O Congresso e a sucessão dos fatos políticos relevantes

O feriado de Corpus Christi foi tempo providencial para a absorção, pelos parlamentares, dos acontecimentos políticos dos últimos dias.

Por José Roberto Fonseca*


Congresso ajuda Michel Temer em seu projeto golpista - Agência Câmara

A sequência de gravações reveladas pelo jornal Folha de S. Paulo na semana passada trouxe à luz que a tentativa de barrar as investigações da Operação Lava Jato está entre as principais razões para a instauração do processo de impeachment em andamento no Senado.

O diálogo entre Romero Jucá e Sérgio Machado é prova inequívoca de que houve grande empenho dos peemedebistas em garantir o afastamento da presidenta Dilma, como forma de abrir espaço para interferir nas investigações da Lava Jato e evitar as próprias condenações.

Outras gravações foram também reveladas pelo jornal: entre Sérgio Machado e o presidente do Congresso Renan Calheiros e também com o ex-senador José Sarney.

O fato teve repercussão no Plenário do Congresso Nacional, quando da aprovação da nova meta fiscal, em sessão que durou 16 horas em clima acirrado entre governistas e oposição. A presença do senador Romero Jucá na mesa que presidiu os trabalhos foi motivo de protestos em diferentes momentos da sessão, protagonizados especialmente pelos senadores Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), Lindbergh Farias (PT-RJ) e deputada Jandira Feghalli (PCdoB-RJ).

Ao final da sessão, quando já passavam das quatro horas da madrugada, restaram rejeitados três vetos presidenciais e a nova meta fiscal que prevê ao final do ano de 2016 um deficit de R$ 170 bilhões, proposta pelo governo interino de Michel Temer. A aprovação se deu, mesmo com a crítica de ser “um cheque em branco”, considerando que a nova meta não detalha onde serão realizados os gastos e servirá de aval para novos cortes nos programas sociais. Foi a primeira vez que, de forma flagrantemente inconstitucional, o Congresso aprovou alterações da meta fiscal sem o relatório da Comissão Mista de Orçamento.

No Senado, a Comissão Especial que conduz o julgamento da presidenta Dilma realizará na quinta-feira (2) nova reunião para deliberar sobre o cronograma dos trabalhos. Na reunião anterior, quando foi apresentada a proposta de cronograma, que prevê o julgamento final para o início do mês de agosto, o presidente da Comissão acatou pedido dos parlamentares que apoiam a presidenta, de suspender a aprovação até a entrega da defesa prévia, cujo prazo termina na quarta-feira (1º), quando será conhecida a indicação de provas: testemunhas, documentos, oitivas, perícias e demais diligências propostas, o que possibilitará de forma mais realista a aprovação de um roteiro de trabalho. A legislação que embasa a condução do processo não estabelece prazo para conclusão do julgamento. Apenas o afastamento da presidenta é que tem prazo máximo de 180 dias, podendo, inclusive, retornar ao comando do país mesmo antes da deliberação final. Portanto, a pressa já demostrada pelo relator poderá suscitar acirrado debate na Comissão.

Também os senadores, membros da Comissão do Impeachment, poderão requerer provas. Neste sentido, já foram apresentados requerimentos que solicitam à Procuradoria-Geral da República (PGR) e ao Supremo Tribunal Federal (STF) o compartilhamento das gravações, entre os peemedebistas Jucá e Sérgio Machado, que revelam a “trama” de usar o impeachment com o claro objetivo barrar as investigações da Operação Lava Jato. Existe pedido para que os trabalhos da Comissão sejam suspensos até que esses documentos sejam analisados. Para a senadora Vanessa Grazziotin, “o impeachment não está dado”, as últimas revelações já começam a “abalar convicções” de parlamentares que votaram pela abertura do processo.

Registra-se que representação contra o senador Romero Jucá foi protocolada no Conselho de Ética do Senado Federal pelo PDT. O partido alega semelhança com o que ocorreu com o senador Delcídio Amaral, que teve o mandato cassado por quebra de decoro ao tentar interferir na Lava Jato. O presidente do Conselho deverá nesta semana decidir se dará curso ou não à representação.

A Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado deverá realizar na quarta-feira uma sabatina com o indicado, pelo interino Temer, para ocupar a Presidência do Banco Central, Ilan Goldfajn –economista-chefe do Banco Itaú, com larga experiência do mercado financeiro e ligações com o PSDB. A aprovação no plenário do Senado também deverá ocorrer nesta semana. A pressa é para que o novo presidente do BC presida a próxima reunião do Conselho de Política Monetária (Copom), que ocorrerá no dia 7 de junho.

Estas questões estarão presentes na pauta política da semana.

Repercutem ainda fortemente no Congresso Nacional as mudanças na estrutura administrativa promovidas pelo governo interino. Comissões das duas casas do Legislativo debateram a questão e receberam de representantes da sociedade civil os protestos pelas mudanças atabalhoadas do governo Temer. Na Comissão de Ciência e Tecnologia do Senado (CCT), representantes de várias entidades como: Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) e Academia Brasileira de Ciência (ABC), compreendem que a ciência, a tecnologia e a inovação têm demandas diferentes da comunicação e que a fusão dos dois ministérios foi imprópria e resultará em redução dos investimentos em C&TI, o que já está sendo colocado em prática pelo governo. Vislumbra-se resistência do setor às mudanças.

Na Câmara, também a Comissão de Cultura discutiu questões administrativas propostas por Temer. Mesmo com o recuo sobre a extinção do Ministério da Cultura, os artistas, produtores culturais e demais representantes do setor, permanecem mobilizados em ocupações em vários estados, pois compreenderam que o atual governo representa o atraso para a cultura.

Nesta semana, novas audiências públicas estão previstas para debater a reforma administrativa.
Na Câmara, o relator do Conselho de Ética que analisa as denúncias contra o deputado Eduardo Cunha, deputado Marcos Rogério. DEM-RO, apresentará seu relatório, que deverá ser lido, mas a deliberação final deverá ficar para semana seguinte.

O Congresso Nacional, com todas as suas deformações, especialmente em relação à atual composição, com forte representação conservadora e que não reflete em proporção a sociedade brasileira, continua sendo um espaço de expressão e instrumento da democracia, sendo necessária participação cada vez mais ativa da sociedade e de suas representações.

Isso será imprescindível para a mobilização para enfrentar temas que muito em breve estarão pautados, como a extinção do Fundo Social do pré-sal e a exploração dessas áreas por grupos estrangeiros, em detrimento da soberania nacional. E vem mais: a ampliação da desvinculação da receita – DRU, que poderá reduzir ainda mais os recursos da saúde e da educação; a autonomia do Banco Central, que ampliará ainda mais o domínio de nossa política monetária por banqueiros; a flexibilização dos direitos trabalhistas e reforma da Previdência com a supressão de direitos, dentre outras pautas perversas ao trabalhador e à Nação brasileira.

Sem ampla mobilização social e com este Congresso de perfil conservador, as conquistas que tivemos nos últimos anos serão rapidamente desfeitas.

*José Roberto Fonseca é assessor da senadora Vanessa Grazziotin e da vice-presidência do PCdoB