Depoimento de Marcelo Odecrecht e o imbróglio jurídico da Lava Jato

No suposto depoimento de Marcelo Odebrecht ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), nesta quarta-feira (1º/3), ele confirmou que Eliseu Padilha (PMDB), ministro licenciado da Casa Civil e braço direito de Temer, foi o operador do pagamento feito por Temer de R$ 10 milhões para a legenda, em 2014, num jantar no Palácio do Jaburu.

Por Dayane Santos

Ele teria citado outras lideranças políticas do governo Temer, da administração Dilma e também – vejam só – o presidente do PSDB, o senador Aécio Neves (MG), que foi autor do pedido de cassação da chapa Dilma-Temer.

Na semana passada, José Yunes, ex-assessor e amigo de Temer, disse que recebeu um envelope de Lucio Funaro, empresário tido como operador de Eduardo Cunha, preso há quatro meses em Curitiba. Yunes chegou a autodenominar-se como "a mula de Padilha".

Os advogados de Temer, chegaram a informar que vão pedir a anulação do depoimento de Marcelo Odebrecht.

Licenciado para tratamento de saúde, Padilha começa a ser rifado pelos aliados que pedem o seu afastamento permanente. A estratégia é proteger Temer das acusações para não aumentar a vulnerabilidade do governo.

A tática é a mesma utilizada pela grande mídia. Diferentemente de outros depoimentos que tratavam de liderans petistas, as declarações do empreiteiro foram minimizadas nos destaques das capas de jornais.

O jornalista Luis Nassif resumiu a questão de forma simples e objetiva: "São inúteis as tentativas de se minimizar as declarações de Marcelo Odebrecht sobre Temer. Segundo as reportagens, Marcelo teria dito que almoçou no Palácio Jaburu com o vice-presidente Michel Temer, mas Temer não mencionou expressamente a quantia negociada, de R$ 10 milhões. O valor foi combinado previamente entre Eliseu Padilha e o diretor de relações institucionais da Odebrecht, Cláudio Melo Filho".

Vazamento

O que não mudou foi o esquema de vazamento e seletividade. O depoimento concedido na tarde desta quarta foi parar nas mãos de jornalistas de agência Reuters no mesmo dia. Como um depoimento que está sob sigilo da delação em que nem mesmo os assistentes do MP e do Judiciário participam vazou?

A Procuradoria-geral da República já pediu o fim do sigilo dos depoimentos de Marcelo Odebrecht e de outros delatores ao TSE, mas a corte não acatou. enquanto isso, os vazamentos garantem a venda dos jornais e revistas.

Nos trechos vazados, Marcelo Odebrecht disse que não tratou de valores com Temer no jantar no Palácio do Jaburu. Temer, por sua vez, confessou que o encontro aconteceu e que pediu contribuição a Marcelo Odebrecht, que por sua vez disse que outro delator da empresa, Cláudio Melo, teria tratado do valor com Padilha. Mas Melo afirmou ao MPF que Temer pediu ao empresário Marcelo Odebrecht R$ 10 milhões para o PMDB.

As contradições só levam a uma conclusão: alguém está mentindo. Preso desde junho de 2015, Marcelo Odebrecht disse que se sentia o “bobo da corte” do governo. Teria dito ainda que apesar de ser dono da maior empreiteira brasileira estava descontente por ser "obrigado" a entrar em projetos que não desejava e bancar repasses às campanhas eleitorais sem receber as contrapartidas.

Tal afirmação não faz nenhum sentido, já que não estamos falando de um empresário de pequeno porte que depende das obras para sobreviver, mas de um empreiteiro que herdou do paí uma das maiores empresas brasileiras.

Mas existe outro fato que evidencia o limbo criado pela Lava Jato: a citação sobre o senador Aécio Neves (PSDB-MG). O partido que pede a cassação da chapa Dilma-Temer no TSE, também teria utilizado – exatamente como fizeram petistas e peemedebistas – um operador para obter recursos da Odebrecht.

Essa é uma questão que se arrasta desde os primeiros vazamentos da Lava Jato: como o Ministério Público e o Judiciário vão explicar e determinar que o dinheiro pago pela Odebrecht a um partido era mais limpo que o pago a outro? Como definir que o dinheiro pago ao PT era propina e ao PMDB caixa 2? E ao PSDB era ideológico?

Trata-se do mesmo imbróglio jurídico criado no julgamento da Ação Penal 470 (chamado de mensalão), em que por falta de provas se condena com base na tese do domínio do fato, o simples fato de alguém estar lá e ter um posto de comando e poder de decisão é suficiente para a condenação. E o que é pior, a sentença fica condicionada ao partido que o réu pertence.

A arquitetura jurídica da LAva Jato reforça a afirmação de uma dos procuradores: Não temos provas, mas temos a convicção.