Cientistas saem em defesa de Carlini, perseguido por estudar drogas

Presidente da SBPC, Ildeu de Castro Moreira, entrega ao ministro Kassab 32 mil assinaturas em defesa do pesquisador da Unifesp. Caso teve repercussão internacional e foi destaque na revista 'Nature'.

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O presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Ildeu de Castro Moreira, entregou ao ministro de Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), Gilberto Kassab, documento com 1.500 páginas, com mais de 32 mil assinaturas e a subscrição de 56 sociedades científicas de todo o país, em defesa do pesquisador Elisaldo Carlini, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). No último dia 21, Carlini foi intimado a depor à polícia de São Paulo, acusado de fazer apologia ao crime.

Junto com as assinaturas reunidas em uma semana, Moreira entregou o manifesto “’Somos Todos Carlini”. Professor emérito da Unifesp, Elisaldo Carlini é um dos mais importantes pesquisadores sobre drogas e tem se dedicado à defesa da liberação da maconha para fins medicinais. Segundo a SBPC, Kassab se comprometeu encaminhar os documentos ao ministro da Justiça, Torquato Jardim, juntamente com uma carta sua, apontando para a relevância dessa manifestação.

O presidente da SBPC e o presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Luiz Davidovich, aproveitaram a 5ª Reunião do Conselho Consultivo do MCTIC para entregar as assinaturas e falar sobre a necessidade de a pasta defender a liberdade de pesquisa. “É uma questão que está ameaçada por esse fato e por outros similares que vêm acontecendo no país”, disse Moreira.

Representantes de outras entidades presentes à reunião, como a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) e o Conselho Nacional das Fundações Estaduais de Amparo à Pesquisa (Confap), também expressaram apoio à campanha e destacaram preocupação com a autonomia das universidades e dos pesquisadores.

Elisaldo Carlini tem 87 anos, dos quais 62 anos dedicados à pesquisa, que renderam, entre outras coisas, mais de 12 mil citações de seus trabalhos em artigos científicos de todo o mundo.

A intimação pela polícia causou indignação em toda a comunidade científica e acadêmica. Em 23 de fevereiro, a SBPC e a ABC divulgaram manifesto público repudiando com veemência um inquérito policial contra um professor reconhecido mundialmente por seu trabalho e por ter organizado um simpósio sobre o uso terapêutico da maconha, em maio de 2017.

Após a publicação, o documento recebeu o apoio de dezenas de sociedades científicas de todo o Brasil, e diversos professores, pesquisadores, personalidades políticas e estudantes enviaram solicitações para também assinar a manifestação. Diante dos pedidos, a SBPC lançou uma petição pública online, chamada “Somos Todos Carlini”. Em menos de dez dias a manifestação, que permanece ativa neste link, já recebeu mais 33 mil assinaturas.

O manifesto ressalta que Carlini é um cientista premiado internacionalmente, por ter desenvolvido, ainda na década de 1970, pesquisas pioneiras que caracterizaram a ação anti-convulsivante da maconha. Suas descobertas permitiram a formulação de medicamentos utilizados em diversos países para tratar doenças como epilepsia e esclerose múltipla. “Acusar o dr. Carlini de apologia às drogas equivale a criminalizar a inteligência e o conhecimento técnico-científico”, destaca o manifesto.

Segundo o texto das entidades científicas, esta ação é “uma provocação cruel e vazia contra um cientista que dedicou toda sua vida à fronteira do conhecimento”.

O caso repercutiu internacionalmente, em especial na edição da revista Nature de ontem (8). A reportagem destaca a adesão ao abaixo-assinado e a preocupação dos cientistas com potenciais restrições à liberdade acadêmica. O periódico britânico ressalta ainda a brilhante carreira de Carlini, considerado um pioneiro no mundo inteiro nas pesquisas relacionadas à maconha.