Devolução antecipada pelo BNDES é pedalada e é ilegal, diz associação
Em mais um movimento no sentido de enfraquecer os bancos públicos, o governo Temer pediu oficialmente que o BNDES devolva antecipadamente R$ 180 bilhões dos empréstimos de longo prazo concedidos pelo Tesouro nacional ao banco. A associação dos funcionários da instituição de fomento (AFBNDES), questionou a legalidade da iniciativa, que classificou como uma "pedalada fiscal".
Publicado 11/09/2017 16:40
De acordo com O Estado de S. Paulo, a expectativa do governo é de que R$50 bilhões entrem no caixa do Tesouro ainda este ano. Os outros R$130 bilhões devem ser devolvidos em 2018. Em dezembro do ano passado, o BNDES já havia feito o pagamento antecipado de outros R$100 bilhões, também por determinação da gestão Temer.
Em nota divulgada nesta segunda-feira (11), a AFBNDES afirmou que “a devolução dos recursos impacta diretamente o papel do BNDES enquanto banco de desenvolvimento”. Segundo a associação, a ação da equipe econômica fere a Lei de Responsabilidade Fiscal, além de afetar diretamente programas do Banco que financiam estados, municípios e setores chave da economia, como o de infraestrutura e o industrial
"Para a Associação dos Funcionários do Banco de Desenvolvimento (AFBNDES), o pedido é ilegal, pois fere o artigo 37, inciso II, da Lei de Responsabilidade Fiscal – a lei veda o recebimento antecipado de valores equiparando-o a uma operação de crédito -, ou seja, trata-se de uma pedalada fiscal", diz o texto.
De acordo com a entidade, seriam necessários cerca de R$ 150 bilhões anuais para realizar operações num nível de atividade no mesmo patamar de 2008, antes do incremento de recursos via empréstimos do Tesouro Nacional.
Nos governos Lula e Dilma, o Tesouro passou a emprestar recursos de longo prazo para o BNDES, como forma de ampliar os financiamentos, movimentando a economia em um momento de crise mundial. A ideia era evitar recessão e desemprego. Com o golpe, a estratégia do novo presidente tem sido oposta: esvaziar o banco, retirando assim da economia um importante instrumento de fomento.
“Não podemos ignorar que a medida [antecipação do pagamento] causa prejuízo ao BNDES, uma vez que se trata de recursos captados legalmente, com prazos longos de amortização, e que permitem o financiamento de projetos que requerem uma gestão eficiente de ativos (projetos financiados) e passivos (captação de recursos) “casados” em longo prazo”, afirmou o presidente da AFBNDES, Thiago Mitideiri.
Ele destacou que, com os empréstimos ao BNDES, pela primeira vez, nos últimos 40 anos, o Tesouro emitiu dívida para financiar investimentos na economia real. Em meio aos efeitos da crise de 2008, tais créditos permitiram a atuação anti-cíclica do banco, que ajudaram a proteger a economia brasileira.
"Agora [esses recursos] deveriam estar sendo aplicados em um programa massivo de investimento em infraestrutura e contribuindo para a retomada do crescimento. A devolução antecipada desses recursos significa hoje para o país abrir mão de importante instrumento para a recuperação da economia e da empregabilidade, já tão prejudicadas, em nome de uma política econômica recessiva e geradora de desemprego", criticou o presdiente da entidade.
Na sua avaliação, a intenção da Fazenda e do Banco Central no sentido de "desidratar" o BNDES "é tornar os investimentos de longo prazo no país dependentes do mercado de capitais internacional".
Em entrevista sobre o tema para o jornal interno da associação, o economista José Roberto Afonso afirmou que “não é preciso ler a lei para saber que, antecipar receita é igual a postergar gasto. É senso comum, não há como negar”.
Por estas razões, a AFBNDES apoiou parecer entregue por entidades representativas bancárias ao Ministério Público Federal questionando a legalidade da devolução antecipada de R$ 100 bilhões feito pelo BNDES, na gestão da ex-presidente Maria Sílvia Bastos, no final de 2016.
Prevista no projeto de orçamento da União para 2018, a proposta de nova devolução de recursos que vieram para o Banco após a crise de 2008, também é criticada pelo economista da UFRJ João Sicsú. “É terrível. Isso faz parte da estratégia de destruição do BNDES, que é um banco que financia a indústria nacional”.
O professor de Economia da UERJ, Elias Jabbour, é outro crítico do desmonte do banco público. Para ele, está em curso "uma política deliberada de criminalização da política fiscal" das gestões anteriores.
De acordo com ele, a devolução antecipada é "a maior pedalada fiscal de todos os tempos", com resultado zero sobre a demanda agregada. "Trata-se de um case de estudo para as futuras gerações. Uma jabuticaba, literalmente. País nenhum no mundo fez isso antes. Nem o Chile de Pinochet teve a coragem de desmontar seu banco de desenvolvimento deste jeito", disse.
O diretor da Área Financeira e Internacional, Carlos Thadeu de Freitas Gomes, alertou n'O Estados de S. Paulo que a devolução antecipada poderá comprometer a capacidade de o BNDES emprestar a partir de 2018."Se o governo quer que o banco desembolse menos, o banco vai desembolsar menos. É uma decisão de governo", disse em entrevista publicada na quinta-feira.