Procurador admite não ter prova contra Lula
Uma frase do procurador Roberson Henrique Pozzobom, durante a coletiva na qual detalhou a denúncia contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, nesta quarta (14), foi mais útil em explicar o que se passava do que todos os gráficos de Power Point que ele utilizou. “Não teremos aqui provas cabais de que Lula é efetivo proprietário do apartamento”, disse.
Por Joana Rozowykwiat
Publicado 14/09/2016 20:23
Em meio à apresentação, repleta de setas, quadros e tabelas, os procuradores da Lava Jato informaram que Lula é denunciado por corrupção ativa, passiva e lavagem de dinheiro. Segundo eles, há a “convicção” de que o ex-presidente teria recebido propinas “de forma dissimulada”, por meio de benefícios, “troca de favores”. Especificamente, nas reformas de um apartamento triplex no Guarujá e de um sítio em Atibaia e no custeio do armazenamento de seus bens.
Toda a firula visual não foi suficiente para fazer com que o expectador que assistia à transmissão ao vivo pela Globonews descobrisse, afinal, o que comprova que Lula teria cometido tais crimes. Como disse Pozzobom, não há provas. Mas há convicção.
Os procuradores esforçaram-se para, de certa maneira, reeditar o que se passou no impeachment da presidenta Dilma Rousseff. Na ausência das tais provas cabais, apelaram para “o conjunto da obra” – a tentativa de associar Lula e o PT a tudo de ruim que possa ter acontecido na política recente brasileira.
Do Mensalão à corrupção na Petrobras, recentes escândalos envolvendo políticos e empresários foram resgatados, em discursos que faziam coro com os antipetistas mais intolerantes.
Durante cerca de uma hora, senhores engravatados, escudados pela aparente imparcialidade dos que chegaram ao cargo pelo concurso público, se revezaram para acusar Lula de ser o “comandante máximo” do esquema de corrupção. Afinal, ele tinha que saber de tudo, pois era o presidente da República. Se pessoas indicadas por partidos aliados cometeram irregularidades, o petista tinha que ser responsável, porque as nomeações visavam encher os cofres do partido, discursaram.
Prova de tudo isso, da materialidade do crime e da autoria, aí não teve, não. “Provas são pedaços da realidade que geram uma convicção”, disse um inacreditável coordenador da força-tarefa, Deltan Dallagnol. Ao que parece, era mais uma questão de convicção mesmo. Aquela coisa de fé.
Em resumo, procuradores convocaram uma entrevista coletiva para anunciar que ofertaram uma denúncia contra um ex-presidente, contra o qual não conseguiram, até então, nenhuma prova firme de que tenha cometido crime. E, até onde se sabia, em um Brasil recente no qual as leis eram relativamente respeitadas, as acusações precisavam evidenciar que os eventuais benefícios que Lula tenha recebido são mesmo fruto dessa tal “troca de favores”.
Ocorre que os procuradores continuaram sem mostrar que Lula é sequer dono do apartamento no Guarujá. Embora o frequentasse, também não é proprietário do sítio em Atibaia e, mesmo que as obras no local tenham sido feitas para agradar o líder político – o que pode ser moralmente questionável –, ao que parece, isso não significa crime, caso não se confirme que os recursos usados pela empresa tiveram origem em desvios da Petrobras. O mesmo se aplica ao caso do armazenamento dos bens.
É por isso que a frase do procurador, citada no início desse texto, explica bem o que se passa: confirma que o golpe que afastou a presidenta eleita Dilma Rousseff ainda está em curso e tem como próxima etapa inviabilizar uma candidatura de Lula em 2018.