Há 30 anos: Reator número 4 de Tchernobil explode

Há exatamente 30 anos, às 1h23, o reator número 4 da central nuclear soviética de Tchernobil, no norte da Ucrânia, explodia e deixava vazar poeira radioativa que contaminaria mais de 4 milhões de hectares e condenaria para sempre uma vasta região da então União Soviética. 31 pessoas morreram nos dias que se seguiram à tragédia.

Sala de controle dos reatores de Tchernobil

Na época, a URSS era governada por Mikhail Gorbatchov, uma liderança do Partido Comunista que pretendia "renovar o socialismo" com o que chamava de Reconstrução (Perestroika) e a Transparência (Glasnost), aplicadas no sistema social, econômico e político vigente. A partir de 1985, exceto no período da segunda grande guerra, foi a primeira vez que o PIB soviético começou a registrar perdas.

Sob a liderança de Gorbatchov, a URSS veio a seu fim, e essa tragédia é também considerada uma das responsáveis pelo colapso do país, cinco anos depois, já que consumiu insumos incalculáveis e fortunas para sua remediação. Foram necessários mais de 500 mil trabalhadores e o custo estimado em 18 bilhões de rublos, cerca de 6% do PIB registrado naquele ano.

O acidente

Na noite de 25 para 26 de abril de 1986, o reator da Unidade 4 estava programado para ser desligado para manutenção de rotina. Foi decidido usar esta oportunidade para testar a capacidade do gerador do reator para gerar energia suficiente para manter seus sistemas de segurança (em particular, as bombas de água) funcionando no caso de perda do suprimento externo de energia.

Reatores como o de Tchernobil têm um par de geradores diesel disponível como reserva, mas eles não são ativados instantaneamente – o reator é portanto usado para partir a turbina, a um certo ponto a turbina seria desconectada do reator e deixada a rodar sob a força de sua inércia rotacional, e o objetivo do teste era determinar se as turbinas, na sua fase de queda de rotação, poderiam alimentar as bombas enquanto o gerador estivesse partindo.

O teste foi realizado com sucesso previamente em outra unidade (com as medidas de proteção ativas) e o resultado foi negativo (isto é, as turbinas não geravam suficiente energia, na fase de queda de rotação, para alimentar as bombas), mas melhorias adicionais foram feitas nas turbinas, o que levou à necessidade de repetir os testes.

A potência de saída do reator 4 devia ser reduzida de sua capacidade nominal de 3,2 GW para 700 MW a fim de realizar o teste com baixa potência, mais segura. Porém, devido à demora em começar a experiência, os operadores do reator reduziram a geração muito rapidamente, e a saída real foi de somente 30 MW.

Como resultado, a concentração de nêutrons absorvendo o produto da fissão, xenon-135, aumentou (este produto é tipicamente consumido num reator em baixa carga). Embora a escala de queda de potência estivesse próxima ao máximo permitido pelos regulamentos de segurança, a gerência dos operadores decidiu não desligar o reator e continuar o teste.

Além disso, foi decidido abreviar o teste e aumentar a potência para apenas 200 MW. A fim de superar a absorção de nêutrons do excesso de xenon-135, as hastes de controle foram puxadas para fora do reator mais rapidamente que o permitido pelos regulamentos de segurança. Como parte do experimento, à 1h05 de 26 de abril, as bombas que foram alimentadas pelo gerador da turbina foram ligadas; o fluxo de água gerado por essa ação excedeu o especificado pelos regulamentos de segurança.

À 1h19 o fluxo de água aumentou – uma vez que a água também absorve nêutrons. Este adicional incremento no fluxo de água requeria a remoção manual das hastes de controle, produzindo uma condição de operação altamente instável e perigosa.

À 1h23, o teste começou. A situação instável do reator não se refletia, de nenhuma maneira, no painel de controle, e não há evidências de que algum dos operadores estivesse totalmente consciente do perigo. A energia para as bombas de água foi cortada, e como elas foram conduzidas pela inércia do gerador da turbina, o fluxo de água caiu.

A turbina foi desconectada do reator, aumentando o nível de vapor no núcleo do reator. À medida que o líquido resfriador aquecia, bolsas de vapor se formavam nas linhas de resfriamento. O projeto peculiar do reator moderado a grafite RBMK em Tchernobil faz com que a potência do reator aumente rapidamente na ausência da absorção de nêutrons da água, e nesse caso a operação do reator torna-se progressivamente menos estável e mais perigosa.

À 1h23 os operadores pressionaram o botão AZ-5 (Defesa Rápida de Emergência 5), que iniciam a inserção total de todas as hastes de controle, incluindo as hastes de controle manual que previamente haviam sido retiradas sem cautela. Não está claro se isso foi feito como medida de emergência, ou como uma simples método de rotina para desligar totalmente o reator após a conclusão do teste (o reator estava programado para ser desligado para manutenção de rotina). Supõe-se que a parada total foi ordenada como resposta à inesperada subida rápida de potência.

Anatóli Diátlov, engenheiro-chefe de Tchernobil no acidente, escreveu em seu livro que, antes de 1h23, os sistemas do controle central não registravam nenhuma mudança de parâmetros que pudessem justificar a parada total. "A Comissão juntou e analisou grande quantidade de material, e declarou em seu relatório que não conseguiu determinar a razão pela qual a parada total foi ordenada. Mas não havia necessidade de procurar pela razão: O reator simplesmente foi desligado após a conclusão do experimento", escreveu.

Devido à baixa velocidade do mecanismo de inserção das hastes de controle (20 segundos para completar), as partes ocas das hastes e o deslocamento temporário do resfriador, a parada total provocou o aumento da velocidade da reação.

O aumento da energia de saída causou a deformação dos canais das hastes de controle, que travaram após serem inseridas somente um terço do caminho e foram, portanto, incapazes de conter a reação.

À 1h23 e 47 segundos, a potência do reator aumentou para cerca de 30GW, dez vezes a potência normal de saída. As hastes de combustível começaram a derreter e a pressão de vapor rapidamente aumentou causando uma grande explosão de vapor, deslocando e destruindo a cobertura do reator, rompendo os tubos de resfriamento e então abrindo um buraco no teto.

Depois que parte do teto explodiu, a entrada de oxigênio – combinada com a temperatura extremamente alta do combustível do reator e do grafite moderador – produziu um incêndio da grafite. Este incêndio contribuiu para espalhar o material radioativo e contaminar as áreas vizinhas. Houve problemas estruturais na construção da estrutura do reator, que se tivesse sido construído de forma adequada e conforme os manuais da época, teria dirimido o escape da radiação.

Sequência de eventos

De 26 de abril até 4 de maio de 1986 – a maior parte da radiação foi emitida nos primeiros dez dias. Inicialmente houve predominância de ventos norte e noroeste. No final de abril o vento mudou para sul e sudeste. As chuvas locais frequentes fizeram com que a radiação fosse distribuída local e regionalmente.

De 27 de abril a 5 de maio de 1986 – aproximadamente 1.800 helicópteros jogaram cerca de 5.000 toneladas de material extintor, como areia e chumbo, sobre o reator que ainda queimava.

27 de abril de 1986 – os habitantes da cidade de Pripiat foram evacuados.

28 de abril de 1986, 23 horas – um laboratório de pesquisas nucleares da Dinamarca anunciou a ocorrência do acidente nuclear em Tchernobil.

29 de abril de 1986 – o acidente nuclear de Tchernobil foi divulgado como notícia pela primeira vez, na Alemanha.

De 26 de abril a 5 de maio 1986 – durante os 10 dias após o acidente, 130 mil pessoas foram evacuadas.

6 de maio de 1986 – cessou a emissão radioativa.

De 15 de maio a 16 de maio de 1986 – novos focos de incêndio e emissão radioativa.

23 de maio de 1986 – o governo soviético ordenou a distribuição de solução de iodo à população.

Novembro de 1986
– o "sarcófago" que abriga o reator foi concluído. Ele destina-se a absorver a radiação e conter o combustível remanescente. Considerado uma medida provisória e construído para durar de 20 a 30 anos, seu maior problema é a falta de estabilidade, pois, como foi construído às pressas, há risco de ferrugem nas vigas.

1989 – o governo soviético embargou a construção dos reatores 5 e 6 da usina.

12 de dezembro de 2000 – depois de várias negociações internacionais, a usina de Tchernobil foi desativada.