Em entrevista, Roberto Amaral diz "vejam o som ao redor" sobre o PSB

O cientista político, ex-ministro da Ciência e Tecnologia entre 2003 e 2004, Roberto Amaral, era vice-presidente do PSB antes da morte do presidente do partido, Eduardo Campos. Logo depois foi afastado da presidência da sigla. No domingo (14) concedeu entrevista ao Jornal do Comércio, de Pernambuco. O histórico socialista reafirmou suas críticas às posições do PSB, falou de traição e do abandono da legenda do campo da esquerda. Segue abaixo:

Roberto Amaral

Afeito a palavras precisas, Roberto Amaral, um histórico socialista, prevê uma crise não só política, mas eleitoral no PSB. Rifado da direção nacional do partido, ele evita “fulanizar” na entrevista que concedeu ao JC, mas critica o “líder” que se vale de “sucessos burocráticos”. Recomenda aos “políticos pernambucanos”, por fim, o filme o Som ao Redor.

Jornal do Comércio: Com a guinada à direita, o PSB saiu menor da eleição?
Roberto Amaral: O PSB, do ponto de vista eleitoral, saiu como entrou. Do ponto de vista político, saiu-se muito mal. Abandonamos nosso campo tradicional, o da esquerda. Tenho a impressão de que esse triste movimento, afora a traição programática, pode revelar-se amanhã um desastre do ponto de vista eleitoral. O que salvou nosso desempenho na Câmara foi a bancada eleita em Pernambuco, mas sabemos que as circunstâncias eleitorais em 2014 não se repetirão a cada quatro anos.

Pesou contra a aproximação com nomes ideologicamente contrários?
Sim, estão hoje ao lado do PSB tradicionais adversários do partido e do dr. Arraes. O mais simbólico, sem entrar no mérito pessoal, é o senador Jarbas Vasconcelos.

Com a ausência de Eduardo existe uma crise de lideranças naturais. Temos dois jovens técnicos…

As lideranças normalmente se formam no processo político. Dificilmente se constrói uma liderança partidária limitada a sucessos burocráticos. O Eduardo assumiu a liderança do PSB no plano estadual e nacional após longa militância. Não vejo ninguém hoje na direção do PSB com esse perfil. Tenho para mim que não basta ser prefeito ou governador para automaticamente tornar-se líder político. Quantos prefeitos e governadores, em Pernambuco, desapareceram na rolagem do tempo?

No segundo turno, o PSB optou pela oposição, aliando-se ao PSDB. Agora, se declara independente, mais próximo dos partidos de direita, sem, no entanto, alinhado formalmente.
Desde 1985, essa é a primeira vez que o PSB se define pela não definição. O partido vai ser chamado seguidamente a definir-se. Não dá proclamar-se de esquerda no genérico e votar pela direita. No tempo do dr. Arraes, o PSB tinha clareza de qual era o seu campo. É diferente do que ocorre hoje, quando absorvemos oligarquias reacionárias. Você não pode associar essas ideias com as que defendem hoje Aécio Neves ou Roberto Freire ou Jarbas Vasconcelos. Lembre-se que há a considerar, por um compromisso de honra, a história recente do embate de Jarbas com dr. Arraes e com Eduardo. A única vez que em que o dr. Arraes foi atacado em sua honorabilidade foi no caso dos precatórios.

Quando da aliança do PSB ao PSDB, o senhor falou que Pernambuco não fugiu a sua história do coronelismo…
O dr. Arraes nunca pertenceu à elite pernambucana. Nunca foi por ela absorvido, era tolerado como inevitável. Jamais se vinculou pessoalmente ou vinculou o PSB à tradição reacionária que separa nosso povo entre os da casa-grande e os da senzala. O grande latifúndio se acabou, a usina fechou, os filhos dos senhores feudais foram pra Recife, viraram classe média, estão procurando emprego no serviço público, mas continuam arrogantes. Recomendo aos políticos pernambucanos assistir esse filme que é Som ao Redor.

O senhor está fazendo um paralelo a essa tradição do coronelismo à forma como se deu a aliança?
Veja, quando dr. Arraes entrou no PSB não reivindicou sequer a direção estadual do partido em Pernambuco. Não pediu um só cargo na direção nacional. Foi escolhido. E não por ter deputados ou prefeitos atrás de si. Quando dr. Arraes foi derrotado em Pernambuco chegou a Brasília fragilizado. Mesmo assim, o reelegemos. É a diferença entre a direção burocrática e a direção político-ideológica.

Na eleição em PE este ano, a participação da família Campos foi muito importante para o sucesso. O senhor acredita que por serem filhos de Eduardo são naturais lideranças políticas do partido?
Em face da tradição política brasileira, esses meninos têm todas as condições objetivas de continuarem a saga familiar, da qual não excluo a Marília. Não conheço, porém, a formação ideológica deles.