Publicado 20/05/2017 11:26
Em 1984 o Brasil vivia num impasse: estava sob o comando do ilegítimo e antipopular presidente João Baptista Figueiredo e sob a égide da Constituição autoritária de 1967, de cujo artigo 74 constava que a eleição para presidente e vice-presidente da República seria por um “Colégio Eleitoral” composto dos senadores, deputados federais, três Delegados (deputados estaduais) indicados por cada uma das Assembleias Legislativas e mais um delegado por cada 500 mil eleitores no estado. Estava prevista eleição para presidente e vice-presidente em 1985.
Antes, em 1983, o deputado Dante de Oliveira (PMDB-MT) apresentou a emenda de nº. 5, a qual alterava a Constituição e restabelecia eleição direta para presidente. Uma ampla mobilização nacional foi feita em torno dessa emenda com a realização de grandes comícios em praças públicas, debates nas universidades, nas escolas, nas fábricas e nas comunidades.
Apesar das manifestações que levaram milhões às ruas pelas “Diretas Já”, a emenda ficou no meio do caminho: eram necessários 320 votos (2/3), mas alcançou-se 298 votos favoráveis, 65 contra, 113 ausências e três abstenções. Míseros 22 votos deixaram de garantir as “diretas”. Há um dado extremamente relevante daquela disputa: as 113 ausências e as três abstenções foram de deputados do PDS, partido que sustentava a ditadura. Muitos dos parlamentares desse partido votaram pelo “sim” às diretas. Para que tenhamos uma ideia, dos 17 deputados federais do Maranhão àquela época, cinco contrariaram a ditadura; também noutros estados o mesmo fenômeno ocorreu.
Conclui-se, então, que, embora tenha despertado amplamente o interesse nacional, a campanha pelas diretas não conseguiu “arrancar” ao menos 22 votos dentre aqueles 113 pedessistas que deixaram de comparecer à sessão para votar pelo fim do colégio eleitoral.
Bom que se diga: embora não tenha sido exitosa, a campanha pelas “Diretas Já”, por sua amplitude e simbologia nacionais, preparou as condições para que a ditadura fosse derrotada no ano seguinte no próprio colégio eleitoral. Mas aí já é outra história!
O que nos interessa aqui é constatarmos que trinta e três anos depois, agora sob a batuta da “Constituição Cidadã” de 1988, cujo artigo art. 1º, parágrafo único prevê que “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente,”, estamos novamente metidos num impasse: um presidente ilegítimo e antipopular, tenta, a todo custo, manter-se no poder para levar adiante uma agenda de regressão de direitos e de desnacionalização do país. E então, a disjuntiva, mais uma vez aparece. O melhor caminho para tirar o Brasil do impasse atual é o “colégio eleitoral” ou as “Diretas Já”? Este dilema serve para nos provar que o velho Marx tinha razão quando disse que a história somente se repete como tragédia ou farsa; mas ele não sabia que poderia se repetir simultaneamente, e das duas formas.
Em 84, como agora, a estreiteza não foi útil ao desbravamento de caminhos para a redemocratização do país. Ontem, assim como hoje, a agenda é pela retomada dos fundamentos de uma Constituição democrático-liberal. Trata-se do restabelecimento do Estado Democrático de Direito contra os arbítrios comandados pela mídia em conluio com setores do Judiciário e do Ministério Público, o partido da Lava-Jato.
Ontem, cabia atrair e incorporar lideranças e parlamentares da agremiação que sustentava a ditadura (PDS) para construir a frente ampla e assim derrotá-la; hoje, buscar criar liames que aproximem a agenda de redemocratização com parlamentares que até aqui sustentaram o golpe e o governo Temer. Sim, a situação é assim mesmo, e por uma simples razão: se o que pretendemos é eleger o próximo presidente pela via direta e se para isso é preciso que seja aprovada uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), então o caminho é este: mobilizar milhões às praças e ruas e assim forçar o Congresso Nacional a devolver ao povo o papel constitucional usurpado com o golpe.
Sem isso não há amplitude. E sem amplitude não há “Diretas Já”.