia e favorece um ambiente propício às reformas tributária e política. Mas não traz detalhes a respeito do programa econômico do cardeal tucano que, entretanto, apressou-se a desmentir que fará grandes mudanças na legislação trabalhista caso ocorra o improvável e ele seja eleito em outubro. Isso apesar de já ter declarado repetidas vezes a intenção de flexibilizar a lei em benefício dos empresários e do capital. Mesmo assim ele se disse favorável ao estreitamento da relação direta entre trabalhadores, sindicatos e empresários – uma referência oblíqua à flexibilização e ao dogma tucano de dar maior peso ao negociado do que aquilo previsto em lei.
 
Outra insistência tucana que apareceu na entrevista foi a reiterada condenação da política externa soberana praticada desde o início do governo de Luiz Inácio Lula da Silva, em 2003. Aécio condenou aquilo que chamou de alinhamento ideológico a anacrônico, que seria praticado pelo Itamaraty. Ele, os tucanos e a elite financeira do Brasil preferem, como sempre deixaram claro, o alinhamento e a subordinação do país e de sua política externa aos ditames do Departamento de Estado dos EUA e das chancelarias europeias, e não aceitam o fortalecimento das relações Sul-Sul, com o Brics, do Brasil com seus vizinhos latino-americanos e africanos, opção que fundamenta a autonomia e a soberana na política externa do Brasil, e o crescimento de seu prestígio como protagonista das relações internacionais – e é isso que o tucanato e seus parceiros apelidam de “anacrônico”.
 
Mas estes são temas secundários neste comentário que se volta à tônica da manifestação do candidato do PSDB, destacada na manchete na capa da edição de O Estado de S. Paulo nesta terça-feira (3): aquilo que chamaram de volta da confiança (a manchete diz: “Aécio diz que é candidato da ‘confiança’”). 
 
Na entrevista Aécio afirmou: “expectativa é um componente importante. Tenho expectativa de que poderemos ter um efeito inverso ao ocorrido em 2002, quando era uma imprevisibilidade e ele foi obrigado a fazer uma carta aos brasileiros” (ele referiu-se à primeira eleição de Lula para a Presidência da República, e ao clima de forte desconfiança que surgiu entre setores das classes dominantes). 
 
Cabe a pergunta: confiança de quem, e para que? O candidato tucano repete pretensões que já foram derrotadas pelo eleitor, e anuncia a intenção de promover retrocessos como uma reforma política restritiva à liberdade de organização partidária (quer uma lei draconiana que limite o número de partidos políticos a um máximo de oito agremiações); a adoção do voto distrital misto, esta excrescência antidemocrática que provoca protestos nos países onde é praticado, como a Inglaterra e mesmo nos EUA, devido às graves distorções que impõe à representação popular para favorecer os mais conservadores; Aécio falou também em reforma tributária sem dar detalhes das mudanças que pretende e que, pode-se adivinhar, visariam apenas a beneficiar o capital e seus lucros.
 
O próprio Aécio deu uma pista para a resposta à pergunta sobre quem confia nele quando se referiu à Carta aos Brasileiros, de 2002. Lula precisou dela porque, tendo a confiança do povo e do eleitor, precisava deixar claro aos donos do capital e do poder de fato na sociedade brasileira que não rasgaria os “contratos”. Os donos do dinheiro não confiavam em Lula, como agora não confiam em Dilma Rousseff. 
 
Aécio, por sua vez, frequenta o mesmo ninho habitado pelo capital financeiro. E, na remota possibilidade de sua eleição para a sucessão presidencial em outubro próximo, não terá necessidade de uma declaração semelhante àquela que consta da Carta aos Brasileiros pela simples razão de ser um deles, de ser a expressão do capital financeiro, sendo por isso liberado do um compromisso imposto a Lula em 2002. O grande capital financeiro confia em Aécio Neves. Já os eleitores, estes querem outro rumo. Querem manter e aprofundar o rumo das mudanças assumido pelo Brasil desde 2003. E que será reiterado em outubro, com a reeleição da presidenta Dilma Rousseff.