“Sem resolver desigualdade, falar em meritocracia é piada”

Considerado um dos maiores especialistas brasileiros em políticas públicas, o economista-chefe do Instituto Ayrton Senna e professor no Insper, Ricardo Paes de Barros, criticou, nesta terça (2), o discurso da meritocracia.

Ricardo Paes de Barros

“Sem resolver a desigualdade de oportunidades, ficar falando em meritocracia é piada. Como discutir o mérito de quem chegou em primeiro lugar em uma corrida onde as pessoas saíram em tempos diferentes e a distâncias diferentes?”, questionou Paes de Barros, em entrevista ao Valor Econômico.

Para o economista, especialista em desigualdade social, se, no passado, ações e procedimentos reforçavam a desigualdade e a discriminação que existiam até na escola, hoje é preciso discriminar estes alunos de outra forma, positivamente, dando a eles toda atenção extra necessária.

Segundo ele, a sociedade considera natural a existência de “educação de pobre e educação de rico”, algo que precisa ser combatido. “Você está naturalizando o fato de que uma criança pobre pode aprender menos, e uma criança rica tem que aprender mais. É o conformismo, o naturalismo”, disse.

“Temos que sair de ações que discriminavam negativamente, não para ser neutro, mas para discriminar positivamente (…) A escola tem que ser um lugar onde a gente reduz desigualdade e trata de maneira diferente pessoas que precisam mais. Pegar os que entram em desvantagem e tentar eliminar essa desvantagem, porque o objetivo final da escola não é lavar as mãos e deixar que a desigualdade seja reproduzida. O objetivo da escola é eliminar essa desigualdade inicial e fazer com que todo mundo saia igual, e aí sim ser meritocrático”, explica.

Para o economista, contudo, falta muito para isso acontecer. “Ainda não conseguimos nem que o aluno médio aprenda; pedir para a escola dar muito mais atenção para o aluno que vem de uma família complicada e chega na escola todo dia deprimido, com sono, com fome, a escola tem pouca energia sobrando para dar atenção para ele. Acho que falta muito para a escola brasileira conseguir incorporar esse aluno mais pobre”, lamenta.