Publicado 11/12/2017 13:15
'Um estudante em universidade pública custa de duas a três vezes mais que um estudante em universidade privada', sustenta o relatório, sacando números da cartola: o custo médio anual por estudante em universidades privadas seria de até R$ 14,8 mil; em federais, 40,9 mil. A comparação é escalafobética. Nas universidades públicas, ao contrário do que ocorre na maioria das instituições privadas, a vida acadêmica não se resume à sala de aula. Abrange o indissolúvel trinômio ensino, pesquisa e extensão, por meio de ações sistemáticas junto à comunidade. Daí a necessidade de investimentos sólidos em hospitais, clínicas, museus, teatros e laboratórios, entre outros equipamentos", critica Lira Neto no artigo publicado pelo jornal Folha de S. Paulo neste domingo (10).
O escritor destaca também que o maior ardil do relatório "procura alimentar uma lenda urbana que cerca a academia": "Embora os estudantes de universidades federais não paguem por sua educação, mais de 65% deles pertencem aos 40% mais ricos da população", diz o relatório do Bird.
"A informação não procede. Pesquisas do Fonaprace (Fórum Nacional de Pró-Reitores de Assuntos Comunitários e Estudantis) e da Andifes (Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior) apontam o contrário. Apenas 10,6% dos alunos das universidades públicas vêm de famílias com renda superior a dez salários mínimos. Com a democratização introduzida pelo sistema de cotas, o índice de estudantes oriundos de famílias com renda abaixo de três salários, atualmente em 51,4%, só tende a crescer", desmente Neto.
O colunista diz ainda que amparado no relatório, o Banco Mundial propôs ao governo dois caminhos: "limitar os gastos por aluno" e "introduzir tarifas escolares". O que significa, em bom português, sucatear a universidade e cobrar mensalidades.
"Os que não puderem pagar pelos estudos, tratem de recorrer a empréstimos. Nos Estados Unidos, onde o modelo impera, milhões de jovens recém-formados acumulam dívidas impossíveis de serem pagas. É sintomático: ao longo das 17 páginas do documento relativas ao tema, em nenhum momento os repasses para o setor educacional são definidos como 'investimento'. Em contrapartida, a palavra 'gasto' aparece nada menos de 77 vezes", diz Lira Neto.
"Impossível dissociar a leitura do relatório e a escalada autoritária que busca criminalizar a arte e a cultura, bem como espezinhar qualquer manifestação do pensamento complexo e do espírito crítico. Virtudes que encontram na universidade pública um de seus últimos territórios de excelência", afirma o escritor.
*Lira Neto é jornalista, pesquisador e biógrafo de nomes como Maysa e José de Alencar, e publicou uma trilogia sobre Getulio Vargas. Ganhou quatro prêmios Jabuti.