Futebol, eleições e democracia

O mundo da bola parece um mundo à parte da sociedade, como se fosse uma bolha dentro do sistema, onde só coexistem gramados, jogadores, gols, torcida, torneios. Mas futebol é uma criação do homem, que vive em sociedade.

Por Ricardo Flaitt

Socrates - Foto: Ricardo Flaitt

 E, por mais que se queira rechaçar, fato é que futebol dialoga com a política, quando se discute organização, regulamentos e os poderes nas agremiações, expõe a violência, reflete a estrutura social; os ingressos reverberam a economia do país, entre tantos outros pontos convergentes.

Um dos, senão o maior exemplo em que o futebol tabelou com política, aconteceu na década de 80, com a Democracia Corinthiana, quando os jogadores do Timão organizaram-se para determinar como funcionaria sua participação no clube e posicionaram-se na sociedade, lutando pelo fim da ditadura militar, em defesa dos cidadãos poderem escolher os seus representantes.

Esse movimento foi registrado magistralmente em “Democracia em Preto e Branco”, documentário dirigido por Pedro Asbeg, que todo torcedor, independente para qual seu coração pulsa, deveria assistir.

Asbeg conseguiu escalar jogadores, clube, políticos, bandas. Tudo num só time. E bateu um bolão, mostrando tudo o que envolvia aquele momento do país.

E foi numa tarde cinzenta de 24 de setembro, no Museu do Futebol, no Pacaembu, onde acontecera o primeiro comício das “Diretas Já”, na praça Charles Miller, quem trouxe o futebol para o Brasil, e no auditório “Armando Nogueira”, que pude rever esse grande momento histórico do futebol e da sociedade brasileira, que buscava oxigênio frente à censura militar, que desejava expressar seus sentimentos, que tinha o anseio de escolher seus representantes e acabar com aqueles tempos nebulosos.

Amanhã, 2 de outubro, acontecem novas eleições para que os cidadãos escolham os vereadores e prefeitos de seus municípios. Se agora existe a possibilidade de votar é também porque um dia houve uma luta, que incluiu jogadores de futebol, que pressionaram e lutaram por esse direito, que você exercerá no momento que estiver votando nos seus candidatos.

Inseridos em um país ainda com tantos descaminhos, em que memória sofre de esquecimento, muitos jovens cidadãos e torcedores sequer sabem que um dia, há pouco mais de 20 anos, as pessoas eram submetidos a um sistema ditatorial, sem direito a votar, sem direito a se expressar, sem direito a ser.

Emocionante e esclarecedor poder assistir Sócrates, Wladimir, Casagrande, participando, posicionando pelos direitos das pessoas, bem ali, no Pacaembu, onde praticamente o povo começou a ter voz.

Amanhã é dia de votar, assim como um dia, em plena ditadura militar, um time de futebol deu o recado no seu uniforme. É dia de exercer a democracia, o que torna o documentário ainda mais vivo, relevante e essencial.