Manuela D’Ávila: Brasil é maior que o medo e o ódio
“O PCdoB tem 95 anos. A nossa história é a prova de que não lançamos candidatura para causar”, disse a pré-candidata do partido à Presidência, Manuela D’Ávila. Em entrevista à revista Veja, ela reiterou que o anúncio de sua postulação não é apenas estratégia para marcar território, mas uma iniciativa no sentido de apresentar saídas para a crise do Brasil.
Publicado 15/11/2017 13:04
“2018 é o momento de discutir o futuro do Brasil, e não o passado. A gente tem uma caracterização política muito firme. Em 2016 houve uma ruptura, um golpe parlamentar e, a partir disso, se abre um novo ciclo. Temos uma interpretação muito parecida com a do PT sobre o passado. Mas as saídas para a crise nós temos as nossas e eles têm as deles. Sim, a gente acredita que vai se encontrar no futuro. Mas achamos que esse futuro é o segundo turno das eleições”, afirmou.
Segundo ela, politicamente, a sua pré-candidatura defende uma frente ampla, que é a ideia de reunir setores maiores da sociedade. Mas o tema central de sua campanha é a política econômica e a retomada do crescimento. “Nosso projeto é de desenvolvimento com crescimento da economia a partir da indústria nacional, que significa emprego de qualidade com direitos sociais.”
Ao falar de suas propostas para a indústria, ela defendeu um referendo revogatório para anular medidas levadas adiante pelo atual governo, como a alteração da TJLP (Taxa de Juros de Longo Prazo) do BNDES, por exemplo. “Sem a TJLP a gente jamais vai ter emprego de qualidade no Brasil. Porque todos os países têm banco de desenvolvimento com taxa de juro de longo prazo para favorecer a indústria própria e de inovação, que geram empregos.”
De acordo com Manuela, a economia brasileira tem que estar a serviço do povo brasileiro. “Como a gente tem taxas de juro tão altas se elas não servem para a indústria nacional, para gerar competitividade? Como a gente tem um câmbio que não serve para a indústria brasileira?”, criticou.
Defensora dos direitos das mulheres, ela destacou que a maternidade a ajudou perceber melhor os problemas do país nessa área. “Eu consegui muito mais conectar o tema da mulher com o tema do Brasil. Porque a maternidade torna muito visível o que é um Estado não adequado às mulheres. O que representa um Estado pequeno e a ausência de creches, de escola em turno integral, para uma mãe trabalhadora?”, colocou.
A pré-candidata destacou que o Brasil é um país muito violento com as mulheres. “Pautas como salário inferior [ao dos homens] e assédio sempre fizeram parte da minha rotina de parlamentar. Mas talvez eu tenha compreendido o peso da maternidade na situação que a mulher vive no Brasil”, completou.
Em 2016, uma foto da deputada estadual amamentando a filha Laura, na Assembleia, ganhou as redes sociais. De acordo com Manuela, a repercussão da imagem fez com que ela tivesse a dimensão de como o ato de amamentar é um tabu em uma sociedade que objetifica o corpo das mulheres. “Cumprir a orientação da Organização Mundial de Saúde (OMS) é algo visto como um absurdo, um erro”, lamentou.
Ela comentou ainda a iniciativa de seu gabinete de desenvolver o “machistômetro” – um termômetro que indica atitudes machistas e orienta mulheres –, que terminou virando alvo de ataques na web. “A gente fez o machistômetro como apoio para os debates sobre violência contra mulher. Ele era bastante simples, mas acabou gerando muito impacto. Essa onda de ódio na internet acontece sistematicamente, não só com o tema das mulheres. Existem candidaturas que têm tentado organizar e potencializar o ódio e o medo”, declarou.
Segundo ela, “há pessoas que não percebem como o ódio é um instrumento político e pode sair das redes sociais para as ruas”. Manuela tem publicado vídeo na internet, num esforço de mostrar que é possível construir diálogos e soluções.
Assim como fez na coletiva de lançamento de sua pré-candidatura, a comunista respondeu àqueles que a consideram muito jovem. “Quando me candidato, falam: ‘Ela é muito nova’. (…) Este é meu quarto mandato e minha sétima eleição, e continuo eternamente jovem. Por isso, a eleição é meu elixir, nunca envelheço perante os olhos dos críticos. Fui eleita pela primeira vez quando tinha 23 anos. Agora tenho 36. É praticamente a idade do presidente da França [Emanuel Macron, 39 anos], basicamente a mesma idade do primeiro-ministro do Canadá [Justin Trudeau, 45 anos], da prefeita de Roma [Virginia Raggi, 39 anos]”, comparou.
Ao ser indagada sobre a pré-candidatura de Jair Bolsonaro, Manuela avaliou que ele não tem propostas para o país. “Quando falei que o bom senso da população é o principal adversário do Bolsonaro, é porque o medo e o ódio não são propostas para sair da crise que o Brasil vive. Fui colega dele por oito anos e sei que foi um parlamentar invisível. Ele não tem propostas sequer para as áreas nas quais estimula o ódio. Qual é a proposta dele para a segurança pública?”, provocou.
Para ela, uma candidatura de extrema direita como a dele serve para impulsionar uma alternativa de centro. “O Alckmin, por exemplo, não é um candidato de centro, mas, diante do Bolsonaro, ele pode parecer. Por isso precisamos debater ideias. Para que aqueles que defendem o fim do Estado não se passem por alternativas centristas, que não são”, disse.
Manuela reforçou que nunca tive o PT como adversário, nas eleições em que disputou. E assim será em 2018. “Nossas candidaturas sempre tentaram colocar os problemas das pessoas e da cidade no centro. Isso faz com que você enxergue os outros partidos de uma forma diferente. Tenho bastante tranquilidade com isso. Nós e o PT temos uma relação fraterna, mas somos partidos diferentes. É natural que tenhamos candidaturas diferentes e que nos encontremos, na frente, em eleições de dois turnos.”
Ela voltou a defender a participação do participação do ex-presidente Lula na eleição. “Eleição é momento de superação da crise, não de agravamento dela. Em uma eleição em que o Lula estivesse impedido de concorrer, a crise estaria agravada”, apontou.
Segundo a comunista, se Lula cometeu crimes, é preciso que haja provas. “O Lula e qualquer brasileiro têm que ser julgados pela lei, é isso que garante a democracia e a existência das nossas instituições. Enquanto não apresentarem uma prova de que ele cometeu crime, ele não cometeu crime. É assim com ele e deve ser assim como todos.”
Na sua opinião, a Lava Jato surgiu com o bonito interesse de combater a corrupção no Brasil, mas virou uma operação “absolutamente política”. “Basta ver o que acontece hoje em Brasília, os desfechos e o entorno do presidente Temer”, indicou.
À Veja, Manuela falou ainda sobre temas como a legalização das drogas. Para ela, é preciso discutir o tema na perspectiva proposta pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), unindo a sociedade para debater estatísticas. “Os números mostram que a violência aumentou a partir de uma política de guerra às drogas. O Brasil pode fazer esse debate, vinculando inclusive a tributação das drogas a campanhas educativas de prevenção do consumo de todas as drogas. O Brasil subestima o consumo de drogas lícitas”, avaliou.