Roberto Amaral: 'Não tenho nenhum respeito ético pelas posições de Aécio'
Roberto Amaral, respeitada liderança política comentou, em entrevista à Rede Brasil Atual, que o aparente recuo de senador mineiro, Aécio Neves, que deu declarações sobre impeachment da presidenta Dilma nesta sexta-feira (28) "faz parte de algum jogo de política menor". “Eu não tenho nenhum respeito ético pelas posições do ex-candidato Aécio”, disse Amaral. O ex-presidente do PSB tem defendido a formação de uma frente popular para unir forças progressistas em defesa da democracia.
Publicado 29/08/2015 12:58
Aécio deu declarações ao blog do jornalista Kennedy Alencar, publicada nesta sexta (28). Segundo o tucano “ainda não está claro” haver motivos para o impeachment da presidenta. “Reconheço isso. Mas nada impede que dentro de algum tempo isso ocorra”, afirmou ainda Aécio. Roberto Amaral questiona: “Dizer que não tem motivo, 'ainda'… Quer dizer, ainda vai se procurar? E ele descobriu agora que não tem motivo?”
Roberto Amaral também não economiza críticas ao seu partido, o PSB, que apoiou Aécio no segundo turno em 2014, e volta a dizer que o partido adotou uma postura "oportunista". “Vejo muito mal (o papel do PSB no atual processo político), desde agosto do ano passado, quando ele decidiu não apoiar a Dilma”, diz. “A decisão do PSB de apoiar Aécio foi burra e oportunista.”
Ministro de Ciência e Tecnologia do governo Lula (entre 2003 e 2004), Amaral vem criticando seu partido também pela intenção, hoje adiada, de alguns líderes de se fundir com o PPS, que “completaria a direitização do partido”.
Está programado para 5 de setembro o lançamento da Frente Brasil defendida por Amaral, em Belo Horizonte.
Segue abaixo a entrevista do ex-ministro, Roberto Amaral:
Hoje, o senador Aécio Neves parece ter recuado e afirmou que ainda não “ainda está claro” que haja razão jurídica para o impeachment. Como o sr. recebe tal afirmação?
Eu não tenho nenhum respeito ético pelas posições do ex-candidato Aécio. Ele assumiu o lado golpista. Ele agora, com esse negócio de dizer que não tem motivo, “ainda”, é uma coisa sem sentido. Tem motivo ou não tem? Dizer que não tem motivo ainda… Quer dizer, ainda vai se procurar? E ele descobriu agora que não tem motivo? E quando ele estava pedindo novas eleições?
Então, não levo a sério, não considero importante nem relevante a declaração dele. Isso faz parte de algum jogo de política menor, e nós temos que nos preocupar com questão política maior. A questão fundamental é o respeito ao processo. Ele está querendo recuperar as tradições da UDN, que toda vez que perdia eleições propunha um golpe de Estado. O que temos que discutir é a voz soberana das urnas.
Como avalia a conjuntura?
É fundamental no processo democrático a defesa do mandato da presidente da República, independentemente de ser a Dilma, como era importante garantir a posse e o mandato de Juscelino. O que resta é a regra do processo democrático. Esta é a regra democrática: você disputa, ganha ou perde e vai em frente. Isso é fundamental para a ordem democrática. Isso é fundamental para a economia brasileira.
A economia brasileira, a economia produtiva, a nossa política externa, não podem ficar permanentemente à espera de uma crise, esperar se a crise se agrava, ou se vai amainar. Nós temos que ingressar na normalidade. Já se vão quase oito meses da posse e quase um ano das eleições. As eleições já terminaram. O que estou querendo é que os liberais entendam que o pleito do impeachment ou da convocação de eleições é um pleito golpista. Quando em 1954 ficaram inventando o “mar de lama”, a questão não era o “mar de lama”, que provou-se que era inexistente. A questão era impedir o governo Vargas, e impedir o reajuste do salário mínimo e impedir as estatais que ele estava criando.
A mesma coisa se operou em 1964. O problema era a promessa de reformas de base do Jango, e a direita então inventou que estava defendendo a Constituição, os liberais acreditaram nisso, foram às ruas a favor da queda de Jango, e o primeiro ato dos golpistas foi destruir a Constituição.
Como o sr. vê o desdobramento da crise, com otimismo ou pessimismo?
O que estou querendo passar é que a questão vai além da sustentação ou não do mandato da Dilma. Com o mandato dela mantido, temos que enfrentar a ascensão do pensamento de direita; sem o mandato dela, temos que enfrentar a ascensão das forças de direita. É preciso dar sustentação de centro-esquerda ao governo dela. A política se faz com correlação de forças. Se as forças progressistas liberais de esquerda não fortalecerem o governo da Dilma, ela vai ficar nas mãos das forças conservadoras.
Qual sua posição sobre o papel do PSB nesse processo?
Vejo muito mal, desde agosto do ano passado, quando ele decidiu não apoiar a Dilma. Ele não entendeu que o projeto Aécio – e está muito claro agora – era um processo de direitização, de redução dos direitos dos trabalhadores e de autoritarismo, que está construindo esse clima de intolerância no Brasil.
O sr. chegou a dizer há alguns meses que o PSB está dominado por oportunistas…
É o seguinte: a decisão do PSB de apoiar o Aécio foi uma decisão burra e oportunista. Por que oportunista? Porque o fez pensando que o Aécio ia ganhar as eleições. Então, pegou todo o nosso patrimônio, pegou toda a nossa história, todos os nossos projetos e jogou nessa aventura, pensando que o Aécio ia ser eleito. Só por isso. E foi uma decisão burra porque, diante da crise dos partidos de esquerda – e não precisa explicar, está todo mundo vendo essa crise –, o PSB poderia ser o grande desaguadouro dos quadros de esquerda, progressistas, que estão insatisfeitos com seu partido.
Se Eduardo Campos não tivesse morrido, o PSB poderia ter sido esse desaguadouro?
É o mais provável, mas não estou totalmente seguro disso, porque tudo dependeria de como seria o final de campanha, como seria no segundo turno, como seria a posição do partido. Ele morreu no inicio do primeiro turno.
O sr. também já criticou muito a eventual fusão do PSB com o PPS, que foi adiada…
Foi adiada porque houve uma reação da militância, mas a expressão é correta: foi adiada. Não quer dizer que foi de todo afastada. Isso completaria a direitização do partido.
Nesse quadro, o sr. teria condições de se manter no PSB?
O meu papel no PSB sempre foi de puxar o partido pela esquerda. Quando decidi com Antônio Houaiss e o Jamil Haddad refundar o partido, nós pensávamos em um partido socialista. A minha posição não mudou. Eu continuo achando que o Brasil precisa de um partido socialista e coerente, e vou continuar lutando por isso.