Em São Paulo, políticas de saúde de Doria preocupam trabalhadores

O Sindicato dos Trabalhadores na Administração Pública e Autarquias do Município de São Paulo (Sindsep) vê com apreensão as medidas anunciadas pelo prefeito eleito de São Paulo João Doria Júnior (PSDB), em especial a criação de conselhos gestores em cada uma das 22 secretarias e o Corujão da Saúde.

João Dória

No último dia 24, o tucano anunciou os nomes dos presidentes dos conselhos gestores que serão criados em cada uma das 22 secretarias. No caso da Saúde, o presidente será o médico infectologista David Uip, atual secretário da Saúde no governo de Geraldo Alckmin (PSDB). Esses grupos terão a função de orientar, avaliar e sugerir ações para os secretários. Na prática, vão influenciar decisões e diretrizes da gestão nas áreas específicas e poderão até se sobrepor aos conselhos temáticos existentes.

Na avaliação do vice-presidente do Sindsep, Leandro Oliveira, o conselho contraria a Constituição. No caso da saúde, em princípio, o conselho formal, previsto constitucionalmente, é o Conselho Municipal de Saúde (CMS), no qual o Sindsep ocupa um assento. "As articulações dos gestores das esferas municipais, estaduais e da federação para resolver quaisquer questões técnicas se dão por meio de comissões bipartite e tripartite, como é o CMS, que tem representantes da gestão, dos usuários do SUS e dos trabalhadores. Qual a finalidade de se criar esse tipo de conselho se as instâncias do Sistema Único de Saúde já funcionam e funcionariam melhor com sua valorização pelo governante governante?", questiona.

Leandro ressalta que seja quem for o secretário nomeado, sua obrigação é fazer funcionar esses espaços institucionais que já existem no SUS. "Acho que se trazendo a ideia de que vai competir com espaços já formais existem. Talvez vá competir inclusive com os espaços já formais que existem. Não vejo com muitos bons olhos isso."

E que, pelo perfil empresarial de João Doria, não deverá haver representante de usuários da saúde pública ou trabalhadores entre os sete integrantes de cada conselho gestor – o que é fundamental e constitucional. "A participação social no sistema único de saúde, que é uma coisa inovadora, via conferências municipais de saúde – como a municipal que acontece a cada dois anos. O objetivo do prefeito é competir com o que existe. Temos de conhecer melhor a proposta, mas a principio creio que vá na contramão daquilo que foi aprovado na Constituição federal de 1988.

Apreensão
O projeto de redução da fila para a realização de exames por meio do programa Corujão também é visto com apreensão. "Primeiro por causa do deslocamento das pessoas à noite, o que tem sido criticado pelos especialistas em saúde. Em alguns casos fazer um exame à noite não tem problema, mas isso não pode ser uma política. O normal é as pessoas fazerem exames durante o dia."

Outra preocupação, segundo o dirigente do Sindsep, é que o atendimento à saúde da população de São Paulo seja transferido para a iniciativa privada. "Temos hoje 67% da rede de atenção básica nas mãos das OS. E se o futuro prefeito começa a soltar recursos públicos no setor privado, indo além das organizações sociais, tudo indica que vamos ter ainda mais precarização; o serviço vai sendo cada vez mais transferido para o setor privado, quando a prefeitura deveria investir em recursos próprios, fazer concursos, investir na rede. Para nós, é uma situação que pode piorar em vez de melhorar."

Secretário sob suspeita

Escolhido por Doria para ocupar a pasta da Saúde, Wilson Pollara é um nome pouco conhecido pela direção do Sindsep. Até a semana passada, sabia-se apenas que o médico é secretário-adjunto de David Uip no governo Alckmin. No dia 26, porém, o site da Folha de S.Paulo publicou nota no começo da madrugada com a informação de que Pollara é investigado pelo Ministério Público de São Paulo por suposta improbidade administrativa. A informação foi confirmada pelo MP paulista.

Em nota oficial, o MP informou a existência do inquérito civil 14.0695.0000069/2015-4, que trata de suposta irregularidade em processos seletivos destinado à contratação de software de gestão de saúde para Hospital do Servidor Público (IAMSPE), Hospital das Clínicas e Santa Casa de Misericórdia. O procedimento foi iniciado em razão de representação anônima que apontava irregularidade nos certames, mencionando que os processos seletivos seriam irregulares e visavam beneficiar a empresa MV Sistemas.

Ainda segundo o MP, o representante (que ingressou com pedido de investigação aos promotores) mencionou que Pollara seria um dos responsáveis pela situação. Estão sendo apuradas informações junto aos entes responsáveis pelas contratações. O inquérito civil foi instaurado em setembro de 2015.

Segundo o Tribunal de Justiça de São Paulo, Pollara é reu em processo movido pela prefeitura de Itapetininga (SP), por questões relativas a IPTU, e pela Justiça do Trabalho, na mesma cidade.

Até 1º de abril de 2014, segundo a Junta Comercial, o futuro secretário da Saúde de Doria dividia a empresa BP Consultoria e Gestão Empresarial Ltda com o também médico Mauro Hamilton Bignardi, reu Ação Penal nº 0024095-49.2012.8.26.0269, da Justiça de São Paulo. A acusação: participação em esquema de desvio de recursos públicos da saúde geridos pelo Sistema de Assistência Social e Saúde SAS e Instituto SAS (Isas) no Hospital Regional de Itapetininga, denunciado pelo Gaeco na operação Atenas.

A exemplo dos demais membros do Conselho do Isas, Bignardi era sócio e representante de oito empresas utilizadas para desviar recursos, todas com endereço na Rua Albina Barbosa, 330, Aclimação, CEP 01.530-020, São Paulo/SP. Segundo o Diário Oficial, o relatório de investigação e reportagens jornalísticas dão conta de que no endereço em questão não está instalada nenhuma pessoa jurídica, caracterizando-se tratar de empresas fantasmas. Mesmo assim, ele continuou agindo.

Em abril passado, veio a tona em Taubaté, no vale do Paraíba, denúncia de contratação da empresa Essencial Medicina Integrada S/S Ltda para a prestação de serviços médicos socorristas para o serviço de urgência e emergência em diversas unidades de saúde. A prestadora de serviço é de Bignardi.

Em fevereiro de 2014, a RBA publicou reportagem em que apontava a ligação de Pollara e Bignardi. O caso não chegou a ser investigado. De acordo com a assessoria de imprensa da Corregedoria Geral da Administração do Estado de São Paulo, não há "nenhum procedimento correcional no qual o secretário-adjunto da Saúde Wilson Pollara figure como investigado".

Por meio da assessoria da equipe de transição de Doria, Pollara informa que nunca indicou a empresa MV para qualquer hospital ou serviço de saúde, que nunca trabalhou na Santa Casa ou no Hospital do Servidor. E que no caso do Hospital das Clínicas, a MV ganhou processo licitatório após término do contrato com a Prodesp.

Ainda segundo a nota, a licitação foi conduzida pela superintendência do HC. À época, Pollara trabalhava no Instituto Central (do HC) e não tinha qualquer relação com o processo. O secretário nega também qualquer relação com Paulo Magnus, proprietário da MV.

Segundo a assessoria, como não há qualquer ação no Judiciário, nada impede a nomeação do secretário. Conforme parecer jurídico de Anderson Pomini, secretário de Assuntos Jurídicos, não há conclusão do inquérito no MP, e tampouco ação ajuizada no Judiciário a respeito.

"É claro que essas questões vão ser definidas pela Justiça e só nos cabe a preocupação. Esperamos que na saúde a gente tenha nomes com unidade, que não tenham histórias complicadas. Eu só queria lembrar que Doria foi dos maiores críticos da nomeação de Lula por Dilma, antes do impeachment. Então acho que um prefeito que tem um posicionamento de que essas coisas não possam afetar o governo, acho que deve preocupar. Vamos acompanhar o desdobramento", afirmou Leandro, do Sindsep.