Mesmo sem foro, conversas de Lula não poderiam ser divulgadas

Em entrevista ao site Justificando, o professor de Direito Processual da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), Gustavo Badaró, classificou como “completamente ilegal” a quebra do sigilo dos grampos telefônico pelo juiz Sérgio Moro, responsável pela Operação Lava Jato. Ele também chamou de “lastimável” a posição tomada pela OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) em relação ao vazamento das gravações.

Gustavo Badaro

“Acho completamente ilegal! Eu vi a decisão e a justificativa proferidas pelo juiz, mas eu discordo. O Sérgio Moro partiu de uma distinção entre dois tipos de conversas: as conversas telefônicas cujo conteúdo interessa à investigação, podendo ter o sigilo liberado até para controle social, pois são crimes contra a administração da justiça, e conversas que não interessariam à investigação, uma vez que seriam privadas e só essas continuariam sigilosas”, afirmou o jurista.

Ele destacou que a Lei 9.296, que trata de interceptação, define em seu artigo 8º que devem ser atuadas em apartado e que todas as conversas e transcrições permanecerão sob sigilo, sem qualquer distinção se interessa ou não interessa para a investigação. Ele também destaca o artigo 9º da mesma lei, que diz que as conversas que não interessam à investigação deverão ser destruídas, mas todas elas deveriam permanecer sigilosas. “Então acho que a revelação do conteúdo da conversa foi ilegal”, enfatizou.

Questionado se mesmo sem foro privilegiado, Lula poderia ter essas conversas divulgadas publicamente, o professor afirmou: “Não, não poderia. Nem ele, nem qualquer pessoa, com foro privilegiado ou sem, na conversa de qualquer pessoa, estando autorizada judicialmente. Ela serve para a investigação e só a investigação, estando disponível para o juiz, para o Ministério Público, para os delegados de polícia, aos investigados e seus defensores, e só esses, mais ninguém”.

Sobre a posição da OAB, o jurista afirmou que a entidade deveria se posicionar fortemente contra duas ilegalidades. “A primeira é o vazamento de todas as conversas telefônicas, isto é, nenhuma poderia ter vazado. A segunda é contra o vazamento, que é o mais grave, de uma conversa ocorrida com o ex-presidente Lula e a presidenta Dilma às 13h32 no dia 16, porque às 11h13 do mesmo dia o juiz Moro disse que a fase ostensiva da operação tinha acabado, pois já havia cumprido todos os mandados de buscas. Ele parou as interceptações, pois não eram mais necessárias. Comunicou às autoridades policiais, inclusive por telefone, e terminou com tudo. Ou seja, independente de foro por prerrogativa de função, às 11h13 do dia 16 o juiz retirou a ordem para as interceptações. Depois disso, ele recebeu as conversas de volta e viu que teve uma conversa às 13h32 sem autorização judicial; ou seja, a capitação dessa conversa é clarissimamente ilícita, e ele, como juiz, deveria ter reconhecido a ilicitude e jamais ter divulgado nenhuma conversa, nem as lícitas, quanto mais essa que é ilícita. Então eu acho que contra esses dois fatos é lastimável, do meu ponto de vista, que a OAB não tenha se posicionado contrariamente a essas ilegalidades”, explicou.