Reconhecer desigualdade de gênero e racial é desafio para empresas

Nesta quinta (28) o secretário da Promoção da Igualdade Racial da cidade de São Paulo, Maurício Pestana, disse que existem os que discriminam negros e mulheres no mercado de trabalho por questões ideológicas e aqueles que “nem sabem porque discriminam”. A declaração foi feita durante a divulgação da pesquisa Perfil Social Racial e de Gênero dos 200 Principais fornecedores da Prefeitura de São Paulo. 

Por Railídia Carvalho

negros no mercado de trabalho

Quando era secretário-adjunto da SMPIR-SP, Mauricio iniciou diálogo e realizou ações afirmativas com empresas privadas pelo programa São Paulo Diverso, que estimula empresas a criar políticas afirmativas para a população negra.

“Eles disseram que, naquele momento, foi a primeira vez que o setor público no Brasil chamava esses empresários para conversar sobre o tema. A ideia era compartilhar com eles as políticas que estávamos adotando de inclusão dos negros. Agora temos também os dados da pesquisa para embasar as ações”.

A pesquisa, realizada pela Prefeitura de São Paulo e Instituto Ethos, concluiu que a maioria das empresas não acha necessario criar ações de promoção de igualdade racial e de gênero mesmo diante de números em que as mulheres e os negros estão em situação de vulnerabilidade e subrepresentação.

Diálogo

O Portal Vermelho conversou com o presidente da Bayer, Theo van der Loo, que também esteve presente à divulgação da pesquisa em São Paulo. Ele admitiu que também não sabia como abordar a questão racial na empresa. “Tínhamos receio de criar situações difíceis, era um tema delicado”, disse van der Loo.

A primeira ação da empresa foi estabelecer ano passado através de um grupo de trabalho um diálogo com os funcionários negros da empresa para saber qual a percepção deles. “As pessoas da Bayer na realidade sentem que não tem uma discriminação muito grande. Eles se sentem acolhidos, sentem que tem oportunidades. Mesmo assim é preciso acelerar esse processo”, afirmou o presidente.

A Bayer tem 4.500 funcionários no Brasil e deste total são 2.500 em São Paulo. Van der Loo informou que foi realizada uma pesquisa voluntária com a Fundação Dom Cabral que identificou 15% de negros entre os funcionários da empresa. “Obviamente não reflete a sociedade brasileira que tem mais da metade de negros mas estamos avançando, conseguindo conversar sobre o tema”, contou.

Racismo velado

A secretária da mulher trabalhadora da Central de Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (SP), Gicélia Bitencourt, afirmou que em um ano que está no cargo visitando empresas em São Paulo identificou apenas uma, no ramo da construção imobiliária, em que a diversidade é presente no cotidiano dos trabalhadores.  “Não está escrito que tem cota mas ela é colocada em prática”, disse.

Gicélia disse que em muitas empresas a cultura discriminatória é praticada de maneira velada nos processos de seleção, por exemplo. Ela citou a admissão em cargos administrativos que exigem qualificação. “Vai uma mulher negra, uma branca e um homem branco. A mulher negra sofre a eliminação ali e principalmente se tiver filho”, complementou.

A falta de oportunidades para as mulheres e principalmente as mulheres negras também contribuem para as práticas discriminatórias. “A mulher do chão de fábrica não tem essa consciência, ela vê que não tem capacidade e que tem que se apegar aquela firma porque em outro lugar não vai se firmar pela idade, pela escolaridade. Acaba se tornando escrava e aceitando certas condições”, disse Gilcélia.

Na opinião dela, o enfrentamento a essa falta de perspectiva é a conscientização e o empoderamento da mulher, feita pelas centrais e pelos sindicatos, através dos seminários, assembleias nas portas das empresas, encontros de mulheres e outros mecanismos.

Para o tesoureiro da União de Negros pela Igualdade (Unegro), Julião Vieira, os dados divulgados pela pesquisa não são novidade para o movimento negro mas são importantes para subsidiar as políticas públicas na capital.

“É um dos desafios do movimento negro e poder público inserir o negro no mercado de trabalho. Tirar ele dessa condição de subemprego, ocupação ambulante e baixos salários. Para isso precisamos de mais políticas e ações, seja no poder público e nas empresas privadas. Nesse sentido a pesquisa, com base científica, vem ajudar nesse esforço”, disse Julião.