Entidades denunciam na Câmara que houve abuso nas demissões da Estácio

As 1.200 demissões na universidade privada Estácio de Sá foram consideradas abusivas por representantes de entidades de estudantes, de trabalhadores e pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) que participaram nesta quarta-feira (20) de audiência pública realizada na Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público da Câmara dos Deputados. Para o MPT, a Estácio além de rolo compressor contra os direitos dos trabalhadores é um balão de ensaio da reforma trabalhista.

Por Railídia Carvalho

Audiencia demissões est´cio de sá comissão trabalho - Cleia Viana/Câmara dos Deputados

Diante dos relatos da violência sofrida pelos professores e dos efeitos sociais que as 1.200 demissões podem provocar, o secretário de Relações do Trabalho do Ministério do Trabalho, Luiz Carlos Silva Barbosa, se comprometeu a mediar uma audiência interna em 2018 reunindo representantes dos estudantes, membros da Estácio de Sá e sindicatos dos professores. Na exposição inicial, Luiz repetiu que a reforma trabalhista limitou o papel do Ministério do Trabalho. "Mas ainda é responsabilidade do Ministerio fiscalizar as relações de trabalho", devolveu o deputado Federal Orlando Silva (PCdoB-SP).

Presidente da Comissão e autor do pedido da audiência, Orlando sinalizou pela instauração de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar a atuação do capital privado na educação brasileira. “Para que possamos compreender a dinâmica, os objetivos e, eventualmente, regular a atividade porque não se trata de um supermercado, não se trata de um local de compra e venda pura e simplesmente”, enfatizou o deputado.

Na opinião da diretora de universidades privadas da União Nacional dos Estudantes (UNE), Keully Leal, a postura da Estácio de Sá prova que a educação tem se tornado mercadoria nas instituições privadas. O advogado da Estácio presente na Câmara se referiu em vários momentos à universidade como companhia e que a “reestruturação” (demissão) está voltada para o atender ao mercado. De acordo com a dirigente estudantil, a reforma trabalhista abriu brechas para que os empresários pudessem obter mais lucro em detrimento da qualidade da educação. Nesse caso, os efeitos recaem sobre os estudantes de baixa renda e da periferia que representam 70% dos estudantes que frequentam as universidades privadas.

Lista obtida pelo MPT mostrou que de um universo de 104 professores demitidos, 81 deles tem entre 50 e 81 anos de idade, o que na opinião do MP caracteriza dispensa discriminatória por idade. O Procurador do MPT, Marcelo José Fernandes, também acusou a Estácio de reter as informações sobre a lista de dispensados e os critérios utilizados. Ainda de acordo com o representante do MPT, a universidade também não comprovou a suposta dificuldade financeira.

“Ela (a Estácio) não comunicou a ninguém. Fez um processo de dispensa brutal, professores com 50, 60 anos retirados de salas de professores, de sala de aula onde estavam aplicando atividade, na presença de outros professores, ou seja, de forma vexatória”, relatou Marcelo a partir de depoimento de professores demitidos. Ele também chamou de vingança pessoal a decisão do desembargador José Geraldo da Fonseca, do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região, que cassou a liminar que suspendia as demissões. “Ele está se vingando do escritório da Dra Rita Cortez que representa os trabalhadores e prejudicando 1.200 professores”, denunciou Marcelo. O procurador completou que no dia seguinte à decisão o desembargador pediu a aposentadoria.

A demissão em massa de milhares de trabalhadores que chocou os integrantes da Comissão de Trabalho, parece não surtir o mesmo efeito na Estácio de Sá. Na opinião do advogado da instituição, Bruno Galeano, “nem chegou a 10% do número total de professores da Estácio que é de 15 mil professores”. Também de acordo com o advogado, a demissão “de maneira alguma prejudica, precariza a vida do professor”.

“Ora, é brincadeira dizer que a reforma trabalhista não têm influência nesse mundo. A reforma trabalhista veio para dar suporte a toda essa reestruturação que está sendo feita pelas instituições privadas”, contestou Trajano Jardim, dirigente da Confederação Nacional de Trabalhadores dos Estabelecimentos de Ensino (Contee). “O que está sendo feito no Brasil hoje e isso inclui a lei da mordaça (projeto Escola Sem Partido) é precarizar o ensino privado e destruir a escola pública". Trajano contestou fala do advogado da Estácio sobre a participação dos professores em projetos pedagógicos. “Vem de cima pra baixo e os que não aceitam ficam desempregados. Tem professores obrigados a dar aulas no cargo de especialistas porque a instituição não reconhece o que a legislação prevê para mestres e doutores”, denunciou.

A Contee tem recorrido às ações judiciais como a que foi feita em parceria com o Sindicato dos Professores de Minas Gerais (Sinpro-MG) e conseguiu do TRT no Estado decisão pela reintegração dos professores demitidos pela Estácio que atuam em Minas. Pela decisão, a Estácio é obrigada a reintegrar os 54 demitidos a partir de janeiro e caso não obedeça pagará multa de R$ 500 reais por dia referente a cada trabalhador.

“Não existe espaço para ingenuidade. É obvio que a Estácio quer criar um exército de reserva de professores, de mão-de-obra qualificada dispostos a se sujeitar de uma hora para a outra, de um semestre para o outro a condições de trabalho inferior e precária”, reforçou Keully. “Se antes debatíamos mais vagas para os jovens na universidade, hoje debatemos para que a universidade pública permaneça. Já havia o ataque nas universidades públicas e agora tem o ataque nas universidades privadas. A UNE repudia as demissões arbitrária e prepara a UNE volante, caravana que vai passar em todas as universidades do Brasil para dialogar com os estudantes e construir um grande calendário de luta em defesa da educação”, completou a dirigente estudantil.