Flávio Dino: O remédio para a crise é novas eleições, um banho de urna
Em entrevista à BBC Brasil, o governador do Maranhão Flávio Dino (PCdoB) fez uma profunda análise da conjuntura política marcada pela crise que atinge todas as instituições da República. Para ele, o governo de Michel Temer não se sustenta e a saída é eleições diretas antecipadas.
Publicado 26/05/2017 11:34
O governador maranhense enfatiza que é preciso haver uma recomposição política, diante da crise e da profunda perda de credibilidade do sistema político. Mas adverte: “Só haverá eleição direta havendo mobilização popular nessa direção. A classe social dominante não quer eleição direta agora. Se não houver mobilização popular, é muito difícil o Congresso ou o TSE ir para esse caminho, porque se choca com o desejo meio que universal da classe política, da elite, de um certo nível de estabilidade. A classe social dominante não quer eleição direta agora”.
Ele pontua que o país vive uma crise aguda e que “o remédio seriam de fato novas eleições, um banho de urna”.
“Eu pessoalmente, acho que se fosse esse o pacto, uma repactuação da política, deveria haver eleições gerais, de fio a pavio, pegar o Congresso, governadores, etc. Mas faço sempre questão de frisar, para não correr o risco de o leitor achar que minha abordagem é ingênua, estou apenas colocando o que eu acho que seria o certo. Hoje, não é o mais provável. O mais provável é o consenso da elite que é trocar o Temer por outro que faça as reformas previdenciária e trabalhista”, disse.
Flávio Dino avalia que a solução pode começar via TSE (Tribunal Superior Eleitora)l, com a eventual cassação da chapa Dilma Rousseff e Temer, em julgamento marcado para início de junho. “Isso dá uns quinze dias mais ou menos até o julgamento, o que também contribui para essa inércia”, disse ele.
“Isso juridicamente, mas, politicamente, hoje ele já está por um fio. O TSE pode cortar esse fio, e aí não tem como resistir mesmo que processualmente tenha esse ou aquele recurso”, frisa.
Flávio Dino, que foi juiz federal e professor de Direito, também rebateu a tese de que a realização de uma eleição direita representa uma violação à Constituição, já que a proposta é aprovar uma emenda constitucional, pois não há previsão para tal medida.
“(…) falar em regra do jogo a esta altura? Fizeram um impeachment absurdo para colocar um governo que não se sustenta, que só fez aprofundar a crise. Esse discurso não tem base empírica. No caso desse mecanismo das indiretas previsto pela Constituição para situação de dupla vacância (dos cargos de presidente e vice), o sistema funcionaria bem, ao meu ver, se fosse em situações normais de temperatura e pressão. Não é o caso, hoje você vive na verdade solavancos derivados da quebra da ordem constitucional [pelo impeachment de Dilma]”, fundamentou.
E reforça: “Acho que democrata verdadeiro concorda que a única coisa que estabiliza a política na democracia é o respeito à soberania popular”.
A jornalista Mariana Schreiber indagou Flávio Dino a comentar as especulações feitas pela imprensa de que Fernando Henrique Cardoso e Lula estão articulando para a sucessão de Temer, mas que não teriam conversado diretamente entre si. “Essa conversa direta seria importante?”, questionou ela.
Para Flávio Dino, o momento é de “muita precarização da política, uma conversa direta seria um fato altamente positivo, uma mensagem importante de busca de recomposição da institucionalidade”.
“Você não tem jogo institucional no Brasil hoje: o Congresso funciona precariamente, a Presidência da República, os partidos, os próprios governadores estão muitos enfraquecidos”, completou.
Sobre a manifestação das centrais, que levou Temer a lançar mão de um decreto em que utilizava as Forças Armadas para conter os protestos, o governador disse que a medida ampliou o isolamento de Temer.
“O fragilizou, sobretudo pela medida equivocada [já revogada] de convocar o Exército. Quando você vai para o extremo, é lógico que você constrói isolamento, até pelo modo como foi anunciado, muito atabalhoado, dizendo que foi pedido pelo Rodrigo Maia [presidente da Câmara], mas não foi”, disse.
Questionado sobre a violência que foi a justificativa para o governo usar as Forças Armadas, Flávio Dino afirmou que foi resultado da concepção cerceadora do exercício de liberdade de manifestação.
“Isso ficou mais evidente quando veio esse decreto desastroso, desnecessário e ilegal da convocação do Exército. É claro que depredar o patrimônio público é errado, quero deixar clara minha condenação a isso também. Mas o debate é o que gera [a violência]? O que gera é essa visão muito repressiva”, salientou.
Ele lembrou que, tradicionalmente, as manifestações sempre foram na frente do gramado do Congresso Nacional e, justamente por isso, foi construído o espelho d'água para ser uma divisão entre o gramado e o prédio do Legislativo.
“Agora criaram essa moda de que não pode chegar no gramado, sem nenhuma razão. E aí você cria uma tensão, ‘daqui ninguém passa’. Pode pegar todas as fotos da história brasileira, protestos pela emenda Dante de Oliveira [em 1984 para convocar eleições], na ditadura, tinha manifestação ali e agora não pode mais. Então, você cria uma série de protocolos, digamos, excessivos, cerceadores, que estimulam a tensão. Se não houver uma providência política num prazo curto, a tendência é que a gente viva esse ambiente, com o suposto andamento das tais reformas, que vão acabar conduzindo a cada vez mais conflito”, declarou.