Divergência no golpe: Serra invade seara de Meirelles para discordar
Sem identidade clara e desunidos, os apoiadores do golpe contra a presidenta Dilma Rousseff explicitam, a cada dia, novas divergências no interior do governo ilegítimo de Michel Temer (PMDB-SP). Embora tenha como função cuidar da Política Externa, o chanceler José Serra (PSDB-SP) decidiu agora invadir a seara alheia e dar pitaco sobre a política econômica, a cargo do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles.
Publicado 20/05/2016 16:39

“Em períodos de depressão, não há ajuste fiscal possível”, afirmou Serra, em evento no Tribunal de Contas do Estado de S.Paulo, nesta quinta-feira (19). Já Meirelles tem dito repetidamente que promover um ajuste fiscal e conter o crescimento da dívida pública são prioridades para reaver a confiança na economia.
As medidas anunciadas até então pela equipe econômica seguem a lógica dos cortes orçamentários e do arrocho nas costas do trabalhador, a mesma diretriz utilizada quando o partido de Serra, o PSDB, comandava o país.
De acordo com o jornal Valor Econômico, Serra falou ainda sobre um de seus temas favoritos, os juros básicos da economia. Ele ressaltou que os juros são responsáveis por 90% do déficit nominal, que deve girar ao redor de R$ 600 bilhões. “Para vocês terem uma ideia da implicação fiscal da política monetária”, afirmou.
O chanceler que queria ser ministro da Economia avaliou ainda que a dívida pública deverá piorar muito, antes de melhorar. Sobre a negociação da dívida dos Estados e municípios com a União, adisse que os “Estados e municípios têm vocação louca para gastar em custeio e reajustar salário”. Segundo o Valor, Serra declarou que aposta em uma renegociação e admitiu que o projeto enviado pelo ex-ministro da Fazenda Nelson Barbosa à Câmara “era bom”.
Alguns aliados de Temer já avaliaram que tanto Serra quanto Meirelles devem brigar por espaço na gestão do pemedebista, já que ambos teriam pretensões de disputar a sucessão presidencial em 2018.
Serra já teceu duras críticas a Meirelles no passado. Quando especulou-se que o atual ministro da Fazenda poderia substituir o Joaquim Levy, Serra chegou a dizer que ele havia sido o pior presidente do Banco Central do país.
Histórico de conflitos
O hábito de opinar sobre o ministério alheio é antigo companheiro de Serra. Durante a primeira gestão de Fernando Henrique Cardoso (PSDB-SP), Serra, então titular do Planejamento, também vivia em conflito com o ministro da Fazenda, Pedro Malan.
Sempre que possível, tecia críticas ao companheiro de governo, em relação aos gastos públicos, juros e taxas de câmbio. Nem mesmo ao assumir a pasta da Saúde, que tinha menor interface com a Fazenda, os atritos se encerraram.
“Serra queria ser ministro da Fazenda e não foi. A partir daí, travou-se uma disputa com mil faces distintas, que envolvia sobretudo o câmbio”, disse Everardo Maciel, secretário da Receita durante o governo Fernando Henrique
“Mas no fundo acho que tanto o Serra quanto o Malan nunca tiveram grandes discrepâncias em relação à política fiscal. Era uma disputa política – e, quando tem disputa política, o resto que se cria são arabescos laterais, firulas, que não revelam qual é a verdadeira disputa”, completou, em declarações citadas pela Revista Época.
De acordo com a Folha de S.Paulo, no segundo volume de seus "Diários da Presidência (1997-1998)", Fernando Henrique Cardoso aborda os conflitos com Malan e conta a dificuldade que teve de convencer Serra de que o cargo que ocuparia em seu segundo mandato seria o de Ministro da Saúde. Ele almejava um posto na área econômica.
Segundo FHC, "ele ia e voltava, queria uma pasta ligada ao Emprego ao trabalho, um superministério que incluísse o BNDES e a Caixa Econômica". A insistência era tamanha, que, em dado momento teria sido preciso dizer: "Olha Serra, é a Saúde, e não é 'ou'", conta o ex-presidente no livro.
De acordo com a Folha, em certa passagem, FHC refere-se a Serra como alguém que "não consegue corrigir certos problemas de relacionamento". "Mesmo alguém cordato como o Malan, mas também teimoso, obstinado e desconfiado, se sente inseguro com as manobras do Serra", diz trecho da publicação citado no jornal.