Delegado da Lava Jato critica proposta que valida provas ilícitas
O delegado da Polícia Federal Marcio Anselmo, um dos principais investigadores da Operação Lava Jato, disse nesta terça-feira (18) em audiência pública na Câmara dos Deputados ser contra a proposta do Ministério Público Federal (MPF) que prevê a possibilidade de validação de provas ilícitas, contanto que obtidas de boa-fé.
Publicado 19/10/2016 11:44
A proposta faz parte das dez medidas de combate à corrupção apresentadas pelo MPF ao Congresso Nacional (PL 4850/16) e que conta com abaixo-assinado com a assinatura de mais de 2 milhões de pessoas, o que obriga a Câmara a instalar uma comissão especial para discuti-las.
“Não é possível aceitar”, disse Anselmo na comissão que discute o tema. “Acho muito difícil você aferir essa boa-fé do agente público, esse trecho não é compatível com nossa Constituição Federal”, afirmou ele.
A possível validação judicial de provas ilícitas, contanto que seja possível comprovar terem sido obtidas de boa-fé, é um dos pontos mais polêmicos das dez medidas de combate à corrupção propostas pelo MPF.
O PL 4850 cria oito exceções à regra de ilicitude da prova, além das duas atuais (falta de nexo causal com as provas ilícitas e quando as provas derivadas puderem ser obtidas de uma fonte independente das primeiras).
Assim, não seriam consideradas ilícitas, por exemplo, as provas obtidas por agente público de boa-fé e aquelas em que a relação de causa e efeito entre a ilicitude e a prova for remota. Juristas contrários à medida apontam subjetividade no critério de “boa-fé” usado no texto.
A medida foi defendida pelo juiz Sergio Moro, responsável pela Lava Jato na primeira instância, na mesma comissão especial da Câmara, mas tem sido criticada por personalidades do mundo jurídico. Em agosto, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes disse que a proposta foi feita por “quem não conhece nada de um sistema”.
Testes de integridade
O delegado Marcio Anselmo também criticou a proposta do MPF, prevista entre as medidas, que prevê a aplicação de testes de integridade surpresa em servidores públicos, nos quais eles seriam submetidos a simulações para aferir como reagiriam diante da oportunidade de praticar atos corruptos. A medida também foi defendida por Moro.
“O uso da ferramenta fere a Constituição e tratados internacionais. Não vejo possibilidade de uso de testes de integridade em processos penais”, disse Anselmo. Ele argumentou que o STF já previu como impossível o uso de flagrante ensaiado e que a medida também viola tratados internacionais de direitos humanos.
Apesar dos reparos, Anselmo elogiou as medidas, que para ele podem contribuir para a consolidação de uma cultura de combate à corrupção no País. Segundo o delegado, medidas como a interrupção da prescrição e limites para recursos judiciais protelatórios são fundamentais. “Aumento de penas é importante, mas não pode vir sozinho”, ressaltou.
Após a manifestação do delegado, o relator do projeto de lei sobre as dez medidas de corrupção, deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS), antecipou que pretende dar parecer para que o teste de integridade se restrinja a uma esfera administrativa, sem efeito penal.