Ao vivo: Sem pluralidade na mídia, não há liberdade de expressão

A urgência de democratizar a comunicação no Brasil foi tema de debate na abertura do Seminário Internacional Mídia e Democracia nas Américas, nesta sexta-feira (18), em São Paulo. Por videoconferência, Edison Lanza, Relator Especial para Liberdade de Expressão da Organização dos Estados Americanos (OEA), defendeu que diversidade e pluralidade nos meios de comunicação é uma condição fundamental para a garantir a liberdade de expressão.

Acompanhe ao vivo a transmissão do seminário:

 

Ciente da ausência de regulação do setor no Brasil – o advogado e jornalista esteve em Brasília recentemente, reunindo-se com autoridades políticas e entidades da sociedade civil – Lanza criticou a concentração dos meios de comunicação e o falso argumento de que regulação é censura, o que já se tornou uma espécie de 'mantra' dos grandes empresários do setor. “Monopólios e oligopólios atentam contra a democracia e a liberdade de expressão”, disse. “É obrigação do Estado garantir este direito a partir da regulação do sistema de comunicação”.

Segundo ele, os governos não devem intervir no que se produz, mas sim facilitar e construir políticas públicas para garantir que haja diversidade de vozes nos meios. Segundo a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, explica Lanza, é papel do Estado impedir uma excessiva concentração de meios por grupos privados, o que atenta contra a diversidade de fontes e opiniões. “É fundamental que haja intervenção em um mercado com tendência ao monopólio”, acrescenta.

Os organismos que implementem essas regulações, conforme explica o relator da OEA, têm de gozar de autonomia e independência, tanto do ponto de vista político quanto em relação ao poder econômico. “Estes órgãos não devem ser instrumentos para calar vozes ou beneficiar interesses privados”, pontua.

Mídia brasileira 'corrompe' opinião pública

Referência em estudos de mídia e democracia no Brasil, Venício Lima avalia que a urgência em se democratizar a comunicação no país diz respeito a findar um processo sistemático de corrupção da opinião pública. “Se a corrupção – palavra preferida dos grandes meios – é a prevalência de interesses privados e ilegitimos sobre interesses públicos, o que a mídia brasileira é corromper a opinião pública”, diz.

“A própria elite política da América Latina identificou, em uma pesquisa feita há dez anos, que os meios de comunicação são um dos principais obstáculos para a consolidação da democracia no continente”, sublinha o professor. “Se houve alguma alteração nesse panorama, é de que a situação se agravou”.

As condições para que os meios cumpram o papel de formar uma opinião pública democrática não ocorre no Brasil, na opinião do estudioso. “Em primeiro lugar, a legislação está desatualizada”, aponta. “Além disso, até hoje os princípios previstos na Constituição de 1988 [dentre eles a proibição do monopólio e do oligopólio no setor] seguem sem regulamentação”.

Segundo Venício, uma simples folheada nas manchetes dos grandes jornais, em um único dia, escancaram a falta de diversidade e pluralidade. “A narrativa da mídia é tão homogênea que é como se houvesse um super editor que editasse as notícias de todos os meios”, critica. “É essa a impressão que você terá se ler diariamente os grandes jornais, todos com as mesmas pautas e narrativas”.

O único remédio, de acordo com ele, é cobrar do Poder Executivo que saia da armadilha na qual o próprio governo caiu. “Os governos dos últimos 12 anos acreditaram, equivocadamente, que poderia ser feita uma aliança com os oligopólios midiáticos”, afirma. “Por isso, perdemos oportunidades históricas de se fazerem mudanças fundamentais, de fazer o mínimio para sanar os problemas que nos colocam na situação crítica de hoje”.

O Ministério das Comunicações foi representado por Emiliano José, histórico militante pela democratização da comunicação que ocupa o cargo de Secretário de Serviços de Comunicação Eletrônica. Segundo ele, existe a clareza, no MiniCom, de que o debate sobre a regulação é fundamental para o avanço da democracia no país. “O ministro Ricardo Berzoini tem dito que está disposto a desenvolver esse debate, assumindo o compromisso de intensificar esse processo”.

De acordo com Emiliano José, a luta pela democratização da mídia é árdua e, infelizmente, esbarra no cenário político desfavorável ao governo. “Imaginar que haverá alguma proposta concreta de regulação do setor é uma contradição”, admite. “Sabemos a composição e como funciona esse Congresso, e nenhum governo pode prescindir do Congresso”, disse, lamentando a conjuntura desfavorável.

“É bastante difícil separar meu papel no Ministério e meu histórico na luta por uma mídia democrática, causa a qual me dedico há décadas”, diz. “Como militante”, Emiliano opina que a mídia não está ao lado do povo brasileiro. “O suicídio de Vargas, em 1954, quando já estava praticamente consumado um golpe contra ele, vanguardeado pela imprensa, tem relação íntima com o bombardeio midiático sobre a presidenta Dilma”, avalia. “É inegável que os meios têm empreendido um gigantesco esforço golpista”.

O parlamentar listou iniciativas que o Ministério das Comunicações tem tomado. Além do Canal da Educação e do Canal da Cidadania, que fomentam canais educativos e públicos, Emiliano José cita também o Plano Nacional de Outorga de Rádios Comunitárias, que deve desburocratizar o processo de outorgas. “É preciso cavar espaços para amenizar o problema do monopólio. Não se trata de excluir vozes, mas ampliá-las”.