Brasil está sob o domínio de ruralistas, evangélicos e pró-armas
O jornal Le Monde desta terça-feira (19) traz uma triste constatação sobre o Brasil. Segundo a correspondente do diário em São Paulo, Claire Gatinois, o país foi dominado pelos "BBBs". A sigla faz referência à "boi", em relação à bancada ruralista, à "bíblia", em relação aos evangélicos e "bala", os partidários do porte de armas. Segundo a repórter, os três Bs influenciam cada vez mais o governo e sociedade brasileira.
Publicado 19/12/2017 18:03

"Representados por 347 deputados dos 513 do Congresso, esses três grupos de pressão constituem, desde as eleições de 2014, uma força inevitável. Segundo seus opositores, eles teriam até mesmo pego a Câmara dos Deputados como refém, impondo leis e emendas com intenções reacionárias", diz a matéria do Le Monde.
Para o diário, entre os "BBBs", os ruralistas são os mais poderosos, com 239 deputados no governo. A bancada evangélica conta com 87 representantes e os defensores do porte de armas, 21. "Cada um destes lobbys trabalha em função de seus interesses. Os militantes do agronegócio trabalham para ganhar espaço de cultivo nas reservas naturais protegidas e indígenas; os evangélicos defendem a família tradicional – são contra o aborto e o casamento entre pessoas do mesmo sexo -; e os pró-armas tentam, desesperadamente, voltar atrás na lei do desarmamento que, em 2003, proibiu o porte de armas aos simples cidadãos", reitera o diário.
Para Le Monde, esses deputados, eleitos pelo povo, "revelam uma faceta ultraconservadora da sociedade, uma realidade escondida durante muito tempo pela prosperidade econômica e os avanços sociais do início dos anos 2000". O jornal sublinha que "a crise de 2015, os escândalos de corrupção, o desemprego e o aumento da violência ressuscitaram os velhos demônios".
Le Monde também afirma que a ex-presidente Dilma Rousseff estava consciente da existência dos BBBs, mas desdenhou o poder do grupo durante seus governos. Já o atual presidente Michel Temer compreendeu rapidamente como lidar com o grupo. Trocando favores com os "BBBs" e cedendo a diversas exigências deles, o chefe de Estado é frequentemente blindado por eles. Graças à influência dos três Bs nas decisões do Congresso, Temer se livrou duas vezes da possibilidade de ser afastado de seu cargo e enfrentar na Justiça um processo por graves denúncias de corrupção, destaca Le Monde.
Todos-poderosos, os "BBBs" impedem também o avanço de qualquer pauta progressista, tornado o ar "cada vez mais irrespirável para os militantes LGBT, as feministas ou defensores dos direitos humanos". Em entrevista ao jornal, o filósofo brasileiro Vladimir Safatle lembra que o grupo sempre existiu no país, mas, agora, eles acreditam que podem agir unicamente em prol de seus interesses, sem negociar com o resto da sociedade, e sem limites. Mais preocupante: os BBBs ainda devem permanecer durante muito tempo no poder, conclui Le Monde.