Fernando Brito: O incrível interrogatório sem perguntas de Cerveró

Cerveró – Então eu fui indicado para a diretoria da BR Distribuidora por reconhecimento do presidente pela ajuda que prestei para resolver aquele problema do empréstimo da Schahin.

Procurador – Sim, e como é que o senhor soube do reconhecimento do presidente Lula a isso?

Cerveró – …. (silêncio)

Procurador – Ele disse isso ao senhor, pessoalmente ou por telefone?

Cerveró – Não, senhor…

Procurador – E como é que o senhor soube disso?

Cerveró – …. (silêncio)

suicida

Teria sido assim o interrogatório do senhor Nestor Cerveró que lhe rendeu redução da pena?

Deve ter sido, porque a “ligação” de Lula à sua nomeação e a razão dela ter sido a “gratidão” presidencial pela operação ocupa exatas duas linhas e meia no depoimento premiado de Cerveró, que, há coisa de uma hora, foi liberado pelo “vazador” para ser publicado. Sim, porque duvido que um repórter experiente como o do Estadão fosse “deixar para depois” de ser furado pela Folha que havia uma menção a Lula, justo na primeira página do documento.

Mas vamos ao que diz o papelucho, cuja guarda estava a cargo dos procuradores Fábio Mangrinelli Coimbra e Rodrigo Telles de Souza.

QUE, como reconhecimento da ajuda do declarante nessa situação (a quitação do empréstimo), o Presidente da República LUÍS INÁCIO LULA DA SILVA decidiu indicar o declarante para uma diretoria da BR DISTRIBUIDORA, a Diretoria Financeira e de Serviços.

Só. Nada mais, oficialmente, foi dito ou lhe foi perguntado, porque não está no depoimento, nem que seja para dizer “que, indagado, não soube explicar que…etc…”

Inacreditável. Aliás, na página seis, Cerveró diz que Delcídio “também era considerado responsável pela indicação do declarante para a diretoria da BR DISTRIBUIDORA”. Era considerado ou era? Foi Delcídio que falou a Cerveró da suposta gratidão de Lula?

A única operação concreta a que Nestor Cerveró se refere é um suposto empréstimo do Banco do Brasil ao usineiro João Lyra, em 2010, por influência de Fernando Collor e que teria irritado Renan Calheiros. Há, porém, um “probleminha”: informa oficialmente o Banco do Brasil que o empréstimo foi recusado e não saiu…

Qualquer delegado novato de DP no pé do morro aqui no Rio interroga melhor. Até porque sabe que um depoimento destes, sem materialidade e sem concatenação é lixo no tribunal.

Mas, no tribunal em questão, parece “não vir ao caso” e o depoimento é totalmente adequado ao que se busca, de fato: acusar Lula assim na base do “ouvi dizer”.

Não precisa nem dizer de quem ouviu dizer.

PS. Detalhe intrigante: Detalhe, a delação não é o mesma que estava nas mãos de André Esteves e Delcídio do Amaral por uma simples razão: ambos foram presos no dia 25 de novembro e o depoimento foi prestado dia 7 de dezembro. É uma nova versão, certamente revista e talvez ampliada. Assim se conduz uma montagem.