Rodolfo Lima: Política, pingos nos is na hora de decidir

Quem vive a política do país há tantos anos, como eu, não pode deixar de fazer analogias. A direita sempre teve como carro-chefe a corrupção – dos outros – para sensibilizar os incautos. Sempre atribuiu ao alheio a sua condição de corrupto e jogou para debaixo do tapete as suas próprias mazelas. Foi assim na morte de Getulio, foi assim na aventura Jânio Quadros, foi assim no caçador de marajás Collor, que acabou sendo cassado.

Por Rodolfo Lima*, no Correio do Brasil

O príncipe da Privataria

Alguém viu (ou verá) a nossa “integra” mídia dissecar a privataria tucana denunciada em livro que é bem contundente quanto aos desmandos dos tucanos? Jogou-se ou não se jogou para o fundo do túnel a questão do metrô de São Paulo? O que se fez com o Arruda, do ponto de vista da punição? O que é feito do Demóstenes e de outros banhistas na “Cachoeira” que, de repente, deixou de jorrar? O mensalão mineiro vai ser tratado em casa e o aeroporto do Aécio pode ser que venha a ser usado para receber os convidados – mídia global, especuladores de mercado, elite raivosa e tantos mais – no caso – por todos os modos infeliz – da vitória do neoliberalismo.

Parafraseando o Lula, “nunca na história desse país” se viu tanta desfaçatez na produção de “fatos”. Se tivéssemos uma justiça eleitoral preocupada efetivamente com as influências nefastas na opinião dos eleitores, enquadraria esse pessoal que faz vazar declarações como se fossem fatos, declarações que, diga-se, estão sendo dadas por alguém que, em um passe de mágica, pode passar de uma pena de 50 anos de cadeia para o saudável convívio com seus familiares. Delação premiada ou ativa participação eleitoral, com a compra da liberdade?

Tenho dito sempre que a hipocrisia, como a desonestidade ou a corrupção, não admite gradação. Não há maior ou menor hipocrisia, assim como inexiste desonestidade mínima ou máxima, corrupção de grande ou de pequeno porte. A hipocrisia da nossa mídia, por exemplo, é tão grande quanto a que ela denuncia na política. A sua desonestidade é tão grande quanto qualquer outra quando sonega informações ou trata com privilégios certos pontos de vista sem a apresentação equivalente do contraditório. E ela é cúmplice da corrupção quando, em nome de interesses políticos, elege a dedo um caso e deixa de lado, acintosamente, todos os demais, que têm como protagonistas os seus aliados. Nesse aspecto, o que vejo de pior não são os bilionários donos do monopólio da comunicação no país, fruto de um sistema injusto e perverso de desigualdades, mas os jornalistas – alguns travestidos de economistas – que fazem direitinho o que seu mestre manda, envergonhando a profissão.

Essas eleições colocarão frente a frente, não os nordestinos contra os do sul, mas os desfavorecidos de todas as regiões contra os que não suportam ver os seus aeroportos – até então exclusivos – tomados por “uma gente estranha”. Elas oporão um projeto focado em programas sociais por outro que enfatiza o mercado, esse mercado podre – de endinheirados e especuladores – que brinca com as ações da Petrobras com a irresponsabilidade de quem só tem compromisso com o dinheiro, com muito dinheiro.

Nem tudo vai bem no país, no campo econômico, mas é desonesto não reconhecer que nem tudo vai bem no planeta em geral e, pior, reservar ao Brasil o “status” de patinho feio entre cisnes que não existem. Os idólatras do malfadado FMI, entreguistas de carteirinha, deveriam, ao menos, ler as recentes declarações daquele “organismo” e sua avaliação sobre a política mundial.

Não sou petista. Nessas eleições votei , inclusive, em candidatos que não aceitam o PT, mas que possuem razões que eu respeito. Sou um professor, ensino aos meus alunos a preocupações com a ética em primeiro lugar , bem longe da corrida pelo dinheiro que empobrece o espírito dos endinheirados. Sou da classe média – poderia até dizer que do seu segmento mais alto, tal a desigualdade no país – , mas nem por isso voto olhando para interesses pessoais que amesquinhariam o meu voto.

A essa altura da minha vida, agora e sempre, estarei votando naqueles que , embora com desacertos, tiram as pessoas da miséria nesse país que só é rico para os ricos. Os brasileiros- todos, aliás – deveriam se perguntar se, nesses 12 últimos anos, alguma medida econômica do governo os tornou mais pobres. Esse é, aliás, o lado negativo do governo Dilma: além dos pobres, até os ricos se beneficiaram ainda mais: bancos deitaram e rolaram com seus lucros astronômicos , agências reguladoras mantém cumplicidade lamentável com os inqualificáveis planos de saúde e as oportunistas empresas de telecomunicações (orgulho dos privatistas). E coisas do gênero que, certamente os neoliberais só farão aumentar.

Nada disso, porém, me impede de posicionar-me a favor de medidas que se voltem para a diminuição das desigualdades sociais, para o combate à miséria, para a dignidade do ser humano, para a afirmação da cidadania. Como ignorar os inéditos e baixíssimos índices de desemprego entre nós, as significativas quedas na mortalidade infantil, o aumento das expectativas de vida, os níveis de redução do trabalho escravo? Como ignorar que esses governos tiraram algumas dezenas de milhões de pessoas da pobreza, através de programa consagrado no mundo inteiro? Como não valorizar o acesso de milhões de pessoas a bens e serviços, a ponto de constituírem uma “nova classe média”? Como não nos orgulharmos da ascensão internacional do país, que hoje tem interferência no cenário mundial? Como colocar-se contra um programa que pretende levar médicos a quem não tem, em nome de corporativismos perversos?

Voto em Dilma. E, aqui, coloco – uma vez mais – os pingos nos is. Cada um os põe onde quer, é certo. Mas essa gente neoliberal, ávida por explorar mais e mais os recursos nacionais, nunca escreve os is com os devidos pingos…

*Rodolfo Lima é advogado e professor de Língua Portuguesa e Literatura com atividade em diversas instituições do Rio de Janeiro. Colunista do Direto da Redação(Correio do Brasil) no período de setembro de 2010 a janeiro de 2014.