Não apagarão a chama da luta pelos direitos humanos
Visitas a Rafael Braga e comunidades reforçam necessidade da luta por direitos humanos
Por Benedita da Silva*
Publicado 19/07/2017 18:20
Na quinta-feira passada, dia 6 de julho, a Comissão dos Direitos Humanos da Câmara dos Deputados – CDHM, por meio de seu presidente, deputado Paulão e dos deputados Benedita da Silva e Wadih Damous, fez uma diligência para visitar Rafael Braga, preso em Bangu 2.
Na presença de sua mãe, dona Adriana, e advogados do IDDH (Instituto de Defensores de Direitos Humanos), Rafael Braga nos contou a injustiça que sofreu. Foi um relato comovente e convincente. Jovem, pobre e negro, ali estava mais um dos incontáveis casos com que a Casa Grande do século XXI usa como “exemplo” para ameaçar a “senzala”.
Nada mais legítimo do que a campanha que os movimentos sociais fazem pela liberdade de Rafael Braga. O seu caso é a bandeira de luta contra o genocídio da juventude negra e a defesa dos direitos humanos, jogados no lixo pelo governo golpista.
No dia seguinte, estivemos nas comunidades do Alemão, Mangueira e Cantagalo ouvindo parentes de vítimas fatais, mães de alunos, líderes comunitários e organizações locais de direitos humanos.
Em todos os relatos, o mesmo denominador comum: a violência policial descontrolada, com policiais chegando até mesmo a agir de forma autônoma. Falar em respeito aos Direitos Humanos nas comunidades e na periferia é considerado uma piada. A Constituição Federal não passa da porta das comunidades.
O fato é que os moradores das comunidades do Rio de Janeiro, crianças, jovens e adultos, vivem numa zona de guerra permanente. São as vítimas inocentes da briga entre “o rochedo e o mar”.
Para se ter ideia do clima de terror em que vivem, entre janeiro e junho desse ano, no Morro do Alemão, em apenas quatro dias não teve tiroteio. Uma das organizações que ouvimos é que faz esse levantamento na comunidade.
Nessas condições, as crianças correm grandes riscos para manter a presença escolar e, sob esse clima de medo, nada conseguem aprender.
Uma mãe presente disse que a sua filha de 9 anos ainda não sabe ler nem escrever. Mas a outra filha, de 22 anos, já está na faculdade, pois a sua infância se deu em momentos menos violentos. Uma netinha, de 3 anos, vendo a notícia da morte de uma outra criança, no Lins, pediu para a avó: “vovó, não deixe a polícia me matar”.
Nas comunidades, as mortes quase sempre têm o mesmo perfil: adolescentes e negros. As causas alegadas pela polícia também se repetem: autos de resistência ou balas perdidas. E as mães ficam sempre desamparadas e sem nenhuma satisfação por parte das autoridades policiais e do Ministério Público.
A vitória do golpe contra a presidenta Dilma e o consequente fim das políticas sociais e de direitos humanos, bem como o desmantelamento do governo estadual só fizeram piorar algo que já era muito ruim ou mesmo inexistente: a segurança dos cidadãos que moram nas comunidades que, como os demais cidadãos, têm os mesmos direitos constitucionais.
Entregues à própria sorte, as UPPs perdem a sua missão original e se desfazem na velha e impune violência policial contra os moradores, com toda a sua sequência de abusos, extorsão e execuções de pessoas inocentes, inclusive crianças.
O lamentável nesse cenário é que eu acredito que os bons policiais acabam perdendo espaço e, muitas vezes, até a vida, dentro da corporação para um grupo de policias que age de forma autônoma e acima da responsabilidade e interesse do Estado.
Além disso, diante desse quadro de horrores, soa como ironia falarmos de bala perdida, pois de “perdida” ela não tem nada. Normalmente a bala perdida tem procedência definida e alvo certo, o sofrido povo das favelas e periferias do Rio do Janeiro.