Com PEC 55, Pará teria perdido R$13 bi em saúde e educação desde 2007

De 2007 a 2015, o estado do Pará recebeu em torno de R$ 15 bilhões de recursos da União para a educação e R$ 14,3 bilhões para a saúde. Se as novas regras da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) n° 55 tivessem entrado em vigor há nove anos, o estado teria recebido R$ 5,6 bilhões para educação, uma perda de R$ 9,4 bilhões. Na saúde, o recurso reduziria para R$ 10,7 bilhões, aproximadamente 25% a menos de investimento para o setor no estado.

Aluno estudante Pará

Os dados são do professor do programa de pós-graduação em Economia da Universidade Federal do Estado do Pará (UFPA), Raimundo Trindade. O cálculo se baseia nos recursos que foram transferidos para o estado através do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) e do Fundo Nacional de Saúde (FNS), ambos, como informa o professor, vinculados a despesas federais.

A PEC 55, que limita os gastos públicos nos próximos 20 anos, será votada nesta terça-feira no Senado Federal.

Educação

O Fundeb é de âmbito estadual, por isso existem 27 fundos destinados aos estados e ao Distrito Federal para investir em educação. Os recursos do fundo são provenientes de impostos transferidos dos estados, Distrito Federal e municípios. A composição dele é definida pelo artigo 212 da Constituição Federal que determina a vinculação orçamentária de, no mínimo, 25% dos entes federativos e 18% da União para a transferência de receitas de impostos para a manutenção e desenvolvimento do ensino.

“A PEC 55 irá quebrar esse princípio constitucional na medida em que imporá uma nova regra, onde não mais o percentual mínimo será o parâmetro e sim as despesas do exercício anterior, corrigidas pela inflação (IPCA – Índice de Preços ao Consumidor Amplo), tal como pode ser visto no artigo 104/PEC 55”, explica o professor.

A lei que instituiu o Fundeb também determina que a União repasse um recurso de complementação aos estados e municípios toda vez que eles não alcançarem, com a própria arrecadação, o valor mínimo por aluno, o qual é definido nacionalmente. A ideia é diminuir a desigualdade regional no país.

Raimundo Trindade explica que o Pará foi o estado brasileiro que mais solicitou complementação para a educação. Apenas no ano de 2015, o estado recebeu, aproximadamente, 22% dos recursos totais da União referentes ao Fundeb. “O Pará basicamente é exportador de minério e existe um problema muito sério da desoneração desse minério exportado, o que acaba não gerando tributo para o estado, acaba não gerando receita”, esclarece. A Lei Kandir, de 1996, confere isenção fiscal sobre as exportações de produtos primários e semielaborados.

Saúde

Em relação aos investimentos no Sistema Único de Saúde (SUS), o impacto também não é diferente. Trindade informa que a Emenda Constitucional (EC) n° 86, aprovada ano passado, já “nasceu morta” caso a PEC 55 seja aprovada. A EC 86 determinava que o repasse da União em gastos mínimos com saúde seria de 13,2% da Receita Líquida da União para este ano e cresceria de forma progressiva: 13,7% para 2017; 14,1% para 2018; 14,5% para 2019; e 15% a partir de 2020. Caso a medida do governo vigore, no entanto, “o que a PEC vai fazer concretamente é acabar com isso e aos poucos, crescentemente, precarizar o sistema de saúde, que já é subfinanciado”, argumenta.

Trindade pontua também que os investimentos em saúde e educação são apenas dois exemplos do que poderá ocorrer caso a PEC 55 seja aprovada, mas há outras políticas sociais que não estão explícitas, mas que, a longo prazo, serão afetadas. Ele cita, como exemplo, o Bolsa Família.

“A partir do momento que se imponha o regramento, políticas como o Bolsa Família, concretamente, já estarão com os dias marcados. É uma coisa curiosa porque tu não tens um discurso ‘olha vamos acabar com tal política’, mas a efetivação do orçamento, a partir da regra que está colocada na PEC, leva ao fim desse tipo de política”, explicou.

PEC do conflito

Para além dos impactos nos setores como educação e saúde, a PEC 55 também irá contribuir com os conflitos territoriais na Amazônia, como analisa a socióloga Edna Castro.

“Atrás de uma PEC como essa virá um endurecimento do acesso das terras indígenas, quilombolas, camponeses, de áreas de pesca, que são grupos da sociedade que ocupam terras de interesse de segmentos mais atrasados – que hoje fazem parte do governo federal”, avaliou. Ela destacou os setores agrário, do agronegócio, quem têm a terra como elemento de expansão do capital.

Castro é professora no Núcleo de Altos Estudos Amazônicos (Naea) da UFPA e destaca que a discussão da proposta feita pelo governo Temer não pode ser analisada apenas como um instrumento fiscal. Ela aponta que a medida se baseia “em pressupostos falsos quanto ao resultado que a PEC irá produzir na busca pela solução da crise”. Para a socióloga, o que deve estar em discussão é o quanto essa proposta irá aumentar a desigualdade do país, tendo em vista que a PEC 55 é uma proposta que sacrifica a grande parte da população assalariada.

“O sacrifício não é generalizado, é um sacrifício parcializado, por classes, por camadas sociais e o impacto, pelo meu ponto de vista, é sobre as camadas populares. Outro ponto a pensar é em uma reposição salarial na faixa da inflação, para começar a inflação é faixa manipulável pelo governo”, apontou.