O encanto do primeiro banho de mar

“O mais bonito do mar é essa água forte vindo”. Morador do Crato, no Cariri, João Erick, de 9 anos, nem sabia definir como "onda a água que arrebentava forte na areia. Era coisa que nunca tinha visto em rio nenhum, mas o corpo bem que sabia se deixar molhar.

Por Eduarda Talicy

Banho de mar - Divulgação

O deslumbramento desse encontro, que veio para ele e outras crianças e adolescentes, seguiu o acordo pendular: as águas iam, eles iam junto, as águas vinham, eles se achegavam em direção à areia. Mas como mar não tem acordo, foi justo no meio que as duas euforias se encontraram e, pela primeira vez, se deixaram abraçar.

Importou muito pouco o tempo nublado na tarde desta sexta-feira (5) na Praia de Iracema. Diante daquela água toda, tudo pareceu pequeno demais para os quase 30 adolescentes e crianças moradores do Crato e integrantes do Grupo Infantil Reis do Congo. O grupo de reisado é chefiado pelo mestre da cultura Aldenir, natural do Crato. Da trajetória de 85 anos de vida, ele dedicou 62 ao Reisado e ao repasse dos saberes.

“Toda vez a gente traz eles aqui, mas eu nunca tive a coragem que eles têm, porque minha mãe me ensinou que mar não tem cabelo”, afirma o mestre Aldenir, que só olha de longe admirando as crianças aos pinotes na água. Ele conta que, diante dos pedidos para ver a praia, avisou: “Eu disse que não era açude, avisei que aqui era mar”.

E foi mesmo cheio de coragem que João Victor Araújo, 15, antes mesmo de sair do hotel, deixou todo mundo avisado. Fosse forte, fosse fraco, ia mergulhar “com tudo”, do jeito que faz nas barragens da cidade onde mora. Dito e feito, com calção laranja neon, ele e os colegas correram para o mergulho. Não foi tão fundo, e fincou o pé na areia, que se mexia demais. Teve medo no começo. “É que a água puxa o cabra”, justifica.

Já dona Lucélia Pereira, 48, não teve a mesma coragem. “É bonito demais. Eu achava que era diferente, mas agora que eu vi que não tem o outro lado. Também não sabia que tinha isso aqui”, dizia ela, também surpresa com a força que fazia a água ir e vir.

O grupo de cultura popular chegou nesta sexta-feira para as apresentações da 12ª Mostra Estadual Ceará Natal de Luz. O evento marca o fim das atividades do Ciclo Natalino do Estado, que se iniciou com a escolha dos grupos de Mostras Regionais, Grupos de Tradições e Grupos de Projeção ou Parafolclóricos que têm nas manifestações do Ciclo Natalino seu foco. Durante o mês de dezembro, foram realizadas as Mostras Regionais em diversas regiões do Estado, como Fortaleza, Sobral, Campo Sales, Russas, Meruoca, Maranguape, Quixadá e Ocara.

Na manhã deste sábado (6), o mestre Aldenir foi homenageado pelo amor pela cultura, como ele mesmo diz, e pela riqueza que é repassar esse saber. Na ocasião, os meninos se apresentaram ainda mais contentes. Com a alegria do mar e dessa água forte vindo. Porque, pelas ondas eles foram seduzidos e, assim como elas, eles pretendem voltar.

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