Ex-presidente da Coaf reafirma que passou propina a deputados do PSDB

O ex-presidente da Cooperativa Orgânica da Agricultura Familiar (Coaf) Cássio Chebabi reafirmou, em depoimento no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ), dia 10 de outubro, que assinou contratos de comissionamento para disfarçar o pagamento de propina e que toda venda para o governo de São Paulo só ocorreria mediante repasses para funcionários públicos, dentre eles os deputados do PSDB Fernando Capez (estadual) e Duarte Nogueira (federal).

Por Camila Salmázio e Rodrigo Gomes, da Rede Brasil Atual

Capez e Duarte Nogueira - Reprodução RBA

Ele reconheceu sua assinatura em contratos que somam aproximadamente R$ 1,3 milhão, com objetivo de garantir a contratação da Coaf com a Secretaria da Educação do governo Geraldo Alckmin (PSDB).

Chebabi será ouvido nesta quarta-feira (16) na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga o pagamento de propina em contratos da merenda escolar, na Assembleia Legislativa de São Paulo.

Segundo Chebabi, toda a organização desse esquema era feita pelo lobista Marcel Ferreira Júlio e pelo vendedor da Coaf César Bertolino. “Como a gente não tinha confiança do governo do estado, eles pediram que a gente assinasse um contrato com um escritório de advocacia, que foi apresentado pelo Marcel como um escritório de advocacia dos deputados, tá? E que teria que assinar esses contratos senão não iria ser feito, iria acontecer igual 2014”, relatou. Em 2014, após vencer a chamada pública, a Coaf não foi chamada para assinatura do contrato. O processo foi cancelado.

Ao ser questionado sobre o destino do dinheiro, Chebabi afirma que “seria para funcionários públicos, entre eles, deputados, os deputados citados”. E completa: “O Marcel e o César falaram que boa parte da secretaria estava envolvida, que ele tinha que pagar muita gente lá dentro”. Por conta disso, Chebabi disse ter afastado dos negócios o presidente da União de Vereadores do Estado de São Paulo, Sebastião Misiara, porque ele "não era bem quisto" na secretaria.

O ex-presidente garantiu que os pagamentos foram efetuados durante sua gestão e ele acredita que, mesmo após ter deixado a presidência, todo o valor foi pago “porque eles fizeram até um aditamento”. Ele, porém, disse que tal documento sumiu. Parte dessas informações já tinha sido revelada antes, mas foi agora confirmada em delação premiada.

O ex-diretor da Coaf se enrolou ao falar do percentual pago em propina. Inicialmente disse que os contratos eram de 6%, 3% e 1% do valor total a ser pago pela Secretaria da Educação, de aproximadamente R$ 13 milhões. Depois, confrontado por um procurador do Ministério Público, corrigiu-se dizendo que se tratavam de minutas e confirmou sua assinatura em contratos de 4%, 4,5% e R$ 200 mil, este último destinado a Jeter Rodrigues, ex-assessor do deputado Capez, atual presidente da Assembleia Legislativa paulista. Os 4% seriam destinados a Marcel.

Os 4,5% restantes não ficaram esclarecidos. Em colaboração premiada no TJ-SP, o lobista Marcel Ferreira Júlio declarou ter repassado propina da ordem de R$ 650 mil da Cooperativa Orgânica da Agricultura Familiar (Coaf) aos servidores, sendo R$ 200 mil para Jeter e Merivaldo e que os assessores cobraram 4,5% para acampanha à reeleição do deputado Capez . No fim, teria ficado acertado R$ 450 mil para ajudar na eleição.

Os contratos de 4,5% e 4% foram celebrados entre a Coaf e a Patchelo (sic), tendo como preposto o lobista Marcel. Patchelo, do documento do Tribunal de Justiça, se refere a Paciello Sociedade de Advogados, que seria o escritório de advocacia citado por Chebabi como sendo o caminho para repassar dinheiro aos deputados Capez e Nogueira. A quebra de sigilo fiscal da empresa foi pedida pela oposição, mas não foi votada na CPI.

Jeter sempre alegou que os valores eram para que ele prestasse assessoria à Coaf na relação com o governo estadual. Merivaldo disse que não tem nenhum vínculo com a cooperativa e que o único valor que teve acesso foram os R$ 50 mil de um cheque repassado por Jeter, que serviria para liquidar dívidas entre os dois. O cheque foi depositado na conta de Merivaldo, mas estava sem fundos. Capez sempre negou ter conhecimento do caso e diz que os assessores usaram seu nome. Além disso, nos depoimentos ao TJ-SP, ambos disseram que ele não sabia do caso.

A Jeter, Chebabi também garantiu ter repassado um cheque caução no valor de R$ 50 mil e um veículo para apoiar a candidatura à reeleição de Capez em 2014. Nas contas de Jeter passaram, ao menos, R$ 122 mil acima de sua capacidade financeira e de origem não declarada, conforme depoimento dele ao Tribunal de Justiça. O depoente também disse que durante a campanha “chegou muito material do Fernando Capez para o (vendedor) Cesar (Bertolino), então, mostrou que realmente existia um vínculo com o deputado”, afirmou.

Chebabi também garantiu que os pagamentos foram feitos em dinheiro, embora a responsabilidade por essa ação fosse de Marcel e de Cesar. E disse ter sido ameaçado com a suspensão do contrato por Luiz Carlos Gutierrez, o Licá, outro assessor de Capez, para que não houvesse atraso no pagamento da propina. “Eu tenho até gravação de ameaças de um funcionário chamado Licá”, relatou, dizendo também ter conversas com ele no aplicativo Whatsapp.

Apesar das declarações sobre o envolvimento dos deputados, Chebabi admitiu que nunca tratou pessoalmente com eles dos negócios do esquema. “Eu nunca estive com o deputado Fernando Capez, nem com o Duarte Nogueira, então, tudo era relatado para mim como… Por eu ser o presidente da cooperativa, tá? E isso relatado também para a diretoria, tá?”, afirmou. Chebabi também disse não ter tratado diretamente com ninguém na Secretaria da Educação, mas que foi informado de um suposto pagamento de propina de R$ 100 mil ao ex-secretário da Educação Herman Voorwald, para manter a contratação com uma antiga fornecedora da pasta.

Por meio de nota, o deputado Capez disse considerar absurda a afirmação de que teve qualquer tratativa de dinheiro com membros da Coaf. "Nenhum membro da cooperativa confirmou esta mentira. Pelo contrário: disseram que o nome do deputado foi usado. Quatro pontos merecem destaque: 1) o depoente disse que nunca esteve com o deputado e tudo o que sabe é por ouvir dizer; 2) o escritório mencionado e com o qual foi feito o contrato não tem qualquer ligação com o deputado e nem é por ele conhecido; 3) da leitura do depoimento fica claro que o nome do deputado foi claramente usado, inclusive com referências a adulteração de WhatsApp; 4) o mais é pura maldade e especulação", diz a nota.

A RBA não conseguiu contatar o deputado Duarte Nogueira.