Sociedade civil cobra mudanças para maior justiça fiscal
Entidades da sociedade civil divulgaram, nesta semana, um manifesto no qual cobram mudanças no sistema tributário. O texto, elaborado após realização de oficinas no Fórum Social Mundial Temático, defende a necessidade de uma reforma tributária que elimine distorções e torne a distribuição dos impostos mais justa. O documento também pressiona por um cerco aos mecanismos de evasão fiscal.
Publicado 04/02/2016 19:21
O manifesto é assinado pelo Instituto Justiça Fiscal (IJF), o Instituto de Estudos Socioeconômicos (INESC), a Rede Brasileira de Integração dos Povos (REBRIP), a Internacional de Servidores Públicos (ISP) e a Auditoria Cidadã da Dívida (ACD).
De acordo com o texto, o caráter injusto da atual carga tributária, “não por seu tamanho, mas por sua distribuição (…), impõe a necessidade urgente de uma reforma tributária”. As mudanças, avaliam as entidades, devem ser na direção de deslocar parte da carga tributária que incide sobre o consumo (tributos indiretos) para o patrimônio e a renda (tributos diretos).
“Para isso, uma importante medida é promover tratamento isonômico na tributação das rendas independente de sua origem, se do trabalho ou do capital, e elevar a tributação sobre as altas rendas”, dizem, destacando o fato de o Brasil isentar de taxação os lucros e dividendos. Os signatários propõem ainda aumentar a tributação sobre o patrimônio.
“No entanto, uma reforma tributária justa só será possível a partir da constituição de hegemonia popular, o que impõe a necessidade de aperfeiçoar a comunicação e a articulação social, com vistas a promover uma nova consciência de cidadania”, adverte.
Setor extrativista mineral
As entidades defendem ainda que o setor extrativista mineral tem características diferenciadas e, portanto, precisa de tratamentos fiscais específicos. “Primeiro por se tratar de um bem não renovável. Segundo, porque o minério é um bem público, cuja exploração ocorre por concessão.
Terceiro, que esta atividade se desenvolve obrigatoriamente no local onde se encontra a jazida, muitas vezes desalojando comunidades, destruindo seus meios e modos de vida, contaminando mananciais, destruindo florestas. Quarto, o fato de ser uma atividade preponderantemente comandada por gigantes transnacionais que exploram o recurso mineral quase que exclusivamente para a exportação”, explicam.
Para promoção da justiça fiscal no setor extrativista, avaliam que é preciso também estabelecer novos marcos legais e normativos para disciplinar as concessões de exploração dos recursos, “rompendo a lógica feudal vigente que permite que empresas detenham reservas baseadas exclusivamente na lógica temporal (ordem de pedidos)”.
“Não é razoável que pautemos o desenvolvimento nacional na premissa de assumir impactos sociais e ambientais como parte do jogo, facilitando e desonerando a exportação de insumos sob o único ou principal argumento da geração de superavits comerciais, sem considerar todos os elementos que deveriam ser avaliados para permitir a exploração da riqueza de uma nação”, afirma o texto.
Arquitetura financeira global
Para as entidades, a reconfiguração da economia mundial promovida pela globalização significou “inúmeros mecanismos de fragilização da capacidade de tributação das nações”.
Segundo o manifesto, o comércio internacional que decorre da globalização “não é mais comércio em sua essência, mas simples transferências de mercadorias ou de insumos entre unidades de uma mesma corporação; de tal forma que tanto o faturamento das empresas pulverizadas ao redor do mundo, quanto os custos dedutíveis são manipulados com vista a deslocar os lucros para paraísos fiscais ou para países que ofereçam benefícios tributários especiais”, denuncia.
Os signatários avaliam ainda que é exatamente este mecanismo que tem sido responsável por uma parcela significativa da evasão fiscal, fazendo pesar a carga tributária nas costas do mais pobres, "dificultando o poder regulador do Estado e impossibilitando o financiamento de serviços públicos universais de qualidade”.
Campanha global
O texto menciona também que diversas organizações da região, impulsionadas pela Rede de Justiça Fiscal da América Latina e Caribe, vêm desenvolvendo uma campanha, que se pretende global, para promover ações de pesquisa, denúncia, mobilização e divulgação a favor da justiça fiscal.
Intitulada “Que as transnacionais paguem o justo”, a iniciativa pretende estimular capacidade crítica e cidadã na sociedade para a implementação de reformas sobre a tributação das grandes multinacionais. A campanha também visa a cooperação tributária na região, que elimine a competição entre os países para ver quem concede mais incentivos às transnacionais.
“Além disso, pleiteia uma série de medidas coordenadas para evitar a evasão de tributos, tais como: transparência fiscal; fim dos paraísos fiscais; multinacionais serem tratadas como únicas e não como diversas filiais independentes, realizando reporte país a país; combate aos fluxos ilícitos; fim das renúncias tributárias.”
Trata-se de um trabalho que tenta sensibilizar a sociedade para os problemas resultantes do aprofundamento deste modelo de internacionalização da economia. Para as entidades que assinam o manifesto, sem controles nacionais ou supranacionais, tal modelo pode comprometer a capacidade das nações de “atenderem às demandas das sociedades, de construir um sistema tributário mais justo, de preservar suas soberanias e meio ambiente e de fortalecer as democracias”.