João Vicente Goulart: Dilma não é parente, quem para presidente?

João Vicente Goulart, jornalista e filho do ex-presidente Jango, faz uma análise comparativa da conjuntura política vivida durante o período que antecedeu o golpe de 1964 e o intento golpista reverberado por setores da oposição atualmente. "Os paladinos da “verdade” acham eleitoralmente mais fácil criticar o governo do que defender a Democracia", enfatiza ele. Confira a íntegra do texto publicado no site do Instituto João Goulart.

Ninho golpista tucanos

No momento em que as esquerdas estão atônitas com as notícias que pululam de “impeachment” da presidenta e nos partidos que as compõem, digladia-se por impor uma verdade que emergiu de uma eleição suada que uniu partidos da base e foi à rua no ultimo segundo eleitoral para virar a mesa, em um momento em que a candidatura de Aécio democraticamente estava crescendo. Agora, setores desta mesma esquerda abandonam o governo e apostam no caos como um filme antigo que todos vimos em 1964.

Os paladinos da “verdade” acham eleitoralmente mais fácil criticar o governo do que defender a Democracia.

Há mais de 50 anos, apesar de ter a opinião publica a seu favor, como indicam pesquisas escondidas pela ditadura, Jango lutava para aprovar as “Reformas de Base”, entre elas a reforma política, a eleitoral, a agrária, a urbana e a tributária entre outras, promovia o encontro com o povo nas ruas e nas praças que só ao povo pertence, nos comícios e debates para pressionar um Congresso conservador que não aceitava os avanços populares contidos na “Mensagem ao Congresso Nacional de 1964”, o mesmo que sequer analisou dita “mensagem”, dado ao evento da queda do governo.

Setores da esquerda que vislumbravam candidaturas no ano subsequente ao Golpe de 64, bravateavam na rua “Cunhado Não é parente, Brizola para presidente”. Setores desta mesma esquerda ameaçavam derrotar o pedido do Estado de Sítio, solicitado por Jango ao Congresso Nacional, tendo ele que retirar o mesmo de votação para não sofrer uma derrota que enfraqueceria mais o governo.

A Frente Parlamentar Nacionalista (de esquerda), através de porta-vozes, criticava Jango pelo isolamento e pela falta de agilidade em promover as reformas e também pela composição governamental com setores liberais em alguns ministérios, que eram necessários para estabilizar a crise.

Era uma época difícil, tal qual como a que caminhamos se não despertarmos do perigo iminente dos golpistas.

Fernando Henrique Cardoso já está de posse de parecer do jurista Ives Gandra encomendado especialmente para enquadrar a presidenta por crime de responsabilidade, por não ter detectado as distorções da Petrobras quando presidente do Conselho de administração da Estatal, não por dolo, mas mesmo assim pode ir para a Câmara este pedido de “impeachment”.

Teremos aí então um Eduardo Cunha com inspiração suficiente para incorporar em seu terreiro (fertilizado pela caboclagem de um PMDB fisiológico) um verdadeiro Áureo Moura de Andrade, pronto para reaparecer em cena.

Enquanto um sorridente Michael Temer faz ensaios com o seu filiado Eduardo Cunha na trincheira comum, porta-vozes e emissários dizem: “Pelo ranger da carruagem desgovernada, a oposição nem precisa perder muito tempo com CPI´s e pareceres para detonar o impeachment da presidente da República, que continua recolhida e calada em seus palácios, sem mostrar qualquer reação. O governo Dilma-2 está se acabando sozinho num inimaginável processo de autodestruição.” Ricardo Kotscho, assessor de Lula.

Ou, segundo Marta Suplicy, se a presidente tivesse optado pela transparência, "não estaríamos agora tendo de viver o aumento desmedido das tarifas, a volta do desemprego, a diminuição de direitos trabalhistas, a inflação, o aumento consecutivo dos juros, a falta de investimentos e o aumento de impostos, fazendo a vaca engasgar de tanto tossir".

Só falta estes personagens unirem-se ao ninho. Aquele velho ninho golpista de sempre.

Em 1964 havia um corvo na espreita. Em 2015 há um tucano no ninho.

João Vicente Goulart é jornalista, diretor IPG-Instituto João Goulart e filho do ex-presidente Jango