Carta Aberta ao Ocupa MinC Santa Catarina

O movimento Ocupa MinC Santa Catarina, iniciado em 19 de maio, no prédio da Antiga Alfândega de Florianópolis, onde funciona a Representação do Ministério da Cultura no estado continua em plena atividade. Desde o início a organização demonstrada pelo grupo tem sido destaque, especialmente pelo processo de sinergia estabelecido com os funcionários do órgão e também com a comunidade.

ocupa Minc Floripa

Desde então, funcionou na ocupação, uma diversificada programação cultural envolvendo todos na luta em defesa da cultura e proporcionando a realização de rodas de conversa, ensaios abertos de teatro, apresentações de maracatu, rodas de capoeira, shows musicais, aula de dança de canto coral, oficinas de arqueologia para crianças e debates sobre Pontos de Cultura entre outros.

Mantendo o espirito de resistência e luta em defesa da cultura, o servidor público do Instituto Brasileiro de Museus – IBRAM, Anderson Loureiro, divulgou uma Carta Aberta ao Ocupa MinC Santa Catarina que o Portal Vermelho SC reproduz a seguir:

Carta Aberta ao Ocupa MinC SC

Quando eu era criança lembro que às vezes minha mãe tinha crise de bronquite. O médico pedia repouso completo por dois dias e, nessas ocasiões, uma grande amiga dela ia lá em casa, fazia almoço pra gente, cuidava da minha mãe e varria a casa, tarefas normais do dia a dia.

Uma dessas vezes eu perguntei a minha mãe se, diante daquela situação, eu podia ajudar de alguma maneira e ela disse que sim, obedecendo a ela própria, a sua amiga, ajudando a cuidar dos meus irmãos e também ao levantar os pés do chão quando ela fosse varrer debaixo do sofá.

Eu tenho aprendido muitas lições com vocês do Ocupa MinC SC. De alguma maneira intuo que, desde o início, eu já sabia que ia ser assim. Mas a altivez de vocês, a determinação, o sentido coletivo e fraterno em todas as ações, a dignidade como o movimento de ocupação se posiciona em defesa da democracia e dos direitos humanos, das minorias e contra qualquer discriminação, são coisas que realmente emocionam e revigoram qualquer ser.

E embora eu sinta, assim como vocês todos, que muito mais gente nossa poderia estar aqui de forma mais presente, mais efetiva, dando algo a mais por esta luta, coletiva enfim, mesmo assim entendo que o Ocupa não vem permitindo que o egoísmo prevaleça ou que a presunção sobressaia. Sob a bandeira da igualdade caminhamos todos juntos e este é o maior mérito desta pequena e já vitoriosa trajetória.

Digo vitoriosa porque tenho por todos vocês a maior e mais respeitosa amizade. Não só pelas lideranças abnegadas e afáveis, mas principalmente por aqueles que se dedicaram às tarefas mais simples, ou talvez consideradas menos nobres, mas igualmente importantes para todos. E sei que se trata de ombros aliados, em quaisquer lutas, e rostos que ainda verei nas muitas batalhas pela democracia mundo afora.

Este governo ilegítimo, todos nós sabemos que sobrenome tem. A quem eles servem, o que e a quem querem destruir, também. E quando a ameaça é à população, ao trabalhador brasileiro, ao SUS, à Educação dos mais pobres, aos aposentados, ao estado democrático de direito e aos direitos constitucionais de uma nação, o mínimo que podemos fazer é levantar os pés do chão. Se alguém ainda não entende que essa luta é sua, pessoalmente sua, ao menos que se digne a fazer o que pode, nem que isso seja apenas, e tão somente, levantar os pés para permitir a tarefa do outro.

A pessoa pode não saber cozinhar, pode não saber lutar, pode até não saber limpar. E pode não saber nada sobre mobilizar outras pessoas, nem discursar em público, ou mesmo segurar as faixas com palavras de ordem nas passeatas. Mas levantar os pés, isso todo mundo pode. Se a paz é fruto da consciência de cada ser humano, que então não haja paz para estes!

Por fim, penso que a diferença entre os trabalhadores neste momento mobilizados contra o golpe, contra a tomada indevida do governo em todo o país, é que eles estão fazendo alguma coisa contra, reagindo a uma arbitrariedade, a uma ilegitimidade. A diferença é só essa. Unicamente essa. Lutam contra a elite, contra a mídia, contra o capital, contra as oligarquias e contra a injustiça.

Os demais trabalhadores, aqueles que ainda não se tocaram, que nem mesmo se dispõem a levantar o pé no sofá, estes talvez acordem tarde demais. Ou jamais. E por isso a minha admiração pelo Ocupa MinC SC é cada dia maior.

Tem um filme que diz que, em algumas famílias, a coragem pula uma geração e só surge na próxima. Bendita a geração que acredita. Que acredita em si. Vida longa a esta geração corajosa e alvissareira. Parabéns Ocupa.

Anderson Loureiro – Servidor Público Federal MinC/Ibram