OAB, deputada e professor repudiam decretos de sigilo de Alckmin
Após o governador Geraldo Alckmin anunciar sigilo em documentos estratégicos do Metrô, Sabesp e Policia Militar, o Ministério Público Estadual (MPE) abriu quatro inquéritos, no intuito de investigar o desvio de função de servidores públicos. O MPE afirma que o governo tem usado brechas da Lei de acesso à Informação (LAI) para construir manobras jurídicas, impondo o sigilo e garantindo o não acesso da população aos dados de funcionamento dos serviços prestados.
Por Laís Gouveia e Dayane Santos
Publicado 16/10/2015 15:33
O procurador de Justiça Marcelo Milani, que compõe a Promotoria da Defesa do Patrimônio Público e Social, além de investigar o desvio de funções de servidores públicos, também averígua a negativa do governo tucano em não responder questionamentos feitos por cidadãos sobre o funcionamento de órgãos públicos. Segundo diz a LAI, há um prazo de 20 dias para que o órgão se manifeste em resposta ao questionamento, podendo ser estendido por mais dez dias, no entanto, o governo não seguiu a orientação da lei.
Alckmin na contramão dos princípios constitucionais
O governo Alckmin é alvo de outras investigações pelo MPE. Entre as denúncias, estão suspeitas de favorecimento de empresas em contratos firmados Sabesp, responsabilidade no atual colapso hídrico no estado, esquema de fraude no Procon e irregularidades na linha 5 do metrô.
Para deputada estadual Leci Brandão (PCdoB-SP), a democracia exige cada vez mais dos governos. "Ninguém está fazendo favor nenhum em mostrar transparência. É obrigação do Poder Público prestar contas ao povo. Reter informações como estas não faz bem para o processo democrático, o tempo em que tudo era escondido já acabou", avalia.
Em entrevista ao Portal Vermelho, o presidente da Comissão de Controle Social dos Gastos Públicos da OAB de São Paulo, Jorge Eluf Neto, afirma que todos os casos de sigilos apresentados têm “justificativas totalmente inconsistentes que violam o direito do cidadão a ter ampla informação sobre os atos da administração pública”.
E acrescenta: “É importante que o governo se conscientize de que deve prevalecer sempre a transparências de seus atos porque estão operando com dinheiro público, dinheiro do contribuinte, e tem que dar satisfações à sociedade sobre como é feito os gastos”.
O advogado salientou ainda que o princípio de publicidade e acesso do cidadão aos atos públicos não são direitos recentes, por conta da Lei de Acesso à Informação.
“São garantias previstas na Constituição de 1988”, lembrou ele, salientando que tais medidas de sigilo colocam o governo Alckmin na contramão dos princípios constitucionais. “Além do princípio da publicidade, a Constituição também prevê o princípio da eficiência, que é ter uma correta aplicação dos recursos públicos de modo que se dê retorno à população. Como podemos acompanhar se a administração está sendo eficiente se não há amplo acesso às informações. Portanto, dois aspectos foram violados”, pontuou.
O advogado disse que a OAB, por meio da comissão, vai continuar acompanhando a questão. “Uma das funções dessa comissão é acompanhar como se aplicam os princípios de transparência, acesso às informações e a economicidade dos gastos públicos. Temos um papel de acompanhar e servir como interlocutores da sociedade civil e, eventualmente, acionar os órgãos de controle interno e externo do estado”, destacou.
Na PM, até quantidade de munição é ultrassecreto
O professor de políticas públicas da Universidade de São Paulo (USP), Pablo Ortellado, escrevia um livro sobre as manifestações de junho de 2013 e enviou à Secretaria de Segurança Pública um questionário simples solicitando dados básicos sobre a operação como quantidade de munição, orçamento e efetivo policial destacados para cada dia de protestos.
A solicitação foi feita com base na Lei de Acesso à Informação, deveria ser respondida no prazo de 20 dias, podendo o prazo ser estendido por mais dez dias, desde que o cidadão que fez a solicitação tenha ciência. Mas a PM demorou sete meses para dar uma resposta e parcial.
Também em entrevista ao Portal Vermelho, Pablo conta: “Não é que a Polícia Militar negava, ela simplesmente ignorava. Eu e outras várias pessoas decidimos entrar com ação até que, depois de muita pressão dos jornais, chegamos a instância superior”.
Segundo ele, já naquele período a PM dizia que os dados básicos se tratavam de informações de inteligência. “Estávamos interessados em saber qual era o número de balas de borracha, bombas de gás lacrimogêneo, por exemplo, e foi classificado como informações de inteligência. Obviamente que isso não tem nada de inteligência”, salientou.
E completa: “Saber como era o comportamento da polícia na repressão à pessoa que estava exercendo o direito constitucional de liberdade de expressão e liberdade de manifestação são dados de interesse público”.
Para o professor da USP, a medida anunciada por Alckmin de impor sigilo sobre dados da Segurança Pública “é péssima para o país” e reforça a cultura que ainda prevalece na PM que é resquício do regime militar de 1964. “Acho que a polícia militar, em particular a de São Paulo, não tem uma cultura democrática de prestação de contas, de transparência. Tem uma cultura militar que é de subordinação e prestação de contas para suas próprias autoridades, seus coronéis e comandantes. E nenhuma vontade ou interesse de se relacionar com a sociedade a não ser no exercício de sua função repressiva”, concluiu.